terça-feira, 24 de junho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Brasil decepciona com avanço lento do ensino

O Globo

Dados frustrantes do IBGE traduzem incapacidade crônica de o país alcançar educação de qualidade

São frustrantes os dados revelados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Educação de 2024, divulgada pelo IBGE. Mais uma vez, o Brasil se mostra incapaz de elevar a escolaridade da população até as metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação (PNE) em 2014. Embora tenha havido progresso nas taxas de analfabetismo e no total de anos de estudo, o país continua distante de onde deveria estar. É certo que a pandemia provocou um choque com impacto nefasto. Mesmo assim, houve tempo suficiente para ajustar políticas e criar programas mais eficazes. Prova de que faltou determinação foi o atraso na reforma do ensino médio, que só agora entrou em vigor.

Em 2024, a proporção de jovens no ensino médio na série correta foi 76,7%, ante 68,2% em 2016. É o maior nível da série histórica, iniciada em 2016, mesmo assim muito aquém dos 85% estipulados como meta. Pior que apenas a quantidade insatisfatória de estudantes no ano certo é a qualidade sofrível da formação, medida pelos maus resultados crônicos dos alunos brasileiros nos testes internacionais.

O atraso numa determinada faixa etária resulta em efeito cascata para as demais. Por isso é uma lástima que, entre as crianças de 6 a 14 anos, para as quais o ensino já estava praticamente universalizado, a situação tenha piorado. Em 2016, 96,7% estavam na série correta na escola. Em 2024, como resultado da pandemia, o nível caiu para 94,5% — abaixo da meta de 95%, que já havia sido cumprida.

A frustração se estende também aos adultos. É positivo que, desde 2016, a proporção de brasileiros com mais de 25 anos que concluíram a educação básica tenha subido de 46% para 56%. Só que, nesse ritmo, o Brasil levará 20 anos para chegar ao atual patamar da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). De 2016 a 2024, a escolaridade dessa parcela da população cresceu de 9,1 para 10,1 anos. A meta eram 12 anos. Tudo isso significa retardar ainda mais o desenvolvimento. O Brasil ainda conta com 44% da população sem educação básica, ante 20% nos países da OCDE. Fica atrás de Colômbia (37,9%), Argentina (33,5%) e Chile (28%).

Os resultados alcançados são insuficientes para dar à população condições de entrar num mercado de trabalho cada vez mais exigente à medida que avança a revolução tecnológica, agora pautada pela inteligência artificial. Quando é crucial avançar no letramento digital, o país nem sequer conseguiu erradicar o analfabetismo — embora a taxa tenha caído de 6,7% para 5,3% entre 2016 e 2024.

É preocupante também que os desníveis regionais se reproduzam na qualificação educacional. O Nordeste é a única região em que menos da metade da população com mais de 25 anos concluiu o ensino médio (47%). A média nacional superou esse patamar em 2017. Não se pode responsabilizar apenas o estágio de desenvolvimento mais baixo pela disparidade. Se fosse assim, o Ceará não seria um dos melhores exemplos em política educacional.

É preciso reconhecer que o Brasil tem evoluído desde os anos 1990. Há sistemas de acompanhamento do ensino com metas, um novo currículo para o ensino básico e está em curso a reforma do ensino médio. Tudo isso é bem-vindo, mas faltam eficiência e gestão para implementar com agilidade as melhorias necessárias para o país alcançar um nível educacional decente.

Acidentes com balões mostram que é necessária regulação mais rígida

O Globo

Pelo menos 9 pessoas morreram em duas quedas nos últimos dias. Norma em vigor se mostra insatisfatória

Num intervalo de apenas seis dias, o país assistiu a dois acidentes trágicos envolvendo balões. O mais grave aconteceu no sábado, no município de Praia Grande, em Santa Catarina. O balão pegou fogo pouco depois de subir, deixando oito mortos e 13 feridos. No dia 15, outro episódio já havia causado a morte de uma mulher e ferimentos em 11 passageiros durante voo em Boituva, interior de São Paulo. Os dois casos puseram em xeque a regulamentação e a segurança dessas atividades.

No acidente em Praia Grande, suspeita-se que o fogo tenha sido provocado pelo maçarico reserva minutos depois da subida. Segundo reportagem do Fantástico, o piloto contou à polícia que tentou apagá-lo com os pés, depois com um extintor de incêndio que não funcionou. O balão desceu, e os passageiros foram orientados a pular quando estivesse próximo ao chão. Mas nem todos conseguiram sair, e ele voltou a subir, já em chamas. O caso está sob investigação.

