Interpretado como derrota política do prefeito paulistano João Doria, o adiamento, pela Câmara Municipal, da tramitação do projeto de reforma do sistema de previdência do Município por quatro meses poderá ter consequências muito mais graves para a cidade e para sua população. Prestes a deixar o cargo, para iniciar sua campanha eleitoral ao governo do Estado de São Paulo, Doria pretendia apresentar ao eleitorado a aprovação da reforma previdenciária dos servidores municipais da capital como demonstração de sua capacidade de articulação política e de sua eficiência administrativa. Terá de encontrar outros elementos para convencer os eleitores cujo voto disputará em outubro, pois, embora necessária e urgente, a reforma teve sua votação interrompida.
Embora Doria tivesse feito concessões para a conquista do apoio mínimo necessário para a aprovação da reforma – pelo menos 28 votos entre 55 vereadores –, que garantia dispor, a base aliada do prefeito desistiu da votação da proposta neste semestre. Até mesmo na bancada do PSDB, o partido do prefeito, havia vereadores que, por interesse eleitoral muito mais do que por convicção, votariam contra a reforma. Segundo o presidente da Câmara, Milton Leite (DEM), havia “dificuldades” e “solicitações de diversos vereadores da base” (da qual ele faz parte) para a retirada do projeto da pauta por 120 dias. Nesse período, será criada uma comissão especial de estudos da Câmara para discutir nova proposta.
O projeto de reforma da previdência municipal, de iniciativa do Executivo, previa o aumento da alíquota da contribuição dos servidores de 11% para 14% e da contribuição da Prefeitura de 22% para 28%. A versão inicial do projeto previa também uma alíquota suplementar de 5% para os servidores que recebem acima do teto do benefício pago para os aposentados pelo Regime Geral de Previdência Social administrado pelo INSS, de R$ 5.645.
Pouco antes da votação do projeto, na sessão de terça-feira passada, Doria anunciou a retirada da alíquota adicional para quem ganha acima do teto do INSS. Além disso, anunciou aumento de 24% nos vencimentos dos servidores que ganham entre R$ 1.132 e R$ 1.400, faixa salarial que engloba cerca de 10 mil funcionários. Esse aumento está, porém, condicionado à aprovação da reforma.
Nem assim o projeto obteve o apoio mínimo necessário para sua aprovação. Dos oito vereadores da bancada do PSDB, só quatro compareceram à reunião convocada para o fechamento da questão em favor da reforma. Também nas bancadas do PSD, PRB, PSB, PV e PP houve resistência à reforma, seja por interesse eleitoral, seja porque os vereadores têm ligações com o funcionalismo público.
Liderados pelo Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo e pelo Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo, servidores fizeram ruidosas e violentas manifestações contra a reforma. Confundindo liberdade de manifestação, tentaram invadir a Câmara Municipal. Na ação, quebraram vidraças, atiraram pedras contra integrantes da Guarda Civil Metropolitana que tentavam proteger o patrimônio público e usaram grades para quebrar portas.
A pressão intensa mantida pelas entidades dos servidores contra a reforma parece ter intimidado parte dos vereadores, daí resultando o adiamento da reforma. Sem ela, o déficit do sistema previdenciário municipal, que alcançou R$ 4,7 bilhões no ano passado, continuará a crescer e pode chegar a R$ 8,4 bilhões em 2020. Como bem observou a Prefeitura, em nota sobre o adiamento da votação, “a cidade não pode seguir retirando recursos de áreas essenciais, como saúde, educação, segurança e habitação” para cobrir o rombo da previdência. Cada centavo a mais para assegurar os atuais benefícios dos servidores municipais é um centavo a menos em obras para melhorar a vida na cidade.
Mesmo assim, sem a reforma os contribuintes estarão sujeitos a uma ameaça persistente. Como o déficit do sistema previdenciário municipal continuará a crescer caso as regras atuais sejam mantidas, o corte de verbas destinadas a obras e melhoria de serviços poderá ser insuficiente para cobri-lo, o que, em algum momento, exigirá o aumento de impostos.
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