- Correio Braziliense
A campanha eleitoral começa oficialmente amanhã em todos os municípios brasileiros, mas o cenário não é nada animador para os partidos que fazem oposição a Temer. Levantamentos de intenção de voto realizados até agora apontam que as legendas adversárias do governo interino lideram a disputa em apenas quatro de 20 capitais pesquisadas. OPT, que aposta na reeleição de Fernando Haddad em São Paulo, está na frente somente em Rio Branco, com Marcus Viana. Para especialistas, uma das dificuldades dos petistas e dos partidos mais à esquerda é encontrar um discurso para enfrentar o atual momento brasileiro, como escândalo de corrupção na Petrobras em evidência, a crise econômica e o impeachment de Dilma
Partidos aliados a Temer lideram pesquisas de intenção de voto
O PT, por exemplo, reduziu em 35% a quantidade de candidatos em relação à disputa municipal de quatro anos atrás
Paulo de Tarso Lyra - Correio Braziliense
BRASÍLIA Acuadas no plano nacional, acusadas de corrupção pela Lava-Jato e responsabilizadas pela má gestão que afundou o país em uma crise econômica sem precedentes na história recente brasileira, as legendas do chamado campo de esquerda lideram, até o momento, em apenas quatro das 20 capitais que já divulgaram pesquisas de intenção de voto. Mesmo em algumas cidades em que já governam, como São Paulo (PT de Fernando Haddad) e Curitiba (PDT de Gustavo Fruet), os partidos não estão no topo da tabela de intenção de votos. Nas outras 16, o grupo político que lidera as expectativas de voto é ligado ao partido que está ou àqueles que dão sustentação ao atual governo federal, personificado na figura do presidente em exercício, Michel Temer.
Os heróis da resistência esquerdista, até o momento, são: Luciana Genro (PSol) em Porto Alegre; Roberto Cláudio (PDT) em Fortaleza; Carlos Eduardo (PDT) em Natal; e Marcus Viana (PT) em Rio Branco. Os pedetistas de Natal e Fortaleza concorrem à reeleição, assim como Viana. A exceção nesse grupo é Luciana Genro, que traz o recall da eleição presidencial de 2014 e um dos sobrenomes mais tradicionais da política gaúcha.
Nas principais capitais, o quadro é cristalino: no Rio e em São Paulo, a disputa é liderada pelo PRB, como Marcelo Crivella e Celso Russomano, respectivamente. Em Salvador, onde o PT sequer lançou candidato próprio — apesar de governar a Bahia —, ACM Neto (DEM) caminha tranquilamente para a reeleição. E em Manaus, onde Lula já desembarcou em 2012 para tentar animar seus aliados, o tucano Arthur Virgílio (PSDB) também tende a voar em céu de brigadeiro.
“Esse resultado é reflexo da decadência administrativa e econômica que afundou o país na última década”, afirmou o cientista político da Fundação Getulio Vargas (FGV-RJ) Carlos Pereira. Ele acha que ainda é cedo para cravar que haverá uma derrota incisiva dos chamados campos de esquerda nas eleições de outubro. “Mas o prognóstico a médio prazo não é bom, sobretudo se o governo interino de Michel Temer conseguir tomar algumas medidas assertivas no campo econômico”, completou.
O coordenador do laboratório de políticas de governo da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), Milton Lahuerta, lembra que, no fundo, o momento representa a vitória do capitalismo neoliberal sobre o discurso social. Ele afirma que, curiosamente, o próprio PT, sobretudo nos anos de governo Lula, ajudou a consolidar esse discurso. “O PT promoveu a inclusão social pela lógica do consumo, não da cidadania. A crise econômica fez com que a esquerda perdesse o encanto. E, pior, ela ainda passou a ser questionada moralmente pela Lava-Jato e pelos escândalos de corrupção que levaram ao impeachment da presidente Dilma Rousseff”, afirmou Lahuerta.
Na opinião do coordenador de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antonio Augusto de Queiroz, depois de tanto bombardeio nos últimos meses, é surpreendente que, em algumas capitais, candidatos do campo de esquerda estejam à frente nas pesquisas de intenção de voto. “Há todo um discurso montado de que os partidos de esquerda são corruptos e incompetentes administrativamente”, lembrou ele. Por isso, na opinião de Queiroz, é natural que as legendas mais conservadoras consigam ocupar o vácuo deixado pelo outro grupo político. “Isso porque estamos no começo da campanha eleitoral. Não há qualquer garantia de que os atuais líderes socialistas consigam se eleger em outubro”, completou o especialista.
Discurso desafinado
Muito mais do que uma questão moral ou econômica, o dilema da esquerda brasileira é a ausência de discurso para enfrentar o atual momento. “Eles vão ter de se reinventar. Ao longo destes meses em que esteve afastada do Planalto, a única polarização que Dilma conseguiu provocar foi se ela teria ou não direito a usar o avião presidencial. Nenhuma outra argumentação política, econômica ou social suscitou debates”, avalia Carlos Melo, professor de ciência política do Insper.
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