Em Boituva, o balão com 33 turistas caiu durante o voo. Passageiros disseram que, já na partida, o tempo não apresentava condições favoráveis, mas o evento não foi cancelado. No pouso de emergência, o balão bateu violentamente no solo em meio a um laranjal. O piloto alegou ter sido surpreendido por ventos fortes. Ele foi preso em flagrante. Segundo a polícia, a empresa responsável pelo programa não tinha autorização para voos comerciais.

Voos de balões precisam respeitar protocolos rígidos. Nos dois acidentes houve falhas. Há um vácuo na legislação para o setor. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) considera o balonismo uma atividade desportiva de alto risco, mas atribui a responsabilidade aos envolvidos. Os próprios representantes de empresas de turismo reconhecem que os balões não são certificados e não têm garantia de aeronavegabilidade.

Somente depois das tragédias, o governo federal se moveu para tratar do assunto. O Ministério do Turismo informou que ouvirá entidades do setor a fim de formular uma regulamentação “específica e clara” para garantir a segurança dos passageiros. Deveria ter feito isso há muito tempo, antes que nove brasileiros perdessem a vida num momento de lazer.

Não apenas balões voltados ao turismo preocupam. Neste mês, aumenta o risco de incêndios por toda parte devido aos balões juninos, prática que já deveria ter sido banida faz tempo. Soltá-los constitui crime ambiental, mas é raro alguém ser punido. Não surpreende que o hábito se perpetue.

O balonismo é praticado também em outros países, e o problema não está na atividade em si, que atrai turistas e gera renda, mas no risco trazido pela falta de regras. O turista não tem obrigação de saber se as empresas que oferecem o serviço estão habilitadas ou se cumprem os protocolos de segurança. Não se pode jogar esse ônus sobre os ombros dos passageiros. É claro que risco sempre existirá, mas ele deve ser reduzido ao mínimo.

Reavaliação de ativos ajuda país, mas a questão fiscal preocupa

Valor Econômico

O Brasil poderia tirar melhor proveito do cenário externo favorável de queda do dólar e do spread entre ativos americanos e bônus emergentes se tivesse feito um ajuste fiscal eficaz e convincente

A ameaça de uma extensão do conflito entre Israel, Estados Unidos e Irã por todo o Oriente Médio pode interromper por algum tempo a reavaliação dos ativos globais em curso, depois que Donald Trump assumiu a Presidência e declarou guerra tarifária ao mundo. Aos poucos, esboçaram-se tendências que têm beneficiado o Brasil: por exemplo, a perda de valor do dólar e o menor diferencial de risco entre ativos americanos e bônus emergentes, que favorece os papéis brasileiros. Uma interrupção demorada do fluxo de petróleo no Oriente Médio no Estreito de Ormuz ou confrontos armados envolvendo mais países da região tendem a mitigar as mudanças, embora possam também não ser capazes de detê-las em médio e longo prazos.

Não se trata apenas da recomposição dos fluxos de capital externo em portfólio, observada com mais clareza após o dia 2 de abril, “o dia da libertação” em que Trump impôs suas tarifas “recíprocas”, depois suspensas até 9 de julho. A megadesvalorização do dólar, auxiliada pela elevação dos preços dos alimentos, jogou o IPCA para muito longe da meta de 3% e o índice ainda permanece lá (5,32% nos 12 meses encerrados em maio). A perda de valor do dólar, depois do festival tarifário perturbador de Trump, prosseguiu até nos últimos dias, mesmo diante de um acirramento grave do conflito entre Irã e Israel e o auxílio dos EUA nos bombardeios sobre os centros nucleares iranianos. O real tem sido a moeda com melhor desempenho nas últimas semanas, com a desvalorização pouco superior a 10% até sexta-feira. O auxílio para a queda do IPCA é sensível.

Esse movimento de valorização, segundo grandes bancos, deve continuar (Valor, ontem). O francês Societé Générale, por exemplo, estima que o dólar poderá fechar o ano cotado a R$ 5,20, com possibilidades de recuar até R$ 5. O Bank of America (BofA) chegou há algum tempo a estimar que o real estava subvalorizado em 20%, a maior diferença em relação à tendência entre as moedas latino-americanas. A instituição aposta em posições “vendidas” (queda do dólar) e tem como alvo a cotação de R$ 5. Alguns dos motivos apontados mostram mudança em relação ao passado, e ela atende pelo nome de Trump. Suas ameaças, inclusive a de taxar no mercado americano investidores de países que não “tratem bem” os interesses dos Estados Unidos, consolidaram entre parte dos especialistas a percepção de que o país está deixando de ser um refúgio tão seguro para o qual aportavam os investimentos em caso de crises graves ou turbulências financeiras iminentes.

