quarta-feira, 28 de setembro de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Bolsonaro comete abusos ao decretar sigilo de cem anos

O Globo

Executivo impôs segredo máximo a 65 casos, boa parte ligada a aliados do presidente ou a sua família

Duas características do presidente Jair Bolsonaro se retroalimentam: seu caráter paranoico e sua natureza opaca. Entre 2019 e 2022, o Executivo impôs sigilo de cem anos a 65 casos que deveriam ser públicos. Esse é o número de pedidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) negados pelo governo federal, segundo levantamento do jornal O Estado de S. Paulo. A análise dos casos deixa claro o abuso, o cerceamento indevido ao direito de todo cidadão à informação.

É óbvio que todo país precisa de proteção jurídica para guardar segredos de Estado, necessários à sua segurança e à da sociedade. A primeira legislação sobre o tema foi criada no Reino Unido no final do século XIX e inspirou regras semelhantes no mundo todo. Um século depois, leis passaram a ser desenhadas para tentar coibir o zelo excessivo de governos com seus segredos em detrimento dos cidadãos. O acesso a informações passou a ser encarado como componente essencial da liberdade de expressão e dos direitos humanos. Foi nesse contexto que, em 2012, a LAI entrou em vigor no Brasil.

Até a chegada de Bolsonaro ao Planalto, a lei brasileira foi empregada sem sobressaltos. Protegeu e controlou informações sigilosas e, ao mesmo tempo, permitiu a divulgação de dados à sociedade. A mudança começou em 2021. Em maio, o general Eduardo Pazuello, já como ex-ministro da Saúde, participou ao lado de Bolsonaro de ato político no Rio de Janeiro, em evidente infração disciplinar para militares da ativa.

O Exército abriu um processo administrativo, arquivou-o e, não satisfeito, impôs um sigilo de cem anos sobre o caso. Como não havia o menor sinal de risco para a sociedade ou para o Estado, foi usado como sustentação legal um dispositivo da LAI sobre o tratamento de informações pessoais, que “deve ser feito de forma transparente e com respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e garantias individuais”. Um abuso, já que a decisão de não punir Pazuello é de óbvio interesse público.

O acesso restrito, diz a lei, pode durar pelo prazo máximo de cem anos. “O artigo foi pensado como exceção, não para ser usado de forma ampla e discricionária, como tem acontecido”, afirma o jurista Gustavo Binenbojm, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

Entre os usos flagrantemente abusivos da lei, o governo decretou a proteção por um século das mensagens diplomáticas sobre os ex-jogadores Ronaldinho Gaúcho e Assis (presos no Paraguai em 2020 por uso de documento falso); de informações sobre o médico bolsonarista Victor Sorrentino, detido no Egito acusado de assediar uma vendedora; da carteira de vacinação de Bolsonaro; dos nomes de quem visitou a primeira-dama Michelle Bolsonaro no Palácio da Alvorada; das informações sobre os crachás de acesso ao Palácio do Planalto emitidos em nome dos filhos Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

Entrincheirado em sua leitura inusitada e controversa da lei, o governo Bolsonaro armou uma barreira aos mais diversos e inexplicáveis assuntos. O candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, prometeu revogar o sigilo na maioria desses casos, caso saia vitorioso. Saber do que Bolsonaro tem tanto medo é um primeiro passo. O segundo, e mais importante, é evitar que a LAI seja desvirtuada novamente.

STF precisa garantir que plataformas digitais respeitem a Justiça do Brasil

O Globo

É absurda a demanda para que juízes americanos tenham de dar aval às decisões dos brasileiros

Está previsto para hoje no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento de uma Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) defendendo que provedores de internet e plataformas digitais não sejam obrigados a fornecer informações diretamente à Justiça brasileira sem que tenham sido instados a isso por autoridades de seus países de origem, no âmbito dos acordos de cooperação internacional de que o Brasil é signatário. O Supremo tem mais uma oportunidade de recusar essa ação descabida ou de pelo menos negar a reivindicação absurda.

