- Valor Econômico
Recuperação depende de uma gestão correta de curto prazo de variáveis como taxa de juros e oferta de crédito
A aprovação da reforma da previdência em primeiro turno, com uma votação muito acima da esperada por todos, abre espaço para que a economia brasileira busque finalmente a tão esperada recuperação cíclica e o fim da recessão que vivemos há mais de cinco anos. Entende-se aqui como recuperação cíclica de uma economia de mercado a volta natural do crescimento depois de um ajuste para baixo da atividade causada por uma recessão de forte intensidade.
No caso brasileiro de hoje, vivemos a conjugação de uma recessão provocada por erros de gestão da economia entre 2010 e 2014 e uma crise política grave criada pelo processo de impeachment de Dilma Rousseff. Adicionalmente, as revelações da Operação Lava-Jato levaram ao colapso do sistema político que prevaleceu por mais de 30 anos, sem que uma alternativa tenha sido colocada em seu lugar. O resultado foi uma quase depressão econômica que trouxe a queda expressiva na arrecadação de impostos e um salto perigoso no déficit fiscal primário do governo central e dos estados.
Após a troca do comando do governo, com a posse de Michel Temer e a mudança radical na condução da política econômica, tivemos dois momentos em que a recuperação cíclica deu sinais de aparecer no horizonte para, logo em seguida, ser fragilizada por fatores externos à economia. A primeira, logo no início de seu mandato, foi abortada pelo escândalo político que se seguiu às gravações do empresário Joesley Batista. A segunda chance veio com a redução da crise política envolvendo o presidente da República depois da rejeição pelo Congresso de seu afastamento, mas que teve curta duração por conta da greve dos caminhoneiros.
Com a eleição de Jair Bolsonaro e a entrega do comando da economia a uma equipe de corte liberal - e com grande credibilidade junto às forças de mercado - uma nova janela para a recuperação cíclica abriu-se para a sociedade brasileira. Mas neste momento a crise fiscal herdada pelo novo governo e agravada pela deterioração adicional das contas da Previdência Social, gerou uma crise de credibilidade na solvência do estado brasileiro o que obrigou o governo a priorizar uma mudança constitucional profunda para obter um ajuste fiscal estrutural de longo prazo.
A decisão de concentrar toda a energia do governo, em um primeiro momento, na aprovação da PEC da previdência teve um parceiro fundamental para seu sucesso com a participação ativa de parcela da elite parlamentar na Câmara e no Senado. No final, a luta pela reforma da previdência transformou-se - como havia acontecido no Plano Real - em uma batalha pela sobrevivência da maioria da população brasileira, como mostram as pesquisas mais recentes e o número de votos obtidos em plenário.
Como dito no início desta coluna, a aprovação da chamada PEC da Previdência, nas condições que ocorreu, cria uma oportunidade única para que uma recuperação cíclica forte ocorra agora no Brasil. Os indicadores recentes dos mercados de títulos públicos e do chamado CDS da nossa dívida externa falam por si só. Somente um país com solvência fiscal de longo prazo reconhecida pelos agentes econômicos pode ter os preços de títulos públicos que são operados hoje no Brasil e no exterior.
Portanto podemos - e devemos - deixar de lado a paralisia que tomou conta de áreas importantes do governo nestes últimos meses sob a alegação de que a falta de credibilidade na economia por parte dos agentes econômicos internos e principalmente externos poderia levar-nos a uma crise grave de solvência.
Mas a recuperação econômica, em situações como as que existem no Brasil hoje, depende de uma gestão correta de curto prazo de variáveis como taxa de juros e oferta de crédito principalmente. Com o hiato do produto que existe hoje na economia, a volta do investimento produtivo só vai ocorrer se a recuperação da economia ganhar tração ao longo do tempo. Por esta razão é preciso entender que será principalmente via o consumo das famílias que nosso PIB vai voltar a crescer. Em outras palavras, temos que fortalecer o lado da demanda de consumo via os instrumentos tradicionais e medidas extraordinárias como devolução de poupança popular - FGTS e PIS/Pasep - e aumento da alavancagem do sistema bancário, seja ele público ou privado, via redução de compulsórios bancários. Adicionalmente podemos incorporar ao crescimento da demanda dos consumidores um programa abrangente de investimentos privados via privatização de projetos de infraestrutura econômica.
Ao mesmo tempo o governo tem mostrado corretamente que para fortalecer e perenizar a recuperação cíclica temos que modernizar nosso ambiente de negócios via reformas microeconômicas que criem um ambiente mais propício a ganhos de eficiência em vários mercados. Neste sentido temos reformas de maior fôlego a serem implantadas - como a dos impostos e tributos - ao lado de mudanças menos ambiciosas como a recente MP da liberdade econômica e a transformação de mercados oligopolizados como o da distribuição do gás natural. Outras tantas iniciativas fazem parte de um programa do governo que deve ser anunciado no segundo semestre do ano pela equipe do ministro Paulo Guedes.
Caso a recuperação cíclica se perenize como espero, o crescimento da economia a taxas próximas de 2,5% a 3% ao ano vai trazer uma consolidação fiscal vigorosa e dar tempo para que as medidas de mais longo prazo que o governo se dispõem a tomar suportem um crescimento de mais longo prazo.
*Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.
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