- Folha de S. Paulo
Um dia depois da festinha da inflação baixa, o governo vai ficar de ressaca por causa de uma bebedeira velha, o monte de dívidas que cresce sem parar.
A S&P, uma dessas firmas que classificam o risco de calote de empresas e países, rebaixou de novo a nota do governo do Brasil pelos motivos de sempre e sabidos. Não se aprovam reformas que equilibrem receita e despesa; mais do que isso, o Congresso não está nem aí para o problema. Além do mais, o Brasil cresce pouco.
Em suma, é como se uma Serasa global dissesse que estamos meio quebrados. Mas, enfim, todo o mundo com mais do que mingau entre as orelhas sabe disso. No ritmo em que vamos, 2019 será o ano do primeiro encontro com o colapso.
Nota de crédito mais baixa implica, em tese, custo mais alto para emprestar dinheiro; em tese, provoca mais reticências em quem tem ou administra dinheiro gordo.
Mas esse rebaixamento vai mudar grande coisa para a economia brasileira? Improvável. Pela informação disponível até a noite desta quinta (11), é difícil de acreditar em mais do que um remelexo nos indicadores financeiros, pelos próximos dias.
Em perspectiva de prazo mais longo, pode ser um pouco pior. Vai demorar mais para voltarmos a ser um aluninho nota azul para as finanças mundiais, "grau de investimento" (cada vez mais, no papel, somos considerados investimento especulativo, de risco).
Além do mais, se e quando virar a festa especulativa na finança mundial, vamos ser uns dos primeiros objetos do mau humor global. Mas, de qualquer modo, dado o estado das finanças públicas do país, nos estreparíamos de qualquer jeito. Não é preciso uma dessas agências de risco dizer que estamos estropiados.
Por ora, o Brasil, o mundo quase inteiro, na verdade (afora a Venezuela), se aproveita de uma animação exagerada nos mercados financeiros. Os donos do dinheiro grosso lá fora, por exemplo, nos cobram cada vez menos por empréstimos e investimentos aqui.
O risco de emprestar dinheiro para o Brasil cai (medido pelo CDS de cinco anos, por exemplo, ou pelo extra de juros em relação a títulos equivalente do governo americano). Cai para quase todos os países ditos emergentes, por falar nisso.
Em suma, os mercadores de dinheiro, credores de governo e de empresas do Brasil, vinham na prática elevando a nossa nota de crédito. As taxas de juros e o risco de emprestar para o Brasil caem quase sistematicamente desde a deposição de Dilma Rousseff, desde meados de 2016.
Entre maio e julho de 2017 houvera, sim, um repique, uma alta de custo do dinheiro, derivada do receio de novo tumulto político, do risco de queda de Michel Temer, grampeado pelo gângster da carne. Depois disso, voltamos a surfar na onda de liberalidades especulativas da finança mundial, que ainda conta com muito dinheiro barato para aplicar e, de resto, animou-se com aceleração do crescimento da economia mundial quase toda (menos na medíocre América do Sul e, pior ainda, no Brasil).
Por enquanto, está sobrando dinheiro no mundo, até para nós, que nos endividamos sem limite. A nota mais baixa não vai pegar bem. Mas não é o nosso grande problema, nem de longe.
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