terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Andrea Jubé - As pedras no caminho para 2022

- Valor Econômico

Rachados, DEM e PSDB serão fiéis da balança na Câmara

À medida que se aproximam “o dia D e a hora H” da eleição para as Mesas Diretoras da Câmara e do Senado, fica claro como o espelho d’água do Congresso o vínculo entre a disputa no Legislativo e a sucessão presidencial.

O empecilho ao sucesso dessas articulações temporãs é a pedra no meio do caminho, para usar uma metáfora de Drummond. Atiraram a pedra no espelho d’água, e agora a turbulência pode afundar o barco das alianças para 2022, num cenário em que PP, DEM, PSDB e MDB querem ser os timoneiros.

O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), já expressou o apoio à reeleição de Jair Bolsonaro em uma coligação precoce que agrega o PL de Valdemar Costa Neto. O enlace é o pano de fundo do apoio do Palácio do Planalto à candidatura do líder do PP, Arthur Lira (AL), à presidência da Câmara.

Nogueira armou-se até os dentes para eleger Lira, enquanto em paralelo blinda Bolsonaro de um hoje remoto avanço do impeachment.

No último domingo, Nogueira, que não é ativo nas redes sociais, foi ao Twitter para interferir em um debate entre Lira e Baleia Rossi (MDB-SP) sobre a disposição do vencedor da eleição em pautar o impeachment.

Lira acusa Baleia de prometer ao PT a abertura do processo, se for eleito. E o emedebista questiona Lira quanto a um eventual compromisso com o Planalto de engavetá-lo.

“Seria bom que o candidato Baleia Rossi afastasse mais uma das inúmeras dúvidas que o cercam: existe de fato um compromisso dele em pautar um pedido de impeachment, ou ele pode chamar isso claramente de mentira da Gleisi [Hoffmann], presidente do PT?”, cobrou Nogueira, advogando para Bolsonaro.

No campo adversário, no entorno do governador de São Paulo, João Doria - pré-candidato do PSDB à sucessão de Bolsonaro - a percepção é que prioridade máxima agora é arregaçar as mangas para eleger Baleia. O projeto de Doria contempla uma coligação de apoio à sua candidatura liderada por DEM e MDB.

Para aliados de Doria, a eleição de Lira ampliaria exponencialmente a influência de Bolsonaro no Legislativo, com hegemonia das pautas de seu interesse nas duas Casas. Nessa contabilidade, o Senado já aparece comprometido com o Planalto sob Davi Alcolumbre (DEM-AP). E assim permaneceria sob Rodrigo Pacheco (DEM-MG) - se o favoritismo do mineiro se confirmar.

Na Câmara sob Lira, a reforma tributária, bandeira do MDB, DEM e PSDB, perderia o protagonismo para outras pautas anunciadas pelo progressista, como a PEC Emergencial e a reforma administrativa.

Além disso, o comando da Câmara é estratégico pela atribuição pela abertura do impeachment. Ainda que o julgamento ocorra no Senado, na verdade, se os deputados afastarem o presidente do cargo, dificilmente ele reassume a cadeira.

É nessa conjuntura que a eventual vitória de Baleia Rossi aquece as articulações pela consolidação de um bloco que reúna PSDB, DEM e MDB em 2022. O MDB se comprometeria a não lançar candidatura própria. Em troca, teria o respaldo de DEM e PSDB à recondução do emedebista à presidência da Câmara.

A pedra - quiçá, paralelepípedo - no caminho desses planos é o racha interno no DEM e no PSDB. Por causa dessa divisão, as duas bancadas despontam como fiéis da balança na disputa pelo comando da Câmara. Estimam-se 20 votos de dissidentes para lá, ou para cá. A depender da destinação desses apoiamentos, o embate pode ir para o segundo turno.

Ontem os times de Baleia e Lira celebraram vitórias relevantes. Baleia comemorou o compromisso da bancada petista de entregar todos os 57 votos, zerando a dissidência concentrada nos paulistas.

Mas a festa do líder do PP teve gosto de fel para o grupo de Baleia e de seu maior cabo eleitoral, o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Ontem Lira foi recebido em Salvador (BA) pelo presidente do DEM, ACM Neto, expondo um racha na cúpula partidária. Segundo apuração dos repórteres Raphael di Cunto e Marcelo Ribeiro, seis deputados baianos declararam apoio a Lira: cinco do DEM e um do PSDB.

Essa agenda implica, em contrapartida, os sete votos do PP no Senado no candidato do DEM, Rodrigo Pacheco.

A leitura desse movimento nos bastidores é de que ACM Neto investiu todas as fichas na eleição do Senado, para garantir a permanência do comando do Senado na cota do DEM.

É nesse contexto que as planilhas dos grupos de Baleia e Lira se debruçam com atenção redobrada sobre os votos do DEM e PSDB. No time de Lira, a expectativa ontem era de 19 defecções a seu favor dos 33 deputados tucanos. Na planilha de Baleia, as traições no PSDB não passam de dez.

No DEM, o time de Lira contabiliza 22 deputados com ele, dos 32 da bancada de Rodrigo Maia. Em contrapartida, Maia e Baleia somam 29 votos do DEM, com quatro dissidentes.

Essa divisão conturba os planos para 2022, porque um grupo de deputados tucanos que apoia Lira prefere o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), em um projeto presidencial - na cabeça de chapa, ou como vice em uma chapa competitiva.

Doria, revigorado pela entrega da CoronaVac, mesmo assim, tem praticamente uma avalanche no caminho do projeto. Além do racha no próprio partido, há o projeto de poder do DEM.

Com três governadores, o partido de ACM Neto e Rodrigo Maia foi o que mais cresceu na eleição municipal entre os seis maiores (MDB, PP, PSD, PSDB, PT e PSL), e elegeu prefeitos de quatro capitais. Por isso, o DEM resiste a repetir o papel de vice do PSDB, e articula uma candidatura própria.

O plano A do DEM é filiar Luciano Huck. Se não prosperar, há o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta no radar, em uma aliança que reuniria MDB, Podemos e Cidadania.

Mas a pedra no caminho do DEM é o projeto de eleger o atual vice-governador Rodrigo Garcia como sucessor de Doria em 2022 - hoje, a prioridade zero de ACM Neto. Uma articulação que pode degringolar se não contar com o apoio de Doria a Garcia.

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