Folha de S. Paulo
Quando se trata de punir racismo, país tem
improvisação e pouca efetividade
A esmagadora maioria festejou, mas confesso
que fui tomada por uma sensação de estranhamento em relação à euforia quanto à
sanção da Lei 14.532/2023, em janeiro.
O dispositivo alterou a legislação sobre
crime racial e o Código Penal para tipificar a injúria racial como racismo e
determinar penas de suspensão de direito em caso de o crime ser praticado no
contexto de atividade esportiva ou artística, além de penalizar o racismo
religioso, o recreativo e o praticado por funcionário público.
Num país onde a intolerância com religiões
de matriz africana é crescente, pareceu esquisito que alguns dos principais
problemas relacionados ao chamado "racismo religioso" não tenham sido
contemplados. Temas como incitação ao ódio, indução à violência, ataques a
templos, agressões físicas e constrangimentos a crianças nas escolas ficaram de
fora.
Além disso, considerando o fato de que os problemas dos brasileiros, em geral, estão muito mais associados à insuficiência na aplicação do arcabouço legislativo existente do que à sua escassez, é possível que muito pouco ou nada se altere na prática.
Também não é demais lembrar que a injúria
racial já havia sido equiparada ao racismo, com todas as consequências advindas
desse crime, pelo STJ e pelo STF. Embora até agora ninguém tenha parado no
xilindró por crime de injúria nem de racismo.
O jurista Hédio Silva Júnior, doutor em
direito e coordenador-executivo do Idafro (Instituto de Defesa dos Direitos das
Religiões Afro-Brasileiras), costuma afirmar que um dos males do país é o que
ele chama de "volúpia penal", referindo-se ao apreço pelo direito
penal. "Temos um cipoal de leis na área trabalhista, cível, possibilidade
de jurisdição internacional e não usamos", diz ele.
Quando se trata da questão racial, segundo
Hédio há um agravante: "Assunto de preto é tratado como ‘assunto de
preto’: com improvisação, inconsistência e pouca efetividade." Conclusão
triste.
Um comentário:
Se o ser humano fosse mais evoluído não precisaria nem de lei para tal crime.
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