O Globo
Circulam em Brasília diferentes
teorias para explicar a escolha de Gleisi
Hoffmann para a Secretaria das Relações Institucionais (SRI) de Lula.
Para os articuladores do Centrão, ao nomear uma petista puro-sangue, o
presidente desistiu de fazer articulação política com o Congresso. A premissa é
que, se Alexandre
Padilha, com perfil mais conciliador, não conseguia cumprir acordos de
liberação de verba e cargos, com Gleisi a relação pode até não piorar, mas
melhorar é que não vai.
Aliados bem próximos do presidente avaliam
que Lula pôs Gleisi na SRI não para negociar emendas, mas para que comece já a
trabalhar na composição da aliança para disputar a reeleição em 2026. Lembram
que, em 2022, ela exerceu exatamente o mesmo papel no comando do PT e
deu certo. É mais ou menos isso o que a própria Gleisi tem dito sobre a missão
que recebeu, tanto em público quanto nos bastidores.
Embora pareçam divergentes, as duas visões partem do mesmo diagnóstico: Lula se rendeu aos fatos e aceitou que a SRI não tem poder para negociar votações com o Congresso em troca de emendas ou cargos.
Com R$ 50 bilhões por ano garantidos para
usar sem precisar do Executivo, os parlamentares não aceitam mais a liberação
de recursos a conta-gotas, como ocorria no passado. Hoje dependem muito mais
dos presidentes do Senado
Federal, da Câmara
dos Deputados e dos líderes partidários, que organizam o destino
dessas emendas, que do governo.
“Toda vez que tem algum projeto importante,
eles apresentam a conta direto ao presidente. E são sempre eles que entregam a
conta, são eles que resolvem”, resume um desses aliados.
Sabendo disso, Jair Bolsonaro não teve
problemas em delegar a Arthur Lira (PP-AL),
como presidente da Câmara, e a Ciro Nogueira (PP-PI),
senador que ocupava sua Casa Civil, a missão de “resolver” os projetos com o
Congresso. Em tese, o caminho inevitável para Lula seria fazer o mesmo e
empoderar um de seus ministros palacianos, como Rui Costa (Casa
Civil) ou a própria Gleisi. Ou então escalar alguém do Centrão para a missão.
Não fez isso, avaliam os operadores da
política, porque preferiu apostar no dique de contenção do Supremo Tribunal
Federal (STF),
que concentra as negociações sobre a regulação das emendas via Flávio Dino e
ainda abriga uma série de investigações sobre desvio na aplicação dos recursos
que miram diretamente deputados e senadores. Nesse contexto, há quem não veja
como piada a afirmação corrente no Congresso segundo a qual Dino é o verdadeiro
líder do governo.
Durante o carnaval, ele fechou acordo com os
presidentes da Câmara e do Senado para que se identifique claramente quem são
os donos das emendas, permitindo rastreamento e fiscalização da aplicação dos
recursos. Em tese, parece tudo resolvido, mas não há nesse novo plano de
trabalho nada muito diferente do que já vinha sendo exigido antes e não estava
funcionando.
Por isso o que parece ter sido garantido é
uma trégua até maio, quando o Congresso tem de demonstrar se tem cumprido os
compromissos. A menos que o cenário mude em relação ao que se viu no ano
passado, a tendência é que, ali na frente, surjam novos atritos.
Enquanto isso, Lula precisa de uma agenda
mínima que o ajude a recuperar popularidade e chegar forte a 2026. A reforma
ministerial deveria ser parte do plano. Mas até agora só se viu uma dança das
cadeiras entre petistas. Quanto mais o tempo passa, mais caro fica para os
líderes do Centrão aderir a um governo com aprovação em queda, que ruma
claramente para a esquerda.
Lula não é nenhum neófito e já conseguiu na
política muita coisa inédita. Mas fazer essa geringonça, ops, coalizão, levá-lo
à vitória em 2026 exigirá um nível a mais de inventividade e perícia.
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