domingo, 20 de agosto de 2023

Bernardo Mello Franco – Blindagem verde-oliva

O Globo

Relatora promete indiciar Bolsonaro, mas não mexe com blindagem à cúpula militar

A CPI do Golpe ainda não chegou à metade, mas a relatora parece já ter um veredicto: o capitão é culpado e os generais são inocentes. Na quarta-feira, a senadora Eliziane Gama confirmou que pedirá o indiciamento de Jair Bolsonaro. Mas indicou que poupará os militares de alta patente que conspiraram contra a democracia. “A instituição Forças Armadas impediu um golpe no país”, afirmou, em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo.

A declaração envelheceu rápido. No dia seguinte, Walter Delgatti Neto contou à CPI que ajudou o Ministério da Defesa a redigir um relatório para minar a confiabilidade da urna eletrônica. O hacker disse ter colaborado com dois ex-comandantes do Exército. Um deles, o general Paulo Sérgio Nogueira, foi titular da Defesa no último ano do governo Bolsonaro.

A relatora da CPI integra a bancada governista e pertence ao grupo político do ministro Flávio Dino. Sua complacência com os militares não é pessoal. Obedece a uma diretriz do governo Lula, que orientou os aliados a evitar atritos com a caserna.

No discurso oficial, o Planalto se opôs à criação da CPI porque não queria tumultuar a agenda de votações no Congresso. Na verdade, a preocupação era outra. O governo sabia que uma investigação para valer chegaria à cúpula das Forças Armadas.

É falso dizer que militares de alta patente não se engajaram no movimento golpista. Cinco generais participaram da reunião em que Bolsonaro atacou o sistema eleitoral diante de embaixadores estrangeiros. O encontro levaria o ex-presidente a ser declarado inelegível pelo TSE.

Depois da derrota do capitão, o comando do Exército autorizou a concentração de golpistas diante dos quartéis. Do acampamento de Brasília, que contou com apoio e proteção verde-oliva, saíram as hordas que invadiram as sedes dos Três Poderes.

Na noite de 8 de janeiro, o então comandante do Exército, general Júlio Cesar de Arruda, usou tanques para impedir a prisão dos criminosos. Ele foi demitido duas semanas depois, mas permanece blindado na CPI.

Até aqui, a comissão passou longe de apurar as responsabilidades da cúpula militar pelos ataques à democracia. Os parlamentares chegaram a aprovar a convocação do general Gustavo Henrique Dutra, ex-comandante militar do Planalto, mas o depoimento nunca foi marcado. O general Gonçalves Dias, que chefiou o GSI no início deste ano, vive a mesma situação.

Em julho, o tenente-coronel Mauro Cid compareceu à CPI de farda, em estratégia combinada com o comando do Exército. Se a ideia era impor respeito, o efeito foi o contrário. A cada revelação sobre o escândalo das joias, os militares ficam mais associados ao contrabando.

O depoimento de Delgatti torna obrigatória a convocação do general Paulo Sérgio Nogueira. O atual ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, já confirmou que o hacker foi recebido na pasta. Se é assim, o ex-ministro precisa ser chamado a dar explicações, sob pena de desmoralização da CPI. O general gostava de aparecer e fazer ameaças quando estava no cargo, mas anda sumido desde a derrota do chefe.

 

2 comentários:

Daniel disse...

Milhares de militares se esbaldaram no DESgoverno Bolsonaro atuando em funções para as quais não estavam capacitados, na saúde, no meio ambiente, na Funai, na educação, nas eleições... Boa parte apoiava a "intervenção militar" pregada pelos bolsonaristas patriotários. Eram mais milicianos que realmente militares, inclusive generais e coronéis que não mereciam ter chegado a postos tão altos!

ADEMAR AMANCIO disse...

Pois é.