Um reflexo da guinada foi a desvalorização do dólar, que, diante de cesta de moedas fortes, declinou 8,95% até sexta-feira. A instabilidade criada pelo unilateralismo protecionista de Trump provocou outra clivagem em relação ao passado. Os títulos do Tesouro, papéis dos mais seguros do mundo, passaram também a perder valor, e seus juros, a subir, quando em praticamente todas as outras crises eram disputados e seus preços cresciam. Mesmo o mercado acionário europeu, uma região que flerta com a estagnação, tem mostrado desempenho mais vigoroso que o dos EUA desde abril.

A firmeza do Banco Central do Brasil em elevar a taxa de juros para 15% e sua disposição de mantê-la por um período prolongado reforçaram a permanência do diferencial de juros muito alto em relação aos EUA e outros países — a taxa é a segunda maior do mundo e a conta pública de juros em relação ao PIB, a maior —, facilitando as operações de carry trade. Nelas, investidores captam recursos em mercados onde os juros são muito baixos e os aplicam naqueles em que estão elevados, caso do Brasil. A necessidade de diversificar ativos para fora dos papéis americanos melhorou a posição relativa dos títulos emergentes, como o Brasil, que tem apresentado risco de calote menor do que antes de Trump assumir.

Um sinal disso é a volta das aplicações em fundos de bônus emergentes, de onde tinham fugido até pouco depois de 2 de abril, quando os saques superaram as captações — hoje, assiste-se ao movimento inverso (Valor, ontem). “O cenário de dólar mais fraco e commodities estáveis é positivo para emergentes, e o estrangeiro voltou a comprar”, diz Nikolau Miller, sócio da gestora JGP. Mesmo empresas americanas de bons rendimentos tiveram o valor de seus títulos reduzido, melhorando o diferencial relativo de empresas e títulos brasileiros, segundo a gestora Ibiuna.

O ponto vulnerável da atratividade brasileira nesse cenário é a fragilidade fiscal. Há bancos que apostam na desvalorização forte do real durante o período eleitoral, se o governo Lula ampliar os gastos para se reeleger. Em ambiente em que o favorito na corrida eleitoral apontasse consolidação fiscal, o dólar poderia cair a R$ 4,80, supõe o BTG. Ou pode ir a R$ 5,90 no caso de farras fiscais eleitorais, estima o Wells Fargo.

Ainda com cenário externo extremamente instável, há ventos favoráveis ao afluxo de capital externo. As perspectivas positivas levam em conta que as contas públicas não vão se deteriorar muito mais. As pessimistas, que sim. Isso dá ideia da importância do equilíbrio fiscal e de quanto seria mais vantajoso para o país tirar melhor proveito de momentos oportunos se tivesse feito ajuste eficaz e convincente.

Vigilância por câmeras, inteligência e transparência

Folha de S. Paulo

Programas como o Smart Sampa reforçam combate ao crime, mas é preciso corrigir erros e respeitar os dados dos cidadãos

Após seis meses de operação, são positivos os resultados do Smart Sampa, programa de vigilância e reconhecimento facial implementado pela Prefeitura de São Paulo. De acordo com dados divulgados pela municipalidade, o sistema de câmeras já levou à prisão de 1.153 foragidos da Justiça.

A esse número se somam outros também relevantes, como os 275 crimes solucionados pela Polícia Civil com o auxílio das imagens, os quase 2.500 presos em flagrante e as 68 pessoas desaparecidas que foram localizadas.

Tudo graças a um conjunto de 31,3 mil câmeras instaladas na cidade, montante que o prefeito Ricardo Nunes (MDB) promete elevar para 100 mil até o fim de seu mandato, em 2028. Seria uma das principais bandeiras de sua gestão —de resto, caracterizada pela ausência de uma grande marca.

Adotado por dezenas de municípios brasileiros em pelo menos 15 estados nos últimos anos, esse modelo de monitoramento é tendência nas maiores metrópoles do planeta. Em Londres, uma das pioneiras, a vigilância ostensiva existe há décadas; Xangai, por sua vez, aproxima-se de 2 milhões de aparelhos nas ruas.