Os motivos não mudaram desde a última vez em que a ação entrou na pauta. Acatar a demanda dos provedores equivaleria a solapar a autoridade dos juízes brasileiros para investigar crimes cometidos por meio digital. Como a maioria das plataformas está sediada nos Estados Unidos, significaria que eles estariam obrigados a esperar a cooperação das autoridades americanas para obter informações essenciais em investigações contra suspeitos que tenham usado as plataformas digitais para violar a lei, ainda que a partir de terminais localizados no Brasil ou tendo como vítimas cidadãos ou empresas brasileiros.

Entre 2016 e 2019, 74% dos pedidos de cooperação da Justiça brasileira à americana, feitos por intermédio do Tratado de Assistência Jurídica Mútua (MLAT), não foram atendidos total ou parcialmente. O tempo médio de resposta foi de dez meses. Imagine se um juiz tiver de esperar tudo isso para obter informações sobre suspeitos de tráfico, contrabando, pedofilia ou outros crimes cometidos com ajuda da comunicação digital. Seria um despropósito. Para não falar nas situações em que a legislação americana e a brasileira tratam crimes de modo distinto — caso da regulação sobre desinformação ou liberdade de expressão.

É inadmissível que empresas estrangeiras que mantêm filial no Brasil não aceitem se submeter à lei brasileira. A Constituição não deixa de lhes oferecer nenhum tipo de proteção para que conduzam seus negócios em clima de plena liberdade. Nem é leniente com a proteção à privacidade ou com a garantia da livre expressão dos cidadãos em todo tipo de comunicação, dentro ou fora do meio digital. É simplesmente ridículo achar que o uso da internet no Brasil deva estar sujeito ao aval de outras autoridades que não as brasileiras — pouco importa onde estejam localizados os servidores que armazenam as comunicações.

A ADC é apenas mais um subterfúgio de algumas empresas para fugir a suas obrigações legais. Além do mais, não é o instrumento jurídico adequado para tratar do assunto, já que inexiste controvérsia relevante de cunho constitucional no caso. Todas as normas em questão são infraconstitucionais, e o Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou contra a demanda dos provedores. A tentativa de estender o assunto só contribui para aumentar a insegurança jurídica sobre a investigação dos milhares de crimes cometidos via internet.

Licença para gastar?

Folha de S. Paulo

Será difícil evitar alta da despesa; próximo governo precisará programar ajuste

Dissemina-se entre observadores da economia brasileira, candidaturas e mesmo credores da dívida pública a ideia de que seria inevitável conceder uma espécie de licença para gastar ao próximo governo, em seu primeiro ano.

Por esse raciocínio, alguma despesa extra, acima do autorizado pelo já desfigurado teto inscrito na Constituição, estaria politicamente contratada. No exemplo mais notório, cita-se a prorrogação do Auxílio Brasil no valor de R$ 600 mensais. Pode haver muito mais.

Nessa interpretação da situação orçamentária, está embutida a percepção, talvez mero desejo, de que o próximo governo também vá apresentar um plano de limitação do aumento da dívida pública —uma nova regra fiscal.

Além disso, calcula-se que a apresentação de projetos de reforma econômica e do setor público melhoraria as expectativas de crescimento, o que ao menos atenuaria os danos causados por mais uma procrastinação do claudicante ajuste das finanças públicas.

Em abstrato, o plano não é inviável. Um ajuste paulatino era justamente a ideia do teto de gastos, criado pelo governo de Michel Temer (MDB) em 2016. Houve na época licença política para promover um aumento de dispêndios antes que a porta fosse fechada.

Apesar disso, a norma teve —e, mesmo já aviltada, não deixa de ter— papel importante na contenção da despesa e na formação de expectativas que afetam as taxas de inflação, câmbio e juros.

A incerteza eleitoral, as promessas de desmonte do teto e, agora, a difusão da ideia de uma folga orçamentária em 2023 não têm causado deterioração maior das condições financeiras. Em certa medida, trata-se de uma surpresa, pois, fora platitudes e generalidades, desconhecem-se os programas econômicos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).

Em termos de volatilidade dos mercados, esta é uma eleição quase tranquila, ainda mais quando se considera o estado lastimável das contas do Tesouro Nacional.

O custo de financiamento da dívida cresceu, dada a alta dos juros; é difícil de acreditar que a receita do governo volte a aumentar no ritmo espantoso deste ano; o potencial de expansão do Produto Interno Bruto é ora muito baixo.

