terça-feira, 11 de outubro de 2022

Entrevista | Antonio Lavareda: 'Votos válidos derivados das pesquisas são apenas ilações'

Em entrevista ao Pulso, sociólogo e cientista político do Ipespe defende análise baseada em votos totais, que incluem nulos, brancos e abstenções

Por Bianca Gomes / O Globo

O senhor defende que as pesquisas eleitorais sejam lidas por meio dos votos totais, e não dos votos válidos, como é feito mais tradicionalmente na véspera das eleições. Por quê?

Quando saiu o resultado da eleição, no domingo à noite, eu acompanhei os comentários e críticas e constatei que estava havendo um grande equívoco. As pessoas estavam comparando literalmente alhos com bugalhos. Alhos eram os votos válidos. Bugalhos, os votos totais. A pesquisa é baseada numa amostra extraída do total dos 156,5 milhões de eleitores. Então, o resultado das pesquisas precisa ser comparado com o resultado da eleição levando-se em conta os 156,5 milhões de eleitores. Qualquer outra comparação não faz sentido. Os votos válidos derivados das pesquisas são apenas ilações, porque a pesquisa não consegue captar a abstenção na sociedade. É importante que não se repita esse erro no segundo turno.

Por que predomina a cultura de olhar para votos válidos em vez de votos totais?

É um problema que os institutos e os veículos de comunicação precisam refletir. É preciso melhorar a qualidade da divulgação, para que o eleitor compreenda que os números da véspera são números sob o total e que entre aquele número e o resultado das eleições há um espaço de mudança, pois as pesquisas não são prognóstico, elas medem atitude, não medem comportamento. A única pesquisa que pode medir o comportamento é a boca de urna, que não foi feita este ano. Quando você compara o resultado das pesquisas sob o total e o resultado do TSE sob o total, você vê que a votação do Bolsonaro é dentro do que a fotografia das pesquisas na véspera das eleições estavam mostrando. 

Mas os votos do Lula, agora, aparecem discrepantes. Por quê?

Há uma diferença de nove pontos. A votação do Lula foi tragada, boa parte dela, pela abstenção. Lula perdeu no dia da eleição cerca de 13 milhões de votos, sem nenhuma dúvida. E onde a abstenção ocorre na sociedade? Ela é concentrada sobretudo nas camadas de menor escolaridade, que é onde tem o voto de Lula. Sabemos que 45% dos eleitores do Lula têm, no máximo, o fundamental completo. O nome da diferença do resultado das pesquisas com o resultado da eleição chama-se abstenção. A explicação para o Lula não ter levado a eleição no primeiro turno também se chama abstenção.

Como fica a abstenção no segundo turno?

Segundo turno, em geral, a abstenção cresce. Em 2018, cresceu perto de 1,5 ponto de um turno para outro. Em compensação, no segundo turno diminui o número de votos nulos, porque também a anulação do voto não é deliberada. Não existe nem uma tecla para anular o voto, a anulação do voto é erro. E, obviamente, esse erro se dá nas camadas de menor escolaridade. Quem é o candidato mais prejudicado? O Lula. Então, se seguir o mesmo comportamento de 2018, aumentar um pouco a abstenção, mas diminuir um pouco o voto nulo, talvez uma coisa compense a outra.

Por que o cálculo dos votos válidos não traz um resultado compatível com o do TSE?

Qual o equivalente à abstenção na pesquisa? Como a abstenção é um comportamento, além de ilegal, socialmente ilegítimo, o eleitor não confessa (na hora da pesquisa). Então, aparece nas pesquisas o percentual de intenção de votos dos candidatos e uns 3% ou 2% de “não sabe” ou “não respondeu”, além do branco e nulo, que fica em torno de 4%. O “não sabe” ou “não respondeu”, que é o potencial de abstenção, vira 21% na eleição. E de onde saem os outros 19%? Dos outros candidatos. Candidatos de terceira via, nanicos, sempre perdem no dia da eleição. E perde um candidato como Lula que tem uma forte concentração naquele segmento social que mais se abstém.

Nos votos válidos das pesquisas, se você exclui indeciso e quem não sabe, a margem de erro não deveria aumentar?

Na verdade, esse voto válido da pesquisa talvez nem devesse ser feito, porque a pesquisa não traz quanto vai ser a abstenção. E quando o instituto chama de voto válido, ele passa uma ideia errada para o eleitor de que o instituto calcula voto. Instituto mede intenção. Voto é comportamento efetivo. Estou começando uma discussão para ver se podemos criar uma regra, uma bula para divulgação das pesquisas.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Adorei a entrevista,eu conheço um monte de gente que é lulista,mas não vota,Bolsonarista que não foi votar conheci apenas um.