sábado, 21 de novembro de 2020

Adriana Fernandes - Prorrogação do auxílio

- O Estado de S. Paulo

Experientes observadores do jogo político dão como alta a probabilidade de o benefício emergencial continuar a ser pago

A prorrogação do auxílio emergencial por mais alguns meses já está na mesa. O ministro Paulo Guedes dificilmente conseguirá escapar desse caminho. Vai se consolidando uma convergência política para garantir a prorrogação do benefício, mesmo que pequena (no máximo dois meses). 

Experientes observadores do jogo político dão como alta probabilidade a prorrogação. Essa percepção também foi passada pelo diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto, durante apresentação de relatório mensal do órgão do Senado que avalia as contas públicas. Por enquanto, o movimento se dá nos bastidores das negociações políticas que envolvem também as votações de fim de ano e a eleição para a sucessão dos presidentes da Câmara e do Senado. 

Mas qual a razão para a prorrogação?

A resposta é que nem o governo nem o Legislativo encontraram outra saída, nem de transição nem estrutural, para o dia 1.º de janeiro, quando acaba o auxílio. Faltam apenas 40 dias.

As incertezas geradas pela velocidade assustadora da alta de casos da covid-19 nos últimos dias empurram a decisão também nessa direção. A prorrogação do auxílio pode ser feita por crédito extraordinário, sem orçamento de guerra, e com o gasto fora do teto. A Emenda Constitucional 95 prevê essa válvula de escape.

O governo preferiu, nos últimos meses, jogar na retranca por causa das eleições, deixou de lado a discussão do novo programa social. Sem conseguir consenso para as medidas impopulares, Guedes passou a apostar na continuidade do programa Bolsa Família, sem grandes reforços – um refresco para a pressão “fura teto de gasto” que parte do governo. O mercado financeiro gostou e se acalmou.

O inusitado é que, agora no mercado, cresce também a corrente de que a prorrogação pode ser uma saída melhor do que dar espaço para furar o teto numa votação no afogadilho de fim de ano. “Com a pressão por causa do auxílio emergencial e a incerteza da atividade no ano que vem, e abrir uma discussão de PEC agora no final do ano, a chance de entrar uma derrapada fiscal é grande”, resume o economista-chefe da XP, Caio Megale. Para ele, melhor jogar para 2021 e discutir com mais calma o programa social.

Com PECs abertas para votação para cortar gastos, a possibilidade de se aprovar uma exceção no teto para o novo programa social não poderia ser descartada. É só ver a lista de lideranças influentes que apoiam deixar o programa social fora do teto, combinado com corte de renúncias tributárias para aumentar a arrecadação ou tributação do andar de cima, como defende a oposição. 

Como a hora da verdade para as reformas estruturantes não chegou depois do primeiro turno das eleições municipais e nem vai chegar com o fim do segundo turno, o pensamento no mercado tem sido que é melhor empatar o jogo nas poucas semanas que faltam até o início do recesso parlamentar. Ninguém perde ou ganha e fica tudo para o início de 2021. 

O que se pode esperar até o fim do ano é um avanço na aprovação de novos marcos regulatórios e outros projetos, que, embora não sejam PECs, são também importantes. Além da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Já o Orçamento deve ficar para o ano que vem. Para o primeiro semestre do ano, sobraria a última janela de avanço das reformas no governo Bolsonaro.

“O cenário pode abrir uma janela de oportunidade no início de 2021 para avançar na PEC emergencial, importante para blindar o arcabouço fiscal em 2022, ano eleitoral”, avalia.

Ponto importante que mostrou reportagem do Estadão de sexta-feira é o acordo do governo e lideranças políticas com o TCU para uma regra de transição para abrir caminho ao empenho de recursos na reta final do ano para obras que serão executadas ao longo de 2021. O jeitinho que foi cobrado pelos parlamentares, com crítica ácida ao TCU de “apagão de canetas”, está se consolidando. 

Enquanto a prorrogação do auxílio não sai, o debate do momento tem sido de que houve exagero na concessão da ajuda e que muita gente recebeu sem precisar. É bom lembrar, no entanto, as condições de urgência em que ele foi montado e também reforçar que o auxílio não tinha como foco somente a contenção da pobreza.

O objetivo do auxílio foi, sim, conter a queda de renda dos informais, mas de modo a propiciar condições para que eles cumprissem o isolamento. O auxílio não seria efetivo como estímulo ao isolamento caso fosse só para pobres ou tivesse valor muito baixo, ainda mais nas metrópoles, onde informais auferem rendimentos maiores e são exatamente os locais de maior aglomeração urbana. Se a piora da pandemia acelerar nos próximos dias, o anúncio da prorrogação pode até vir antes.

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