Uma piora do cenário pode ser rápida se houver decepção com o programa e os quadros do novo governo, ou com desconfiança na força da coalizão política. Se houver mais procrastinação, as taxas de juros voltarão a subir, o investimento produtivo vai se retrair e terá sido perdida aquela janela de oportunidade que se oferece ao presidente que inicia seu governo.

Pedras no caminho

Folha de S. Paulo

Após 4 meses, ações na cracolândia acumulam resultados modestos e incertezas

"Cinco pedras", pede o homem ao entregar uma nota de R$ 50. "O senhor trabalha?", pergunta o suposto traficante, após uma rápida conversa. "Cinco pedras", repete por duas vezes o dependente químico, visivelmente debilitado.

O imaginário vendedor de crack —na realidade o delegado Roberto Monteiro— chefiava uma operação contra o tráfico, em um prédio abandonado no centro de São Paulo, e acabou confundido.

O policial classificou o episódio como "triste" e "surreal". Já o usuário, ao notar que a negociação não iria adiante, logo partiu —não sem antes pegar seu dinheiro de volta.

A cena insólita, flagrada pela Folha no último dia 20, ilustra a dimensão do flagelo na região da cracolândia, agora pulverizada pela capital paulista após mais de quatro meses de controversas intervenções lideradas pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) e pelo governador Rodrigo Garcia (PSDB).

Desde que uma blitz desocupou a praça Princesa Isabel, onde se concentrava o fluxo, usuários perambulam e se instalam em pontos diversos, num jogo de gato e rato com as forças de segurança.

Espalhadas, as minicracolândias têm prejudicado comerciantes e assustado pedestres e moradores, muitas vezes acuados entre a desordem pública, a insegurança e as recorrentes ações de repressão.

Um ponto crítico parece ser a rua Helvétia. No último dia 13, escamoteados em barracas e bancas, traficantes vendiam crack livremente a poucos passos de uma delegacia. Não longe dali, na região da Santa Ifigênia, moradores contam que, à noite, o feirão ocorre aos gritos de "olha o pó, olha a pedra".

Coibir o agrupamento em um só local faz parte do modelo adotado por prefeitura e governo do estado. Avalia-se que a desarticulação obstrui o comércio de entorpecentes e facilita intervenções para estimular usuários a buscar tratamento.

A estratégia é criticada por especialistas que defendem uma política de redução de danos menos repressiva e de acolhimento.

Os resultados até agora se limitam a prisões que parecem não inibir o crime, apreensões esporádicas e algumas internações.

Não resta dúvida de que ainda é cedo para cobrar resultados duradouros diante de uma chaga que assola a cidade há décadas.

As incertezas, contudo, podem crescer em 2023 com uma possível troca de comando no Bandeirantes. É crucial que os postulantes, entre eles o incumbente, esmiúcem seus planos além de promessas vagas e soluções simplistas.

Lula não gosta de ‘capiau’

O Estado de S. Paulo

Ao regurgitar preconceito contra paulistas do interior e contra o agronegócio, o petista reafirma sua natureza divisionista e revela que é ele quem ignora um Brasil que trabalha e produz

Há muitas razões para que o País se preocupe com uma eventual volta de Lula da Silva ao poder, e uma das principais é a demonização do agronegócio e dos homens e mulheres que vivem no interior – tidos e havidos pelos arrogantes petistas das grandes cidades como atrasados. O demiurgo de Garanhuns se apresenta como redentor da democracia, mas nessa democracia não cabem os brasileiros do campo que não votam nele, pois os considera ou ignorantes ou reacionários.

Numa entrevista ao SBT, Lula da Silva referiu-se ao presidente Jair Bolsonaro, seu principal adversário na disputa, como “um ‘ignorantão’, meio chucro, que fala palavrão, (com) aquele jeitão bruto dele, um jeitão de capiau, do interior de São Paulo, bem ignorante mesmo”.

Na realidade, foi Lula quem demonstrou profunda ignorância ao tratar assim, de forma tão ordinária e preconceituosa, milhões de brasileiros que ele pretende governar a partir de 1.º de janeiro de 2023.

É isso um estadista? É nesse homem que, segundo indicam as pesquisas, a maioria dos eleitores pretende depositar a esperança de que venha a ser o presidente de todos os brasileiros, alguém capaz de pacificar e unir o País após quatro anos desse pesadelo bolsonarista? Custa acreditar que alguém como Lula, a essa altura, ainda tenha uma visão tão obtusa sobre o povo do interior de São Paulo.