Faz sentido esse caminho. A segurança pública precisa articular diversos fatores, desde iluminação pública até investigação, e a inteligência associada às câmeras constitui um reforço expressivo no combate ao crime.

Em todos os casos, ressalvadas particularidades técnicas, o mecanismo é o mesmo: capta-se o rosto de alguém e o compara a uma base de dados especificada pela autoridade pública. Se ocorre um "match" com uma lista de desaparecidos ou de procurados pela Justiça, por exemplo, os canais competentes são acionados.

Pouco tempo atrás, programas dessa natureza talvez soassem como ficção, mas, hoje em dia, com o avanço da tecnologia, quase ninguém se surpreende com o reconhecimento facial —uma realidade na portaria de prédios e no desbloqueio de celulares, para citar duas situações cotidianas.

A difusão desse tipo de monitoramento, contudo, não pode se dar à revelia dos controles sociais. São conhecidas as distorções a que algoritmos estão sujeitos, com vieses raciais e de gênero nas identificações, razão pela qual é fundamental acompanhar resultados para corrigir eventuais erros e evitar que se repitam.

O Smart Sampa não é exceção a essa regra. De acordo com o balanço recente, 23 pessoas foram levadas à delegacia e liberadas por algum tipo de problema com a identidade ou a documentação. O índice dessas chamadas inconsistências de reconhecimento é de 1,86% no período e, felizmente, ninguém foi preso por engano.

Se a meta do prefeito é multiplicar por três o número de câmeras em São Paulo, esse percentual de inconsistências precisa diminuir. E, para isso, é crucial garantir o sigilo dos dados e dar transparência ao sistema, permitindo a divulgação das informações não só quando forem convenientes à administração municipal.

Omissão política viabiliza supersalários no setor público

Folha de S. Paulo

A despeito de gastos exorbitantes da Justiça brasileira, não avançam propostas para fazer cumprir o teto constitucional

No mérito, acabar com salários exorbitantes no serviço público deveria ser a providência mais simples de uma reforma administrativa.

Afinal, o teto para as remunerações dos funcionários do Estado brasileiro está fixado com clareza no inciso XI do artigo 37 da Constituição, já modificado e ampliado duas vezes desde a versão original de 1988. Ali se estabelece como limite máximo o subsídio mensal dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Esse valor é hoje de R$ 46.366,19, também pago a deputados federais, senadores, procurador-geral, presidente e vice-presidente da República. O tema poderia estar resolvido aí, não fossem interpretações criativas do texto legal.

Sabe-se com precisão onde a regra é burlada —basicamente no Judiciário e no Ministério Público, cujos membros se autoconcedem benefícios extrassalariais de todo tipo, como abonos e auxílios. A proliferação de tais manobras, umas mais descaradas que outras, forjou a necessidade de explicitar em lei o que se pode ou não excluir do teto.

Mesmo isso não deveria ser tarefa controversa. Fora os próprios beneficiários diretos da farra, inexiste setor relevante da sociedade que defenda esses supersalários —que elevaram o custo médio por magistrado a R$ 68,1 mil mensais no ano retrasado.

Tampouco é difícil constatar que os valores envolvidos constituem aberração na realidade nacional, mesmo considerando que profissionais qualificados como os juízes devem ser bem remunerados. Comparações internacionais mostram que o gasto do sistema de Justiça brasileiro, de 1,33% do PIB, não tem paralelo nas principais economias.

Por fim, casos escandalosos surgem a todo momento. A Folha acaba de noticiar, por exemplo, que o Ministério Público paulista estima um passivo de R$ 6 bilhões —uma vez e meia seu orçamento anual— em pagamentos retroativos devidos a procuradores e promotores. Segundo a instituição, não há horizonte visível para a quitação da conta.

A despeito de tudo isso, o mundo político teme enfrentar interesses de corporações poderosas, e o tema se arrasta há décadas. Uma emenda constitucional burocraticamente proposta pelo Executivo em 2024 foi logo desfigurada pelo Congresso Nacional. Projeto aprovado pelos deputados e que tramita no Senado mais institucionaliza que reduz os abusos.

Fala-se agora, entre muitas ressalvas e senões, que supersalários serão discutidos em um certo grupo de trabalho sobre reforma administrativa recém-criado pela Câmara. Acredite quem quiser.

