The New York Times / Folha de S. Paulo
Um ano após seu início, a guerra entre Israel
e Hamas segue sem vencedor, seja no campo de batalha ou no campo das ideias
Então, no que estou pensando neste mês de
aniversário da guerra entre Hamas, Hezbollah, Irã e Israel?
Estou pensando no que meu professor de estratégia, John Arquilla da Escola de
Pós-Graduação Naval dos Estados
Unidos, me ensinou —que todas as guerras se resumem a duas perguntas
básicas: quem vence no campo de batalha? E quem vence na luta pela narrativa?
E o que estou pensando hoje é como, mesmo
após um ano de guerra, uma guerra na qual Hamas, Hezbollah e Israel impuseram
terrível dor às forças e civis uns dos outros, ninguém venceu de forma decisiva
a disputa no campo de batalha ou a disputa pela narrativa.
De fato, um ano após o 7 de outubro de 2023,
esta ainda é a primeira guerra árabe-israelense sem nome e sem um vencedor
claro, pois nenhum lado obteve uma vitória evidente ou conseguiu apresentar uma
narrativa unificada.
Podemos e devemos nos preocupar com a
condição de apátridas dos palestinos e com os árabes da Cisjordânia que vivem
sob pressão dos assentamentos e restrições israelenses. No entanto, para mim,
nada justifica as ações dos terroristas do Hamas
em 7 de outubro de 2023 —assassinatos, mutilações, sequestros e
abusos sexuais de qualquer israelense ao alcance, sem nenhum objetivo,
narrativa ou propósito além de destruir o Estado
judeu.
Se você acredita, assim como eu, que a solução para o conflito é a existência de dois Estados para dois povos nativos da região entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo, esse ataque do Hamas foi um retrocesso imensurável a essa perspectiva.
E que história o Irã está contando? Que tem
algum direito sob a carta das Nações Unidas para ajudar a criar estados falidos
no Líbano, Síria, Iêmen e Iraque para
poder cultivar fantoches dentro deles com o propósito de destruir Israel? E com
que direito o Hezbollah arrastou o Líbano para uma guerra com Israel na qual o
povo e o governo libanês não tiveram
voz e agora estão pagando um preço alto?
Mas este governo israelense também não tem
uma história simples na Faixa de Gaza.
Essa estava fadada a ser mais feia das guerras entre israelenses e palestinos
desde 1947, porque o Hamas se infiltrou em túneis sob casas, escolas, mesquitas
e hospitais de Gaza. Não era possível atingir o grupo sem causar importantes
baixas civis.
Portanto, como argumentei desde o início,
cabia a Israel deixar claro que essa não era apenas uma guerra para se
defender, mas também para destruir o Hamas a fim de dar à luz algo melhor: a
única solução justa e estável possível, dois estados para dois povos.
O governo israelense do
primeiro-ministro Binyamin
Netanyahu se recusa firmemente a fazer isso, tanto que, um ano
depois, ainda não disse ao seu povo, seu exército ou seu fornecedor de armas,
os Estados Unidos, o que deseja construir em Gaza no lugar do Hamas além de
falar em "vitória total".
Com Israel ainda bombardeando escolas para
matar alguns poucos combatentes do Hamas escondidos dentro, mas não sendo capaz
de articular qualquer futuro para os residentes de Gaza além de uma guerra
permanente, parece que matar até o último membro do Hamas é o objetivo —não
importa quantos civis morram. Isso significa travar uma guerra eterna que
minará a credibilidade tanto de Israel quanto dos Estados Unidos e envergonhará
os aliados árabes de Israel.
Mas a falta de uma boa história está
prejudicando Israel de outras maneiras. Os israelenses precisam enviar seus
filhos para lutar todos os dias contra inimigos do Hamas e do Hezbollah —mas
não podem ter certeza se estão indo para a guerra para salvar o Estado de
Israel ou a carreira política de seu primeiro-ministro.
Isso porque há mais do que motivos
suficientes para acreditar que Netanyahu quer manter essa guerra em andamento
para ter uma desculpa para adiar seu
depoimento em dezembro em seu julgamento por corrupção, para
adiar uma comissão independente de inquérito sobre como seu governo falhou em
prevenir o pior ataque aos judeus desde o Holocausto, bem como para adiar novas
eleições israelenses e talvez até influenciar a eleição presidencial americana
a favor de Donald Trump.
Os parceiros
supremacistas judeus de extrema-direita de Netanyahu disseram a
ele que derrubarão seu governo se ele concordar em parar a guerra em Gaza antes
de uma "vitória total" indefinida sobre o Hamas e se ele tentar
trazer a Autoridade Palestina da
Cisjordânia, que abraçou o processo de paz de Oslo, para ajudar a governar Gaza
no lugar do Hamas —algo que o grupo terrorista teme muito.
Essa ausência de uma narrativa também está
prejudicando Israel estrategicamente. Quanto mais Israel se esforçar para ter
um parceiro palestino legítimo, como uma Autoridade Palestina reformada, melhor
será sua chance de sair de Gaza e não ter que governar uma insurgência
permanente lá, mais aliados vão querer ajudar a criar uma força internacional
para preencher qualquer vácuo no sul do Líbano e mais qualquer ataque militar
israelense contra o Irã seria entendido como tornar Israel seguro para tentar
fazer a paz com os palestinos —não seguro para uma anexação israelense da
Cisjordânia e Gaza, que é o que
alguns dos parceiros de extrema-direita de Netanyahu estão buscando.
Não posso garantir que haja um parceiro
palestino legítimo para uma paz segura com Israel. Mas posso garantir que este
governo israelense fez tudo o que pôde para impedir que algo assim surgisse —
fortalecendo o Hamas em Gaza em detrimento da Autoridade Palestina na
Cisjordânia.
Para mim, é simplesmente insano que os Emirados
Árabes Unidos estejam dizendo a Israel que enviariam forças
militares a Gaza para estabilizar a paz lá, em conjunto com os EUA e outras
forças internacionais — e que a Arábia
Saudita indicou estar pronta para normalizar as relações com
Israel, ajudar a pagar pela reconstrução de Gaza e abrir um caminho para as
relações entre o estado judeu e todo o mundo muçulmano, e ainda assim Netanyahu
até agora disse não a ambos porque tudo isso exigiria que Israel abrisse
negociações com uma Autoridade Palestina reformada sobre uma solução de dois
estados e que esta Autoridade Palestina convidasse formalmente os Emirados
Árabes Unidos e outros para ajudar a garantir Gaza.
Israel recentemente realizou
uma operação militar de alta tecnologia contra o Hezbollah, considerada
um sucesso tático. No entanto, muitos dos envolvidos na operação também
protestaram contra a tentativa de golpe judicial de Netanyahu, que dividiu o
país e, segundo alertas, encorajou a invasão do Hamas e o ataque do Hezbollah.
A maior ameaça a Israel hoje não é o Irã, o Hamas, o Hezbollah ou os Houthis. Unido, Israel pode vencê-los todos. São aqueles que estão enfraquecendo Israel por dentro —com uma narrativa ruim.
Um comentário:
Uma análise muito boa! Faltou o colunista dizer mais explicitamente o que ele deixou implícito na sua última frase: A MAIOR ameaça a Israel é Netanyahu e seu governo criminoso e extremista!!
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