Os “capiaus” não são essa horda de bárbaros afeitos à intolerância e ao preconceito que Lula acredita que sejam. O interior de São Paulo faz deste um grande Estado e faz do Brasil um grande país. Muitos países mundo afora não geram a riqueza que o interior paulista gera. Só o PIB do chamado Quadrilátero Paulista – formado pelas cidades de Sorocaba, Campinas, Santos e São José dos Campos – é da ordem de R$ 1,3 trilhão, quase a metade do PIB paulista e 16% do PIB nacional, de acordo com os dados da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade). É essa porção pujante e trabalhadora do Brasil que Lula afronta.

Por incrível que pareça, um dos alvos do preconceito de Lula contra os paulistas, ainda que ele possa não ter recebido a infeliz declaração como a agressão que foi, é o “capiau” da cidade de Pindamonhangaba que compõe a chapa petista na disputa pela Presidência. Seria muito interessante saber o que pensa o ex-governador Geraldo Alckmin sobre a ideia que seu mais novo companheiro faz dos paulistas do interior do Estado que tantos votos deram ao ex-tucano em outras eleições.

Mas não foi a primeira vez, nesta campanha, que Lula agrediu gratuitamente os brasileiros do interior. Em recente entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, o petista referiu-se a “um setor” do agronegócio como “fascista e direitista”. Decerto só não fazem parte desse “setor” maldito aqueles que aceitam Lula da Silva como seu salvador.

Os brasileiros com boa memória haverão de lembrar qual é o modelo ideal de “homem do campo” para Lula. Decerto não é o “capiau” paulista que trabalha e produz nem o “fascista e direitista” que engorda o PIB do País. É aquele militante do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), grupo de arruaceiros que transformaram a invasão de terras produtivas e a destruição de patrimônio de produtores agrícolas em arma política para promover uma “Reforma Agrária Popular”, como consta de seu manifesto – que defende, ademais, o “controle de empresas estratégicas” e uma “auditoria da dívida externa”. 

Esse militante aguerrido, graduado nos “cursos de formação política” que o MST oferece, parte para a briga a um sinal de comando, se necessário for, para fazer valer as vontades do chefão petista. Foi nisso que apostou Lula quando invocou o notório “exército do Stédile”, em referência ao líder do MST, João Pedro Stédile, para defender o governo da então presidente Dilma Rousseff e intimidar manifestantes a favor do impeachment. “Eu quero paz e democracia, mas, se eles não querem, nós também sabemos brigar, sobretudo quando o Stédile colocar o exército dele ao nosso lado”, disse Lula durante um ato no Rio de Janeiro, em 2015. Não faz muito tempo.l

O medo que corrói a democracia

O Estado de S. Paulo

Não há liberdade quando a manifestação de escolhas políticas é tolhida pelo medo. Nesse ambiente de apreensão, já não se pode falar de democracia, mas de simulacro de democracia

Populistas com propensão ao autoritarismo, como é o caso do presidente Jair Bolsonaro, quando não deram causa, agravaram a chamada crise da democracia liberal. O tema é bastante estudado nas universidades e tem sido objeto de dezenas de livros lançados nos últimos anos, mas está longe de ser apenas um desassossego intelectual. A crise da democracia se manifesta de forma concreta no cotidiano das pessoas. E, não raras vezes, por uma de suas faces mais perversas: o medo da violência causada por escolhas políticas.

A poucos dias das eleições gerais, a pesquisa Violência e democracia: panorama brasileiro pré-eleições de 2022, realizada pelo Datafolha a pedido do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), revelou que quase 70% da população brasileira afirma sentir medo diante da escalada da violência política. Pudera: há poucas semanas, o País assistiu, com um misto de consternação e incredulidade, aos brutais assassinatos de dois eleitores do petista Lula da Silva por apoiadores de Jair Bolsonaro.

Esses foram os dois episódios mais trágicos, até agora, dessa onda de violência política que assola o País em escala inaudita. Decerto não são os únicos. Na verdade, há tantas manifestações de hostilidade a pensamentos políticos divergentes que muitos cidadãos já se sentem afetados pelo problema.