 O Brasil no ‘eixo dos hipócritas’

O Estado de S. Paulo

Posicionamento do governo no conflito entre Israel e Irã repete o padrão de críticas seletivas e condescendência com autocracias que conspurca a credibilidade diplomática do Brasil

A nota do Itamaraty sobre a ofensiva dos EUA ao Irã, longe de defender princípios democráticos ou a estabilidade internacional, é mais uma demonstração de alinhamento do governo Lula da Silva ao bloco autocrático global. Essa posição, marcada por um duplo padrão diplomático, põe o Brasil em rota de colisão com a tradição histórica de equilíbrio e prudência que sempre orientou sua política externa.

No conflito entre Israel e Irã, o governo brasileiro formou com a Rússia o que se pode chamar de “eixo da hipocrisia”. A Rússia, que viola a soberania da Ucrânia numa guerra de agressão, condenou “com veemência” os ataques a alvos militares e instalações nucleares iranianas, reprovando-os como violações da soberania e do Direito Internacional. O Brasil, que jamais condenou “com veemência” a agressão russa na Ucrânia nem repudiou o bombardeio russo a uma das usinas nucleares ucranianas, também condenou o ataque americano ao Irã “com veemência”, salientando que “qualquer ataque armado a instalações nucleares representa flagrante transgressão da Carta das Nações Unidas”.

Da Rússia, é claro, não se pode esperar nada, mas o Brasil deveria ao menos levar em conta o contexto real do ataque americano: o Irã é a maior fonte de instabilidade no Oriente Médio, um país cuja liderança teocrática prega abertamente a aniquilação de Israel e mantém uma guerra por procuração por meio de milícias como Hamas, Hezbollah e Houthis. Nessa guerra antiga e complexa, Israel não apenas tem o direito, mas o dever de se defender, assim como os EUA têm razões de sobra para apoiar a campanha israelense.

O governo Lula opta por um silêncio cúmplice sobre a agressividade iraniana, enquanto faz questão de condenar as ações preventivas de Israel e dos EUA. Essa inversão de valores não é uma falha pontual, mas parte de um duplo padrão que marca a diplomacia lulopetista: criticar aliados democráticos e alinhados ao Ocidente, enquanto contemporiza com regimes autoritários, repressivos e fundamentalistas.

O alinhamento com o Irã é só uma faceta desse quadro mais amplo. Do ponto de vista do Direito Internacional, o ataque americano é, de fato, controverso. Mas ao menos pode ser defendido com argumentos razoáveis, como o direito à autodefesa coletiva em face da ameaça nuclear iraniana. Já a invasão russa à Ucrânia não tem qualquer sombra de justificativa legítima. O governo brasileiro, contudo, opta pela ambiguidade e a condescendência com os crimes de Moscou.

A hipocrisia é mais evidente à luz do histórico diplomático dos governos petistas. Em 2010, sob o comando de Lula, a diplomacia brasileira protagonizou uma desastrada mediação com o Irã de um acordo nuclear, ignorando alertas e fragilizando a posição brasileira no cenário internacional. A tentativa de protagonismo desmedido e voluntarismo diplomático expôs o País ao ridículo e aos riscos de alinhamento com um regime que ameaça a paz mundial.

Hoje, ao repetir o mesmo alinhamento, o governo reforça sua afinidade ideológica com regimes autoritários – Irã, Rússia, China e outros –, rompendo com a tradição de equilíbrio e prudência que sempre pautou a política externa brasileira.

Após a ofensiva dos EUA contra o Irã, as democracias sérias fizeram um apelo à moderação e ao resgate das vias diplomáticas, mas evitaram condenar o ataque e nem de longe legitimaram um regime beligerante e delinquente como o iraniano. Ao contrário: reconhecem o perigo concreto representado pela teocracia xiita, responsável por fomentar o terrorismo, desestabilizar o Oriente Médio e perseguir sistematicamente a fabricação de armas nucleares – uma ameaça que transcende fronteiras e atinge a segurança global.

O que o Brasil ganha com essa adesão à aliança de autocracias? Quais benefícios estratégicos ou diplomáticos justificam associar o País a regimes que promovem a instabilidade internacional, violam direitos humanos e desafiam o multilateralismo baseado em regras? As respostas são óbvias: tudo isso só serve para satisfazer a rançosa ideologia antiamericana e antiocidental do lulopetismo.

