domingo, 26 de junho de 2016

Novatos disputam capitais, mas ‘caras velhas’ predominam

• Em pelo menos cinco cidades, novos nomes aproveitam a rejeição crescente dos eleitores à ‘velha política’ e lançam candidaturas a prefeito; alguns, porém, já são citados em denúncias

Silvia Amorim - O Globo

-SÃO PAULO - Ex-dirigente de clube de futebol, apresentador de TV, ex-juiz federal e empresário. Essas são as “caras novas” que se apresentarão na eleição para prefeito este ano. Incentivados pelo descrédito e revolta com a classe política, os outsiders — profissionais de outras áreas que decidiram se aventurar na eleição — marcarão presença na disputa em, ao menos, cinco capitais — São Paulo, Belo Horizonte, Cuiabá, Teresina e Palmas. Eles são minoria diante da legião de candidatos, mas estão confiantes de que o discurso contra a “velha política” pode fazer sucesso nas urnas.

Na capital mineira, é um ex-cartola do futebol que se arrisca na travessia para a política. Desde que deixou a presidência do Atlético Mineiro em 2014, Alexandre Kalil ensaia uma candidatura. Na última eleição, chegou a se lançar para deputado federal, mas desistiu. Polêmico e debochado, ele disse na época que não havia nascido para ser político. Parece ter mudado de ideia. Este ano trocou de partido, do PSB para o PHS, e tentará um voo mais alto.


O ex-dirigente é tido como um dos maiores que o clube já teve pela conquista da Libertadores em 2013. Fora de campo, entretanto, o Atlético é um dos mais endividados no país. Kalil não quis falar com O GLOBO.

Outro pré-candidato em Belo Horizonte disputa o rótulo de novidade. O empresário Paulo Brant, escolhido pelo prefeito Márcio Lacerda (PSB) para disputar sua sucessão, aposta no discurso de gestor competente. Mas Brant não é um legítimo “cara nova” na política. Ele já foi secretário da Cultura no governo Aécio Neves.

O discurso da experiência empresarial como antídoto para a “velha política” tende a ganhar força nesta eleição em tempos de crise. Esse também é o trunfo do empresário João Doria Júnior (PSDB) em São Paulo.

— Eu trago o novo, a experiência privada bem-sucedida. Não trago aqui o ranço da política tradicional — diz Doria Júnior, quase como um mantra em eventos públicos.

Mas o tucano ainda tem a candidatura ameaçada por uma investigação acerca de uma infração que é a cara da velha política. Doria é suspeito de ter comprado votos na prévia do PSDB. Ele nega.

Apresentadores populares de programas de TV no Piauí e Tocantins vão virar candidatos a prefeito em Teresina e Palmas. Os jornalistas Amadeu Campos (PTB) e Marcos Poggio (DEM), respectivamente, disputarão pela primeira vez um cargo eletivo.

— Eu sempre avaliei esses convites mas nunca achei que era a hora certa. Hoje eu tenho uma situação concreta. As pessoas estão procurando uma novidade — afirma Campos.

Diante do sucesso da LavaJato, há juiz federal ingressando na política. Julier Sebastião é candidato do PDT à prefeitura de Cuiabá. Depois de ganhar notoriedade em casos de combate à corrupção, ele pediu exoneração em 2014 para se lançar a governador, mas o plano não foi adiante.

— Precisamos ter pessoas de bem na política. Sou candidato porque está proibida a doação de empresas na eleição — diz.

Uma ação judicial, entretanto, pode atrapalhar o discurso ético. No ano passado, ele virou réu acusado de receber mesada de um empresário em troca de decisão judicial. Julier nega e diz que interesses políticos pautaram a denúncia.

A campanha eleitoral começa em 16 de agosto. A maioria dos prefeitos de capitais (22) poderá disputar a reeleição.

— As pesquisas mostram que cerca de 80% dos eleitores não confiam em políticos e desejam mudança. Agora, se optarão por candidatos outsider, é uma grande dúvida — diz o especialista em levantamentos eleitorais Adriano Oliveira.

O professor do Instituto de Ensino e Pesquisa Carlos Melo alerta o eleitor a desconfiar de rótulos e analisar propostas.

— A Dilma (Rousseff ) não era a boa gestora? Deu no que deu. Temos um problema grave que é um sistema político em crise e incapaz de gerar o novo, e uma sociedade sedenta pelo novo. Nessa hora surgem os falsos profetas. Até que ponto uma figura nova nesses partidos representa realmente o novo na política? Essa é a questão.

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