De acordo com a pesquisa, quase metade dos brasileiros (49,9%) diz sentir “muito medo” de ser vítima de agressões físicas por suas afiliações político-partidárias. Outros 17,6% dizem sentir “um pouco de medo”. Apenas 32,5% não temem ser alvo de violência política.

“É difícil falar em eleições livres e justas com este nível de violência. As eleições estão ameaçadas não pelas razões que (o presidente Jair) Bolsonaro suspeita, as urnas eletrônicas, mas pela violência política”, disse ao Estadão o presidente do Fórum, Renato Sérgio de Lima. “Temos uma população amedrontada”, resumiu a cientista política Mônica Sodré, diretora executiva da Raps.

Ainda de acordo com o levantamento, 3,2% dos entrevistados disseram ter sido vítimas de ameaças por suas posições políticas; e 0,8% relatou já ter sofrido violência física. À primeira vista, a frieza da estatística pode não dar a exata dimensão da extrema gravidade do problema. Mas está-se falando de cerca de 8,5 milhões de brasileiros que já sofreram algum tipo de violência ou ameaça apenas por terem exercido o direito à livre manifestação do pensamento assegurado pela Constituição. Isso é inaceitável para todos os genuínos democratas, de qualquer coloração partidária.

Não há liberdade quando a manifestação do pensamento político-ideológico é tolhida pela força do medo. E, quando os cidadãos não se sentem livres para manifestar suas escolhas políticas, já não se pode falar de democracia, mas de um simulacro de democracia.

O presidente Bolsonaro é a personificação de uma política de confronto que desagrada a grande parcela da população. Não surpreende a enorme rejeição a seu nome. Talvez inebriado pelos quase 58 milhões de votos que recebeu em 2018, Bolsonaro tenha entendido essa expressiva votação como uma autorização para que ele levasse adiante sua agenda de destruição. Na verdade, Bolsonaro não foi capaz de compreender – talvez não seja até hoje – a excepcionalidade da conjunção de fatores que, há quatro anos, alçou alguém com seu perfil à Presidência da República.

Bolsonaro não inventou a violência política, obviamente. Mas é certo que fez da violência e do conflito permanente a essência de sua persona política. Isso é inédito na história recente do País, um presidente que faz do estímulo à violência política, em suas muitas formas de manifestação, uma ação de governo. Foi sob Bolsonaro que a violência política se tornou pauta no debate público e objeto de pesquisa. 

Mas, a julgar pelas pesquisas de intenção de voto, milhões de eleitores parecem fartos de viver sob essa tensão permanente. E dão sinais de que dirão isso exercendo a maior das liberdades democráticas: o voto.

Firmeza e cautela na política do juro

O Estado de S. Paulo

Copom mostra prudência ao interromper ciclo de aperto do crédito sem abandonar compromisso de controlar a inflação

Manter em 13,75% a taxa básica de juros foi uma importante demonstração de prudência do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC), em sua reunião da semana passada. Depois de 12 aumentos seguidos, é tempo de interromper o ajuste e avaliar o efeito dessa política no combate à inflação. A trégua é especialmente bem-vinda, neste momento, quando as grandes economias perdem impulso e cresce o temor de recessão generalizada. Tendo iniciado o aperto com atraso, os bancos centrais do mundo rico avançam agora na elevação dos juros, impondo uma poderosa trava à atividade global. No Brasil, os negócios avançaram com vigor no primeiro semestre e já se observam sinais de alguma acomodação. As condições são propícias, portanto, a uma revisão da estratégia.

Também no varejo há uma sinalização de trégua. A prévia da inflação diminuiu 0,37% em setembro, tendo já recuado 0,73% em agosto. Em 12 meses ficou em 7,96% a alta acumulada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15). No mês anterior esse aumento havia chegado a 9,60%. Talvez seja impróprio falar de uma desinflação, porque essa baixa do indicador tem resultado principalmente da redução de impostos indiretos. Uma novidade especialmente animadora, em setembro, foi a queda de 0,47% do item alimentação e bebidas. Em 12 meses, no entanto, o encarecimento desse item bateu em 12,76% – uma evolução muito desfavorável num quadro de empobrecimento de milhões de famílias.

