DEU EM O GLOBO
Caminhamos para ter uma eleição para presidente da República não apenas muito disputada, como também com um dos maiores graus de traições políticas já registrados nos últimos tempos. A candidata oficial, Dilma Rousseff, já deu mostras de que não dá muita bola para lealdades políticas, a não ser, é claro, a seu criador, o presidente Lula. Mais espantoso do que a homenagem que prestou a Tancredo Neves ontem em São João Del Rei foi a aceitação pública do voto PT-PSDB em Minas.
Assim como nas eleições de 2002 e 2006 houve por lá o voto Lulécio, que elegeu Lula presidente e Aécio Neves governador, querem repetir a dose com o voto Dilmasia, com a candidata oficial aliada ao candidato do PSDB ao governo, Antonio Anastasia.
Dilma chegou a fazer a gentileza de dizer que preferia que essa modalidade de voto fosse conhecida como Anastadilma, colocando na frente o candidato tucano. Quem não deve ter gostado muito da brincadeira é o candidato do PMDB, Hélio Costa, que aguarda o apoio do PT.
Há um vasto terreno nos dois partidos para a "cristianização" de seus candidatos. O termo, segundo o Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro da Fundação Getulio Vargas, define a "traição de um partido político a seu candidato a cargo eletivo".
Passou a ser usado a partir de 1951, depois que o PSD, tendo indicado Cristiano Machado candidato à Presidência, apoiou na verdade a candidatura de Getulio Vargas.
Nas eleições de 1950, Vargas ganhou com cerca de 48% dos votos, contra 29% do segundo colocado, o udenista Eduardo Gomes. Cristiano Machado acabou em terceiro, com 21%.
Outro detalhe importante é que o desempenho geral do PSD foi muito melhor que o de seu candidato à Presidência em vários estados, inclusive nas Minas Gerais de Cristiano Machado.
Por esse critério, Serra foi "cristianizado" por Aécio em 2002 e Alckmin em 2006 com a candidatura Lulécio, que Dilma quer repetir agora.
Ao mesmo tempo em que se oferece para uma dobradinha com o partido de Aécio, jogando para o lado tanto o PT quanto o PMDB mineiros, a ex-ministra Dilma Rousseff tenta unir sua imagem também à de Tancredo Neves, avô de Aécio, e que representa integralmente a mais nobre tradição da política mineira.
Uma homenagem tão estapafúrdia que deve ter provocado náuseas nos que acompanharam a trajetória do presidente que morreu antes de tomar posse.
O partido que Dilma representa hoje não apenas recusou-se a votar em Tancredo no Colégio Eleitoral como expulsou três deputados federais que, tendo visão política menos imediatista, se recusaram a seguir a orientação partidária e deram seus votos para a eleição do primeiro presidente civil de oposição no regime militar.
O mais surpreendente é que o gesto eleitoreiro tenha partido da mesma pessoa que, dias antes, acusara o candidato oposicionista de ser um lobo em pele de cordeiro por não atacar o presidente Lula diretamente.
Dificilmente existirá atitude mais dissimulada do que essa de homenagear um líder político 25 anos depois, no momento em que seu estado é fundamental para o resultado da eleição, sem ao menos uma explicação, muito menos autocrítica.
A mesma atitude dúbia ela tomou no Rio de Janeiro ao afagar Garotinho, o candidato do PR ao governo, para desilusão do governador Sérgio Cabral, do PMDB, que se considera o candidato oficial de Lula.
A relação de Cabral com Dilma não anda boa desde a crise dos royalties do petróleo, cujo cerne está no projeto do novo marco regulatório para exploração do pré-sal, organizado pela então chefe da Casa Civil.
Para Sérgio Cabral, é mais fácil brigar com Dilma do que com o presidente, e por isso ele já andou dando um recado para a candidata oficial de que nem mesmo sua mulher votaria nela caso prevalecesse a disposição de mudar a distribuição dos royalties.
