quarta-feira, 23 de abril de 2025

União é a cara do Brasil - Vera Magalhães

O Globo

Partido é agrupamento de políticos com objetivos pessoais a serviço de projeto empresarial de seus dirigentes

Se um partido sintetiza todos os vícios que explicam a disfuncionalidade da política brasileira hoje, ele atende pelo tão cínico quanto eloquente nome de União Brasil. Formado pela junção de siglas que não tinham nada a ver uma com a outra — o PSL que havia crescido com a vinda de Jair Bolsonaro e o DEM, por sua vez ex-PFL — com o único propósito de concentrar fundos partidário e eleitoral, é um agrupamento de políticos com objetivos pessoais específicos, a serviço de um projeto empresarial de seus dirigentes.

Por isso mesmo, é sinal inequívoco da perda de capacidade de liderança de Lula levar um “não” de um deputado jovem e desconhecido de um estado fora do eixo de poder, convidado sem ter currículo algum para comandar um ministério antes relevante, mas nos últimos anos entregue ao fisiologismo sem disfarces. Qualquer leitor do GLOBO que for colocado diante de uma fileira de cinco fotografias de homens jovens de barba e terno com certeza terá dificuldade de apontar entre eles o deputado Pedro Lucas (MA), que atualmente exerce a função de líder do União.

Com exceção, talvez, dos jornalistas que cobrem o dia a dia da Câmara, nem colunistas de política talvez passassem no teste do “carômetro” para reconhecer o candidato a ministro que resolveu esnobar um convite para ser ministro de Estado. Esta colunista teve de recorrer ao Google.

Pedro Lucas Fernandes está em segundo mandato e é, como muitos parlamentares, herdeiro de um clã político local. Antes de chegar à Câmara, seu currículo só inclui ter sido vereador. Não tem experiência profissional no setor de comunicações, estratégico para qualquer país no século XXI. Ainda assim, foi confirmado com certa pompa pela recém-designada ministra da articulação política, Gleisi Hoffmann, para o lugar do conterrâneo e companheiro de partido Juscelino Filho, cuja passagem pela pasta se notabilizou apenas pelos escândalos, e não por nenhuma realização que se possa louvar.

Ainda assim, Pedro Lucas fez os cálculos e entendeu que, para sua reeleição, objetivo final e único de toda a atual safra de representantes — uma das mais fracas do ponto de vista da formulação de que se tem notícia desde a redemocratização —, era melhor não ser ministro!

A esnobada é um constrangimento inédito para quem, nos primeiros mandatos, e mesmo nas vésperas da terceira posse, em 2023, tinha de administrar uma fila de políticos disputando espaço no primeiro escalão — mas que, diga-se, nunca se notabilizou pelo zelo em designar para alguns desses postos os nomes mais credenciados para desenvolver políticas públicas de interesse do país.

Os governos Lula 1 e 2 tinham, ao lado de expoentes gabaritados que apresentaram bons resultados em pastas-chave, companheiros do petista derrotados nas urnas em outras áreas. Agora, além dos amigos resgatados, como Luiz Marinho, Lula abriu espaço para apaniguados de pessoas com quem ele nunca teve nenhuma proximidade, como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que pendurou um monte de gente no governo sem que até hoje tenham mostrado ao que vieram.

Pior: não só nomes como Waldez Góes têm um portfólio de realizações mínimo, como sua permanência na Esplanada nunca, em momento algum, assegurou a Lula o apoio do híbrido União (sic) Brasil. Esse é o caso mais esdrúxulo, uma vez que é um partido enrolado em operações da Polícia Federal em série, com direito a pré-candidato a presidente contra o mesmo Lula que paga o salário dos ministros e as emendas dos parlamentares. A situação anômala não é exclusividade dessa sigla, é o estado geral da representação partidária brasileira.

O partido fica ali, com um pé na canoa do petista (vai que ele recupera a popularidade e vira uma pule com chance na eleição do ano que vem) e o outro na porta de saída, à espera de um barco com mais tração para navegar em 2026. Um escárnio contra o qual um governo fraco não pode fazer nada, nem se dar ao luxo de se rebelar e mandar todo mundo embora.

 

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