Ao anunciar a interrupção da alta de juros, o Copom mostrou-se triplamente cauteloso. Em primeiro lugar, indicou a “cautela e a necessidade de avaliação, ao longo do tempo”, dos efeitos do aperto já realizado. Em segundo, mostrou prudência ao ressaltar a influência dos preços administrados, como os de combustíveis e telecomunicações, na aparente desinflação. Em terceiro, reafirmou o compromisso com o ajuste até haver sinais claros de inflação perto da meta e de acomodação das expectativas. Além disso, os aumentos de juros serão retomados, segundo a ata da reunião, se os preços voltarem a subir perigosamente.

Na deliberação da semana passada, dois dos nove membros do comitê defenderam “elevação residual” de 0,25 ponto. Esse aumento, argumentaram, serviria para fortalecer a “mensagem de comprometimento” com a estratégia. A mensagem, de toda forma, foi transmitida com clareza. Uma passagem da ata deve eliminar qualquer dúvida: “O comitê enfatiza que não hesitará em retomar o ciclo de ajuste, caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”.

Como em outras manifestações, o Copom ressalta entre os fatores de preocupação a incerteza sobre a evolução das contas públicas e sobre os efeitos de novos estímulos destinados a fortalecer a demanda. Parte dos estímulos concedidos como jogadas eleitorais afetará as contas em 2023. Isso deveria bastar como advertência para quem assumir a Presidência da República em janeiro. O espaço para bondades na gestão financeira estará em boa parte ocupado antes da cerimônia de posse.

Aperto monetário global inquieta mercados cambiais

Valor Econômico

A inquietação no mercado de moedas é fator adicional de turbulências na desaceleração global

As elevações síncronas e rápidas das taxas de juros nas principais economias desenvolvidas estão derrubando os preços dos títulos de renda fixa e ações por toda a parte, aumentando a instabilidade dos mercados financeiros e criando alvoroço onde não havia, ou era restrito aos países emergentes - no mercado de moedas. Em um ambiente de grande incerteza, erros de política econômica em um país tem o poder de se espalhar rapidamente pelos mercados globais. As desventuras da libra esterlina são um capítulo de uma história sem fim a vista.

O partido conservador inglês, após Boris Johnson ter sido expelido do poder, voltou no túnel do tempo, resgatou Margaret Thatcher e lançou um programa de corte de impostos e desregulamentação de 45 bilhões de libras, alocando mais 65 bilhões de libras, em seis meses, para impedir que a enorme alta dos preços de energia se abata sobre os orçamentos familiares e das empresas. Tudo somado, calcula-se que o governo se endividará em 190 bilhões de libras em um momento em que as taxas de juros estão subindo e a inflação chegou a 9,9% em agosto. Objetivo: estimular a economia e obter crescimento de 2,5% ao ano.

O ministro Kwasi Kwarteng abriu as portas do inferno para a economia britânica, que já não ia bem. A libra teve na segunda-feira desvalorização recorde desde 1985 e os títulos soberanos da dívida foram abandonados pelos investidores, com o papel de 10 anos subindo para 4,5%, a maior taxa em 14 anos, e o de 5 anos encostando em 5%, maior rendimento desde 2002. Desde 2014, a libra perdeu um quarto de seu valor ante o euro e 50% ante o dólar. No ano até agora, está entre as moedas mais desvalorizadas entre as economias relevantes, um pouco atrás apenas da lira turca, do peso argentino, o campeão.

A crise britânica, como foi apontado, tem traços semelhante a de países emergentes, com sua moeda sob intensa desvalorização e um déficit em conta corrente gigantesco, de 8% do PIB no segundo trimestre do ano. Essa marca só foi ultrapassada três vezes na história do país, todas durante a II Guerra Mundial. A receita errada na hora errada colocou o Banco da Inglaterra (BC) em delicada situação.

Para impedir a desvalorização da libra, os juros têm de subir mais do que já vinham subindo para combater pressões inflacionárias fortes. O banco, em meio ao turbilhão dos mercados, afirmou que poderia elevar os juros se necessário, mas declinou de reunião de emergência e só prometeu avaliação ampla da situação em seu próximo encontro, em novembro. O ministro Kwarteng disse que apresentará seu plano fiscal de longo prazo também em novembro, deixando por um tempo demasiado a economia britânica ao sabor da instabilidade.