Uma disputa presidencial apertada como se avizinha valorizará cada adesão que um dos lados conseguir. Assim como pode haver o voto Dilmasia ou Anastadilma em Minas, pode haver um voto suprapartidário no Rio que una o tucano José Serra e o governador Sérgio Cabral. Já existem até comitês nesse sentido sendo montados no estado.
Há ainda a situação do ex-prefeito Cesar Maia, rejeitado pelo PSDB e PV locais, que já se aproximou do ex-governador Garotinho e pode perfeitamente ajudar Dilma no interior.
Em vários outros estados a relação do PT com o PMDB está dando margem a negociações paralelas, que vingarão ou não na medida em que as pesquisas eleitorais mostrarem para que lado o vento está soprando.
Também o PSDB tem problemas, e não apenas no Rio. Um estado emblemático é o Ceará do senador Tasso Jereissati, um dos principais líderes tucanos.
Ele é candidato ao Senado em uma aliança branca com o governador Cid Gomes, do PSB, que tenta fazer com que o partido lance seu irmão, o deputado Ciro Gomes, como candidato a presidente da República.
No Rio Grande do Sul, a governadora Yeda Crusius insiste em tentar a reeleição apesar das crise política em que se viu envolvida, mas a direção do partido gostaria de uma aliança com o PMDB do ex-prefeito de Porto Alegre José Fogaça.
Há, como se vê, um vasto terreno para traições de todos os matizes, até mesmo a do próprio PMDB, que, tudo indica, formalizará seu apoio à candidatura Dilma na convenção de junho, mas não lhe dará apoio integral, ficando de fora do acordo seções importantes do partido como algumas do Sul e Sudeste do país.
Isso se, até lá, a disputa continuar emparelhada, com Dilma mostrando ser competitiva. Se a "boca do jacaré" voltar a se abrir, ampliando a diferença a favor de Serra, até mesmo o "amor verdadeiro" do PMDB poderá desaparecer.
Se, ao contrário, a "boca do jacaré" se fechar cada vez mais, será o candidato tucano que será abandonado pelo meio do caminho.
Caminhamos para ter uma eleição para presidente da República não apenas muito disputada, como também com um dos maiores graus de traições políticas já registrados nos últimos tempos. A candidata oficial, Dilma Rousseff, já deu mostras de que não dá muita bola para lealdades políticas, a não ser, é claro, a seu criador, o presidente Lula. Mais espantoso do que a homenagem que prestou a Tancredo Neves ontem em São João Del Rei foi a aceitação pública do voto PT-PSDB em Minas.
Assim como nas eleições de 2002 e 2006 houve por lá o voto Lulécio, que elegeu Lula presidente e Aécio Neves governador, querem repetir a dose com o voto Dilmasia, com a candidata oficial aliada ao candidato do PSDB ao governo, Antonio Anastasia.
Dilma chegou a fazer a gentileza de dizer que preferia que essa modalidade de voto fosse conhecida como Anastadilma, colocando na frente o candidato tucano. Quem não deve ter gostado muito da brincadeira é o candidato do PMDB, Hélio Costa, que aguarda o apoio do PT.
Há um vasto terreno nos dois partidos para a "cristianização" de seus candidatos. O termo, segundo o Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro da Fundação Getulio Vargas, define a "traição de um partido político a seu candidato a cargo eletivo".
Passou a ser usado a partir de 1951, depois que o PSD, tendo indicado Cristiano Machado candidato à Presidência, apoiou na verdade a candidatura de Getulio Vargas.
Nas eleições de 1950, Vargas ganhou com cerca de 48% dos votos, contra 29% do segundo colocado, o udenista Eduardo Gomes. Cristiano Machado acabou em terceiro, com 21%.
Outro detalhe importante é que o desempenho geral do PSD foi muito melhor que o de seu candidato à Presidência em vários estados, inclusive nas Minas Gerais de Cristiano Machado.
Por esse critério, Serra foi "cristianizado" por Aécio em 2002 e Alckmin em 2006 com a candidatura Lulécio, que Dilma quer repetir agora.
