Seria
um equívoco ler seu destino nas cartas distribuídas nas eleições municipais
As
eleições municipais confirmaram o que se viu em 2018: o Brasil dobrou à direita
–muito embora os partidos que se beneficiaram dessa virada sejam muitos e
diferentes em tamanho e relações com o governo.
De
seu lado, mesmo derrotadas, as esquerdas se revelaram competidoras aguerridas
em capitais e cidades maiores. Ganhando ou perdendo, mobilizaram os jovens e
estão levando pautas progressistas às Câmaras Municipais.
Com razão, comentaristas tem destacado que vitoriosos foram os partidos de oposição a Bolsonaro situados no centro-direita e na direita. PSDB, MDB e DEM governarão o maior número de brasileiros, mesmo tendo perdido Prefeituras. Também é verdade que os candidatos abertamente apoiados pelo presidente foram derrotados; a maioria, já no primeiro turno.
Não
está claro, porém, o que isso diz da força política do chefe do governo. E
seria um equívoco ler seu destino nas cartas distribuídas nas eleições
municipais. Primeiro, porque, salvo o PTB, todas as siglas ajuntadas no
centrão, que o sustentam no Congresso, cresceram de
forma muito significativa.
Depois,
porque, amargando embora a derrota de seus candidatos, o presidente sem partido
tem ainda o apoio de 37% dos brasileiros, segundo a pesquisa XP-IPESP, feita
após o primeiro turno. Uma porcentagem muito próxima à do primeiro mês de seu
mandato (40%), em franca recuperação do seu pior momento, em maio deste ano
(25%).
Especialistas
no estudo da opinião pública costumam estimar que algo em torno de 15% do
eleitorado forma o núcleo duro dos adeptos de Bolsonaro. De fato, a pesquisa
“Impactos Políticos da Pandemia”, coordenada pelo cientista político Carlos
Pereira, da Fundação Getúlio Vargas, encontrou, em duas rodadas,
respectivamente 15,2% e 18,5% dos entrevistados que se dizem dispostos a votar
de novo nele em 2022.
No
poder, o ex-capitão deu cara e alcance nacional à minoria extrema que já
existia no país, mas não tinha um líder com o qual pudesse identificar-se na
grosseria da fala, no primarismo da visão de mundo e no medievalismo em matéria
de valores e condutas. Essa extrema direita não se esfumará.
Antes,
continuará a mostrar presença no dia a dia e na arena eleitoral. Sua relação
com os outros tons da direita dependerá de muitas coisas: por exemplo, do que o
governo fará ou deixará de fazer diante do repique da pandemia, com as vacinas,
com a economia. Mas também das estratégias das direitas —das mais próximas ao
governo às mais centristas— e, em menor medida, do que façam as esquerdas daqui
até 2022. Bolsonaro não acabou e dificilmente acabará tão cedo.
*Maria Hermínia Tavares, professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.
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