Pregando no deserto

O Estado de S. Paulo

Em meio ao ativismo de toga, Fachin prega autocontenção, moderação e respeito às fronteiras entre Direito e política – e terá chance de aplicar esse princípio ao julgar o Marco Civil

No momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) se entrega cada vez mais ao protagonismo político, à retórica moralista e ao afã regulatório, é raro – e valioso – ouvir uma voz da própria Corte pregar contenção, sobriedade e respeito às fronteiras institucionais. Foi o que fez o vice-presidente da Corte, Edson Fachin, por ocasião da celebração dos dez anos de sua atuação no STF. Ao afirmar que “não nos é legítimo invadir a seara do legislador” e que “ao Direito o que é do Direito, à política o que é da política”, o ministro reafirmou os fundamentos de uma magistratura republicana e deixou clara sua disposição de nadar contra a corrente dominante entre seus pares.

A fala, por seu tom, conteúdo e contexto, merece, mais que aplauso, acolhida como marco de uma possível inflexão. Fachin invoca a “razão jurídica objetiva” e adverte que juízes não devem se tornar “satélite da polarização” que corrói democracias mundo afora. Defende, em vez disso, uma “justiça silenciosa, efetiva, com autonomia e independência da magistratura”, rechaçando a tentação de tornar o Judiciário um ator político informal, um corretor de vontades coletivas ou uma espécie de fórum ético da Nação. Num momento em que o STF parece tentado a ser tudo isso ao mesmo tempo – juiz, legislador, acusador, censor e guardião de causas –, essa lucidez é uma raridade.

O contraste entre esse ideal e a prática não poderia ser maior. O Supremo que Fachin apregoa é discreto, técnico, autocontido. O Supremo real não raro se apresenta como oráculo iluminista, intérprete moral da Constituição, fiador da governabilidade e espécie de Ministério da Verdade digital. O que se vê é um acúmulo de iniciativas que, à luz dos parâmetros defendidos por Fachin, configuram alarmante desvio institucional.

A lista é conhecida: a revisão monocrática de penas e multas a réus confessos da Lava Jato; a suspensão, por liminar, de dispositivos da Lei das Estatais, com impacto na nomeação de dirigentes partidários; a intromissão em políticas públicas; decisões monocráticas que se eternizam sem referendo do plenário; a promiscuidade simbólica entre ministros e grupos políticos ou empresariais em eventos privados; a censura a críticos a pretexto de combater “ataques à democracia” – e um longo etcétera.

Poucos episódios expõem com tamanha nitidez o risco do ativismo togado quanto o julgamento sobre o Marco Civil da Internet. A norma, aprovada após amplo debate, consagra um princípio elementar de segurança jurídica: plataformas digitais só podem ser responsabilizadas por conteúdos de terceiros quando, notificadas por decisão judicial, se recusam a removê-los. É uma proteção à liberdade de expressão contra os abusos tanto do arbítrio corporativo quanto do voluntarismo estatal.

A substituição desse dispositivo por um regime de responsabilização proativa – no qual empresas seriam forçadas a filtrar conteúdos sob ameaça de sanção – representa, além de uma afronta ao Legislativo, uma renúncia ao liberalismo jurídico em favor de uma censura privatizada, opaca, sujeita a critérios vagos como “desinformação” ou “discursos de ódio”. As plataformas, pressionadas por incerteza jurídica e instinto de autopreservação, removerão preventivamente qualquer conteúdo polêmico, instaurando a lógica do silêncio como defesa.

Para um tribunal que deve ser guardião da Constituição, substituir um marco equilibrado por uma colcha de retalhos jurisprudencial mal-ajambrada por 11 ministros não eleitos é mais do que imprudente: é antidemocrático. Fachin terá em breve uma oportunidade histórica de materializar sua prudência em um voto claro, técnico, consistente – e, se possível, influente –, que devolva ao Congresso o que é do Congresso e lembre ao Supremo que sua credibilidade decorre menos do poder que exerce do que do limite que se impõe.

Em tempos de juízes celebridades, togados moralistas e ministros legisladores, a lição de Fachin ressoa como pregação no deserto. Mas toda restauração institucional começa assim: com um princípio bem dito, mesmo que por poucos. Que seu exemplo frutifique.

O desmonte da Cidade Limpa

O Estado de S. Paulo

Câmara de SP aprova projeto que desfigura lei e representa risco de volta da poluição visual

Os vereadores de São Paulo aprovaram recentemente um projeto de lei que flexibiliza a Cidade Limpa. A ideia é retirar o limite de até dois anúncios por edificação, liberar anúncios em vias, parques, praças, logradouros em geral, pontes, viadutos, muros, paredes e empenas cegas, entre outros equipamentos urbanos, e aumentar o tamanho dos anúncios em relação às larguras das fachadas dos imóveis. Na prática, as propagandas poderão ser até 200% maiores do que o permitido atualmente, e poderá ser aberta uma brecha para que anúncios cubram até 70% da fachada de um bem de valor cultural, ocultando os prédios históricos da metrópole. Ou seja, um desastre.