Ao mesmo tempo em que se oferece para uma dobradinha com o partido de Aécio, jogando para o lado tanto o PT quanto o PMDB mineiros, a ex-ministra Dilma Rousseff tenta unir sua imagem também à de Tancredo Neves, avô de Aécio, e que representa integralmente a mais nobre tradição da política mineira.
Uma homenagem tão estapafúrdia que deve ter provocado náuseas nos que acompanharam a trajetória do presidente que morreu antes de tomar posse.
O partido que Dilma representa hoje não apenas recusou-se a votar em Tancredo no Colégio Eleitoral como expulsou três deputados federais que, tendo visão política menos imediatista, se recusaram a seguir a orientação partidária e deram seus votos para a eleição do primeiro presidente civil de oposição no regime militar.
O mais surpreendente é que o gesto eleitoreiro tenha partido da mesma pessoa que, dias antes, acusara o candidato oposicionista de ser um lobo em pele de cordeiro por não atacar o presidente Lula diretamente.
Dificilmente existirá atitude mais dissimulada do que essa de homenagear um líder político 25 anos depois, no momento em que seu estado é fundamental para o resultado da eleição, sem ao menos uma explicação, muito menos autocrítica.
A mesma atitude dúbia ela tomou no Rio de Janeiro ao afagar Garotinho, o candidato do PR ao governo, para desilusão do governador Sérgio Cabral, do PMDB, que se considera o candidato oficial de Lula.
A relação de Cabral com Dilma não anda boa desde a crise dos royalties do petróleo, cujo cerne está no projeto do novo marco regulatório para exploração do pré-sal, organizado pela então chefe da Casa Civil.
Para Sérgio Cabral, é mais fácil brigar com Dilma do que com o presidente, e por isso ele já andou dando um recado para a candidata oficial de que nem mesmo sua mulher votaria nela caso prevalecesse a disposição de mudar a distribuição dos royalties.
Uma disputa presidencial apertada como se avizinha valorizará cada adesão que um dos lados conseguir. Assim como pode haver o voto Dilmasia ou Anastadilma em Minas, pode haver um voto suprapartidário no Rio que una o tucano José Serra e o governador Sérgio Cabral. Já existem até comitês nesse sentido sendo montados no estado.
Há ainda a situação do ex-prefeito Cesar Maia, rejeitado pelo PSDB e PV locais, que já se aproximou do ex-governador Garotinho e pode perfeitamente ajudar Dilma no interior.
Em vários outros estados a relação do PT com o PMDB está dando margem a negociações paralelas, que vingarão ou não na medida em que as pesquisas eleitorais mostrarem para que lado o vento está soprando.
Também o PSDB tem problemas, e não apenas no Rio. Um estado emblemático é o Ceará do senador Tasso Jereissati, um dos principais líderes tucanos.
Ele é candidato ao Senado em uma aliança branca com o governador Cid Gomes, do PSB, que tenta fazer com que o partido lance seu irmão, o deputado Ciro Gomes, como candidato a presidente da República.
No Rio Grande do Sul, a governadora Yeda Crusius insiste em tentar a reeleição apesar das crise política em que se viu envolvida, mas a direção do partido gostaria de uma aliança com o PMDB do ex-prefeito de Porto Alegre José Fogaça.
Há, como se vê, um vasto terreno para traições de todos os matizes, até mesmo a do próprio PMDB, que, tudo indica, formalizará seu apoio à candidatura Dilma na convenção de junho, mas não lhe dará apoio integral, ficando de fora do acordo seções importantes do partido como algumas do Sul e Sudeste do país.
Isso se, até lá, a disputa continuar emparelhada, com Dilma mostrando ser competitiva. Se a "boca do jacaré" voltar a se abrir, ampliando a diferença a favor de Serra, até mesmo o "amor verdadeiro" do PMDB poderá desaparecer.
Se, ao contrário, a "boca do jacaré" se fechar cada vez mais, será o candidato tucano que será abandonado pelo meio do caminho.
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