- O Globo
O ex-presidente Lula vem fazendo nos últimos dias movimentos para desacreditar a Justiça brasileira claramente na tentativa de apresentar-se ao mundo — e nesse caso a internacionalização do debate com a ação no Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) faz parte da estratégia — como um perseguido político.
Ontem, publicou um artigo na “Folha de S. Paulo” denunciando o que seria uma perseguição política dos procuradores de Curitiba e do juiz Sérgio Moro. Ele assume a versão, que já havia sido veiculada pela direção do PT, de que as prisões de Antonio Palocci e outros petistas foram feitas perto das eleições municipais para desmoralizar seu partido.
No mesmo dia, seus advogados entraram com um pedido para que o desembargador João Pedro Gebran Neto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), considere-se impedido de julgar o pedido de suspeição do juiz Sérgio Moro, pois os dois seriam “amigos íntimos”.
Os advogados de Lula haviam feito o pedido de impedimento diretamente ao juiz Sérgio Moro, a quem consideram sem isenção para julgar o expresidente. Moro, naturalmente, não aceitou o pleito, e agora eles recorrem ao TRF-4, tentando também desmoralizar o desembargador Gebran Neto, que se recusou a esclarecer se mantém relação de amizade com Moro, e marcou o julgamento para hoje.
Antes mesmo disso, a defesa de Lula entrou com recursos contra essa decisão no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF). A estratégia da defesa de Lula está cada vez mais clara. Seus advogados pretendem politizar os processos criminais contra o ex-presidente, como se ele fosse um perseguido político prestes a ser condenado por uma Justiça aparelhada para impedi-lo de disputar a eleição presidencial de 2018.
Seus seguidores, com base em uma notícia falsa de um blog cujo titular, Eduardo Guimarães, candidatou-se a vereador e recebeu pouco mais de 1.300 votos, ficando em 801º lugar na eleição em São Paulo, foram mobilizados na segunda-feira para uma vigília em frente à casa de Lula para resistir a uma provável prisão que poderia ocorrer naquele dia.
Nada aconteceu, nem mesmo a tal vigília, já que pouquíssimas pessoas dispuseram-se a ir até lá. Atribui-se a Lula a seguinte frase: “Se me prenderem, viro mártir. Se me prenderem, viro herói. Se me deixarem solto, viro presidente da República”. Ele parece, no entanto, não estar disposto a virar herói, já que denuncia sua prisão como iminente quase todos os últimos dias, querendo na verdade tornar-se um mártir.
Para constranger a Justiça brasileira, ele trata de desqualificar, através de pronunciamentos políticos ou de seus advogados, o juiz Sérgio Moro, como se ele fosse o único a aceitar denúncias contra ele. Além de Curitiba, onde responde pelo caso do tríplex de Guarujá, Lula é réu em mais dois processos, os dois em Brasília.
No fim de julho, o juiz federal Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara do Distrito Federal, aceitou denúncia contra Lula e o transformou em réu por um esquema com o senador cassado Delcídio do Amaral para evitar que o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró fizesse um acordo de delação premiada com a Lava-Jato.
O juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal, em Brasília, aceitou outra denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal contra Lula, Taiguara Rodrigues dos Santos, sobrinho da primeira mulher do ex-presidente, o empreiteiro Marcelo Odebrecht e mais oito pessoas. Lula é acusado de organização criminosa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e tráfico de influência.
Portanto, seria preciso acreditar que uma ampla conspiração da Justiça brasileira foi montada apenas para perseguir Lula. Há quem acredite, no entanto, que toda essa estratégia de vitimizá-lo pode desaguar num pedido de asilo político do ex-presidente e de sua família.
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