Essa investida contra a Cidade Limpa é de autoria do vereador Rubinho Nunes (União Brasil). À coluna Alice Ferraz, do Estadão, o parlamentar afirmou que quer “criar um cartão-postal para o mundo”, com os anúncios em painéis de LED. Propõe replicar o modelo da Times Square, de Nova York, com seus telões publicitários, na Avenida Paulista, na Avenida São João e na Rua Santa Ifigênia, para, em suas palavras, “modernizar as regras” e tornar São Paulo mais atrativa para investimentos.

Trata-se de evidente retrocesso. Em um manifesto publicado recentemente, o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) afirmou que o projeto de lei reverte os princípios centrais da Cidade Limpa e, “sob a roupagem de ‘modernização’, representa um risco iminente de desfiguração da cidade, de reintrodução massiva da poluição visual, de comprometimento da segurança e de fruição do patrimônio cultural”.

Nos últimos 19 anos, a Cidade Limpa ajudou São Paulo a construir a sua identidade como “uma cidade madura, que se respeita”, segundo a avaliação do urbanista Valter Caldana, coordenador do Laboratório de Projetos e Políticas Públicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Antes dessa lei saneadora, São Paulo vivia no caos visual, que destruiu a identidade arquitetônica e urbanística da cidade. Foi a Cidade Limpa que removeu outdoors, letreiros, faixas em postes, cavaletes das calçadas e sujeira de toda sorte que estavam espalhados por todos os lados. Até um zepelim que propagandeava uma marca de pneus foi proibido.

Mesmo com tantos resultados positivos, esse programa urbanístico que se tornou uma referência e ganhou o apoio dos paulistanos sempre enfrenta alguma ameaça. As irregularidades, por exemplo, são visíveis, muito embora no ano passado tenham sido aplicadas apenas 228 multas, ante 4,5 mil em 2011, auge das autuações, durante o governo Gilberto Kassab. Além disso, um projeto de lei que tentou liberar anúncios no topo dos prédios foi aprovado em primeira votação em 2020, mas foi abandonado após forte repercussão negativa.

O prefeito Ricardo Nunes garantiu que não apoia “em hipótese nenhuma” um projeto de lei que possa desfigurar a Cidade Limpa. E, como as reações começam a ganhar força, o vereador Rubinho Nunes afirmou que vai apresentar um substitutivo, em segunda votação, para restringir o projeto só às suas “Times Squares”. Com ou sem megalomania, na Câmara, espera-se que a proposta seja abandonada e, se aprovada, que o prefeito a vete.

Prova pode elevar a qualidade do ensino no país

Correio Braziliense

Além de obter elementos que aprimorem a qualidade da educação no Brasil, a iniciativa poderá reduzir ou eliminar a possibilidade de falta de professores no país

No próximo mês, concluintes da licenciatura e formados de todo o país poderão se inscrever para a primeira Prova Nacional Docente (PND). A iniciativa do Ministério da Educação (MEC) objetiva avaliar a formação dos futuros professores e subsidiar concursos públicos para ingresso na carreira docente da educação básica pública. Embora apelidada de "CNU dos professores", a prova não é um concurso público, destinada ao preenchimento de vagas nas unidades de ensino. Mas poderá ser utilizada por estados e municípios como critério nos seus processos de avaliação, desde que tenham aderido ao projeto do ministério.

Os estudantes concluintes de cursos de licenciatura que estejam inscritos no Enade 2025 — esses participarão automaticamente da PND, sem necessidade de nova inscrição e com isenção da taxa. Demais interessados em participar de concursos públicos ou processos seletivos de União, estados, Distrito Federal e municípios que optem por utilizar o resultado da PND como etapa classificatória — esses candidatos devem se inscrever individualmente.

Não faltam críticas à educação brasileira, principalmente a oferecida pela rede pública. Na maioria das vezes, alguns fatores, como condições socioeconômicas dos alunos, qualificação dos professores, infraestrutura e políticas públicas, são desconsiderados — elementos que comprometem a avaliação. O PND não será a tábua de salvação, mas buscará melhorar a qualidade do ensino do país em todas as etapas. Facilitará, principalmente, a seleção de docentes pelos municípios e estados que aderirem à iniciativa do MEC.

