- O Globo
Ao mesmo tempo em que é surpreendente para quem o rejeita, e esses são menos do que já foram, passando de 44% para 34%, a melhora de Bolsonaro na pesquisa Datafolha é explicável. Vale lembrar que essa recuperação de popularidade é em relação à própria performance, mas ele continua sendo mal avaliado em relação aos outros presidentes no mesmo período de governo, só superado por Collor, o que não quer dizer nada se levarmos em conta o confisco da poupança.
O presidente Bolsonaro confiscou nossa auto-estima como povo, transformando o país num pária internacional, mas está recuperando eleitorado em várias frentes, até nas classes mais educadas e mais ricas, porque parou de fazer confusões diárias, reduzindo o grau de incerteza em que acordávamos todos os dias.
Esse apoio tem se mostrado resiliente tanto quanto o ministro da Economia Paulo Guedes, que foi a razão de boa parte do eleitorado, especialmente no Sul e Sudeste, apostar nesse azarão que se mostrou o único viável para derrotar o PT e, ao mesmo tempo, retomar uma política econômica liberal que havia sido perdida desde a saída do PSDB do poder em 2002.
Mas esse apoio provavelmente será revertido caso o ministro Paulo Guedes saia do governo, ou se ficar sem forças para barrar as manobras para furar o teto de gastos, e outras ações que abalam a credibilidade financeira do país.
O impressionante é que esse eleitorado, a suposta elite nacional, não tenha reagido às mais de 100 mil mortes pela Covid-19, preferindo a tese bolsonarista de que a economia tinha que ser reaberta mesmo sem segurança. Mais inexplicável do que a aceitação da volta ao trabalho dos precarizados e desempregados, de menor renda, que dependeram do auxílio emergencial e do funcionamento da economia para sobreviver. A conversa de Bolsonaro de que estava mais preocupado com a vida dos cidadãos, e por isso queria abrir tudo, bateu forte nesse eleitorado.
Acredito que possa acontecer com Bolsonaro o mesmo que aconteceu com Lula: vai perder as classes média e alta, ganhar nas regiões menos favorecidas, como Norte e Nordeste, e continuar competitivo. Lula perdeu o apoio desse eleitorado por causa do mensalão, mas se firmou no nicho nordestino devido ao Bolsa-Família, que agora Bolsonaro quer tomar dele com o Renda Brasil.
O auxílio emergencial, que o Congresso turbinou para R$ 600 quando Guedes queria dar apenas R$ 200, trouxe a Bolsonaro um alívio e uma certeza de que esse é o caminho para a reeleição. Mas o fiscalismo de Paulo Guedes não serve nesse modelo. O eleitorado que votou por ver no atual ministro da economia uma garantia de que as reformas seriam feitas vai refluir.
Boa parte achava que Guedes ia mandar em Bolsonaro, que gostava de alardear que não entendia nada de economia, que estava terceirizando para o seu Posto Ipiranga as decisões. Mas agora que o presidente descobriu que pode mandar, com apoio do centrão, acostumado a gastos do governo, a não perder os cargos das estatais, e dos militares, dificilmente vai ser controlado.
Golbery do Couto e Silva, o feiticeiro do governo Geisel, dizia a respeito de Figueiredo que quando o presidente eleito sobe aquela rampa do Palácio do Planalto, com todas aquelas honras e cornetas, chega lá em cima convencido de que está lá por mérito próprio. E sempre tem um áulico para dizer que ele tem razão. Bolsonaro, a esta altura, deve estar convencido de que já entende de economia o bastante para, pelo menos, buscar novos conselheiros.
Como o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, de quem o próprio Guedes lhe falou maravilhas na aprovação da reforma da Previdência. Bolsonaro aprendeu a comer pelas beiradas nessa nova fase, e deixou de bravatear sua força. Foi passando as boiadas, em silêncio, e, bom cabrito, já não berra ao ser derrotado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ou pelo Congresso.
O teto de gastos vai sendo minado dia sim, outro também, na dubiedade que o caracteriza. No Congresso, vai para frente e para trás na relação com o presidente da Câmara Rodrigo Maia, hoje o único apoio que Guedes tem para resistir aos desenvolvimentistas irresponsáveis. Mas, e se Rodrigo Maia sair da presidência, terá condições de eleger um sucessor tão comprometido com as reformas e o controle fiscal, ou o Centrão fará o sucessor?
Como escrevi no início, a melhora de Bolsonaro é explicável.Um velho adágio político diz que a decisão do eleitor para votar passa primeiro pelo bolso, depois pelo estômago, em seguida pelo coração e, por fim, pelo cérebro.
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