Quanto maior a instabilidade, venha de onde vier, mais o dólar é procurado como porto seguro dos investidores. Moedas emergentes deixaram de ser as únicas punidas pela valorização da moeda americana, dividindo essa honra com os países desenvolvidos. No ano, a libra perdeu 21%, o yen, 20%, o euro, 16% e o dólar canadense, 10%. O real e o rublo russo são as divisas com a melhor performance até agora.

O dilema do Banco Central inglês é também o de outros países que enfrentam desvalorizações intensas. Subir mais os juros quando as economias estão perdendo velocidade é tornar uma recessão incerta uma certeza. O agravante inglês é que o governo está expandindo a dívida pública em um momento em que ela está se tornando muito cara e, pelo efeito sobre a libra, obrigando BC a agir para torná-la ainda mais cara. Mas o pesadelo da libra está elevando as taxas dos títulos soberanos europeus e aumentando o spread entre o das economias mais fortes, como Alemanha (2,25% do Bund 10 anos) e mais fracas (como Itália, que subiu para 4,7%), sinal certo de mais dificuldades para o euro à frente.

A força do dólar, no entanto, não é a dos ativos financeiros americanos. Os títulos do Tesouro perderam 12,5% de seu valor (quando o preço cai, o juro sobe), a maior queda desde 1974, segundo a Oxford Economics. O índice S&P já caiu 23,3% no ano, o maior tombo desde a crise financeira de 2008. O ajuste deve prosseguir enquanto o aperto monetário do Fed não estiver definido em sua amplitude total.

A inquietação no mercado de moedas é fator adicional de turbulências na desaceleração global, ao reduzir a capacidade da política monetária em conter a inflação, ou obrigá-la a ser mais radical, com maiores estragos na economia.

 

7 comentários:

Anônimo disse...

Sim, bozo abusa com sigilos de 100 anos. Lula acabará com isso, investigará a famiglia e as torpezas do bozo virão à tona, culminando em prisões.
Portanto, LULA LÁ!

Anônimo disse...

"desconhecem-se os programas econômicos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL)"
Sim, mas o plano anterior de LULA foi UM SUCESSO. O do bozo, q espera-se seja único, UM DESASTRE.
Então, LULA LÁ!

Anônimo disse...

"Será difícil evitar alta da despesa; próximo governo precisará programar ajuste"
Sim, concordo, mas a culpa deste descalabro é do bozo_guedes, a dupla realmente infernal.
Lula vai equilibrar as contas como fez anteriormente.
Portanto, LULA LÁ pra reconstruir tudo q o bozo destruiu.

Anônimo disse...

"Ao regurgitar preconceito contra paulistas do interior e contra o agronegócio, o petista reafirma sua natureza divisionista e revela que é ele quem ignora um Brasil que trabalha e produz"
Isso é de uma injustiça tremenda! Mentira.

MAS NAO SURPREENDE POSTO Q VINDO DO JORNALECO DA "ESCOLHA DIFÍCIL".
Seus editoriais são péssimos assim como sua visão. Concluir por uma palavra q LULA tem natureza divisionista não é jornalismo mas torcida. Por isso está imprensa perde relevância a cada dia.

Anônimo disse...

"Bolsonaro não inventou a violência política, obviamente. Mas é certo que fez da violência e do conflito permanente a essência de sua persona política. Isso é inédito na história recente do País, um presidente que faz do estímulo à violência política, em suas muitas formas de manifestação, uma ação de governo. Foi sob Bolsonaro que a violência política se tornou pauta no debate público e objeto de pesquisa"
VERDADE!
Mas o jornaleco deveria admitir q LULA é a antítese do bozo. Não fazendo, o editorial fica injusto. O jornaleco deixa uma saída pros asseclas do palerma-presidente ao dizer q bozo não inventou a violência política mas isso é irrelevante posto q óbvio - bozo simplesmente usa a violência e não tem capacidade nenhuma pra criar algo.

Anônimo disse...

O genocida criou a sua FAMILÍCIA...

Anônimo disse...

Amostra que o PT não mudou em nada essas opiniões acima.Se o Lula ganhar a agressividade desse pessoal se instalara imediatamente. Eu não voto Bolsonaro. Toda cautela e caldo de gslinha.