A prova está planejada para ser anual. Neste ano, será aplicada em outubro. De acordo com o diretor de avaliação da educação superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, Ulysses Teixeira, a PND refletirá na formação de professores. Em entrevista ao caderno Trabalho e Formação Profissional, ele prevê que o impacto se dará por meio de "devolutivas pedagógicas mais robustas e com a possibilidade de se criar um padrão de desempenho esperado, que afetará também a educação básica. "Passa-se a ter um processo mais qualificado de contratação de professores", prevê Teixeira. Ele tem a expectativa de que os novos docentes sejam contratados no próximo ano.

Além de obter elementos que aprimorem a qualidade da educação no Brasil, a iniciativa poderá reduzir ou eliminar a possibilidade de falta de professores no país. Em 2022, um estudo do Instituto Semesp previu a possibilidade de um deficit de 250 mil docentes até 2040, no país. Embora seja uma categoria de grande importância em qualquer sociedade, os professores não têm uma valorização compatível com a sua relevância para a transformação socieconômica desejada e capaz de elevar o Brasil à condição de país desenvolvido. Não basta selecionar bons profissionais, como é esperado pela PND. É indispensável que eles sejam tratados como categoria imprescindível ao país.

O nosso apelo à paz

O Povo (CE)

O momento delicado da conjuntura internacional exige uma ampla reflexão e um esforço da comunidade internacional para que o diálogo seja recuperado como caminho adequado para superação das crises que movem a geopolítica global. A opção bélica precisa voltar ao seu caráter extremo, utilizável por países e governos apenas depois de esgotadas todas as possibilidades que priorizem a paz.

O Grupo de Comunicação O POVO lamenta que um conjunto de equívocos tenha nos trazido à quadra atual de instabilidade e medo. É um fracasso do mundo civilizado que se arraste por tanto tempo o cenário de aflições diárias do Oriente Médio, desde quando se registrou aquela injustificável ação violenta protagonizada pelo terrorismo do Hamas em 7 de outubro de 2023, invadindo o território de Israel, sequestrando, matando, atirando a esmo contra homens, mulheres, jovens, crianças e quem mais surgisse à frente. Um horror!

É intolerável que a comunidade internacional aceite de maneira passiva a resposta do governo de Benjamin Netanyahu, na qual a via militar prevalece quase todo o tempo. Sem espaço para negociação e a um custo muito alto, no aspecto econômico ou quanto às consequências diretas que recaem sobre a população civil.

Com capítulo especial para o que se dá na Faixa de Gaza, na Palestina, com a destruição física de áreas importantes do seu território e dezenas de milhares de mortes oficialmente contabilizadas, incluindo inocentes crianças que tombam atingidas por uma violência que contexto político nenhum será capaz de justificar.

Infelizmente, em desdobramentos que nos deveriam envergonhar mais ainda, a mesma demonstração de pouco apreço às vidas humanas é registrada em cidades de Israel e, mais recentemente, na capital iraniana, Teerã, em todos os casos tendo cidadãos e cidadãs comuns como alvos. Direta ou indiretamente.

Onde estão, afinal, os organismos multilaterais que deveriam atuar para conter essa escalada da violência? A mais emblemática delas, Organização das Nações Unidas (ONU), lamentavelmente, acabou transformada em instância esvaziada pelos fatos insanos dos últimos meses, semanas e dias e já não apresenta mais perspectiva de levar à reversão de um quadro de predominância absoluta do poderio militar e bélico, do qual resulta uma estatística macabra de mortes e de prejuízos materiais incalculáveis. Para todos os lados envolvidos, em proporções diferentes.

Em meio aos últimos desdobramentos desse quadro sangrento que sacrifica a liberdade de muitos e custa a vida de outros tantos, vale lançar luzes sobre o que disse o papa Leão XIV, em seu chamamento mais recente. Um grito pela paz, disse o pontífice, demanda responsabilidade e razão e não deve, por isso, ser ofuscado pelo ruído bélico ou pelos discursos que estimulam o conflito e a guerra

De fato, é preciso que se dê uma chance à busca da paz possível, capaz de restabelecer um ambiente de civilidade nas relações entre os povos e os países. A via da diplomacia precisa ser recuperada, buscando-se a superação das diferenças pelo saudável caminho do diálogo, pois nunca é tarde para abrir espaço a uma conversa que tenha no seu sentido o objetivo nobre de pôr fim a uma guerra.

 

 

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