Valor Econômico
Lula indica pouca ambição em suas
prioridades para 2023
O jogo começou. Empossados os novos (e
velhos) parlamentares e (re)escolhidos os presidentes da Câmara e do Senado, o
ano político de 2023 iniciou-se oficialmente na quarta-feira (1/2).
Seguindo o protocolo, Lula enviou ao Congresso uma Mensagem Presidencial apresentando suas prioridades para o ano. O documento está estruturado em três partes: uma saudação inicial, um capítulo apresentando seu “Programa de Reconstrução e Transformação do Brasil” e o relatório da Equipe de Transição sobre o estado em que receberam o país de Bolsonaro.
A mensagem de Lula aos parlamentares não
traz uma lista apartada de projetos legislativos que serão alvo do esforço de
negociação do Poder Executivo. É preciso ler com lupa as 180 páginas para
separar o que é um mero Ctrl C + Ctrl V de promessas genéricas de campanha
daquilo que constitui uma efetiva agenda de propostas a serem trabalhadas junto
a senadores e deputados federais.
Como está claro no novo slogan do governo
federal escolhido pelos petistas - União e Reconstrução -, o teor da Mensagem
Presidencial também indica que Lula não quer briga com ninguém no início deste
terceiro mandato (pelo menos, não no Legislativo) e que boa parte das suas
ações estarão concentradas em restaurar políticas públicas desvirtuadas nos
últimos quatro anos. Em outras palavras, Lula até agora não demonstrou apetite
para conduzir uma gestão reformista.
No quesito “União”, logo na introdução do
documento Lula já se apresenta como devedor dos presidentes da Câmara e do
Senado em duas decisões fundamentais para a estabilidade econômica e política
neste primeiro ano de governo: a aprovação da Emenda Constitucional nº 126, que
deu um alívio de R$ 145 bilhões para programas sociais e investimentos, e a
reprovação “célere, firme e determinada” da invasão de 8 de janeiro,
consubstanciada na ratificação do decreto de intervenção no Distrito Federal.
Boa parte da Mensagem Presidencial traz
desejos utópicos e declarações de boas intenções para os mais variados temas,
da sustentabilidade ambiental aos direitos humanos, passando pela digitalização
da economia e pela reindustrialização do país, mas sem indicação de meios para
tirá-las do papel.
No relatório sobre a transição
governamental, Lula afirma que gastará boa parte de sua energia no primeiro ano
revendo normas infralegais, reinstalando órgãos e conselhos e revogando
decretos editados por Bolsonaro - é a dimensão “Reconstrução” do lema
presidencial.
O documento enviado por Lula aos
congressistas traz poucos pedidos concretos relativos à agenda legislativa: a
ratificação das medidas provisórias já apresentadas por ele e a aprovação das
ainda desconhecidas novas regras fiscais, da reforma tributária e de uma nova
política de valorização do salário-mínimo. Lula ainda demonstrou a disposição
de iniciar um processo de debate e negociação de uma nova legislação
trabalhista, mas não parece ser algo para ser enviado ao Congresso nos próximos
meses.
Com a exceção da reforma tributária de
Bernard Appy, o governo Lula aparenta não ter um pipeline de PECs e PLs
transformadores preparados para serem submetidos ao Congresso no curto prazo. A
pouca disposição em disputar com Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG)
o comando das duas Casas Legislativas também sinaliza que Lula já tem uma
estratégia para lidar com o Centrão: “Se não pode com eles, junte-se a eles”.
Lira, aliás, praticamente assegurou para si
o direito de arbitrar as escolhas para os postos-chave da Câmara pelos próximos
dois anos. O Regimento Interno da Câmara determina que é o tamanho dos blocos
parlamentares na primeira sessão que define a distribuição das comissões
temáticas durante toda a legislatura - mesmo que os blocos sejam desfeitos no
futuro. Ao construir em torno de si um grupo composto por 20 partidos - apenas
a federação Psol-Rede e o Novo ficaram de fora -, Lira continuará dando as
cartas no Congresso.
No seu blocão, os cargos da Mesa Diretora
foram alocados aos principais partidos, que fizeram as suas escolhas
internamente e levaram esses nomes para ratificação do Plenário. Nessa eleição
de mentirinha, os novos dirigentes da Câmara receberam entre 411 votos (Luciano
Bivar, União-PE, escolhido primeiro secretário) e 467 (Júlio César, PSD-PI,
terceiro secretário).
Maria do Rosário (PT-RS), contudo, recebeu
a aprovação de apenas 371 de seus pares na eleição para a Segunda Secretaria.
Os 138 votos em branco dados à petista são uma medida da oposição-raiz, mais
ligada ao bolsonarismo, que o governo Lula enfrentará na nova Câmara dos
Deputados.
A matemática é simples. A coligação que
elegeu Lula, acrescida do PDT, tem 140 deputados - uma força equivalente ao antipetismo
revelado na votação de Maria do Rosário. MDB, União Brasil e PSD, partidos que
receberam ministérios para apoiar o governo, têm 143 parlamentares, mas esse
apoio não é integral. Supondo que essas três siglas ofereçam 80% de votos a
Lula, a base de Lula na Câmara não chega a 250 deputados. Isso significa que
Arthur Lira será o grande fiador para emprestar votos do Centrão sempre que o
governo precisar alcançar os 308 necessários para aprovar uma PEC.
Lula, portanto, sabe que conta com a boa
vontade de Lira para conduzir seu mandato com tranquilidade. E logo na primeira
votação da nova sessão legislativa, já ficou evidente que não está disposto a
entrar em bolas divididas e medir forças com o presidente reeleito da Câmara.
A eleição do deputado Jonathan de Jesus
(Republicanos-RR) para o Tribunal de Contas da União mostra isso claramente.
Parlamentar do baixo clero, com um histórico de apresentação de projetos contra
o meio ambiente, assumidamente próximo a Jair Bolsonaro e com um discurso a
favor da impunidade na política, Jesus venceu com o apoio explícito do PT e do
PSB, partidos de Lula e Alckmin.
Foi a primeira das muitas faturas que serão
apresentadas por Arthur Lira e seu Centrão para garantir a estabilidade a um
governo que não quer confusão com ninguém.
*Bruno Carazza é mestre em economia e doutor em direito, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”.
4 comentários:
Mas, obviamente, muito melhor que o GENOCIDA...
Novo governo não quer confusão em face de sua fraqueza política. Terá de haver muita negociação, a começar pela política econômica e indispensáveis reformas tributária e administrativa. Governo não pode cogitar de rupturas, à falta de sustentação na Sociedade. Também autoridade e disciplina. Além do Presidente, apenas equipe econômica deveria falar sobre o assunto.
Concordo com o anônimo acima, mas melhor o presidente não falar sobre economia...
O passado ainda anda fresco na memória, eis a questão. Não é bom forçar a barra
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