quarta-feira, 16 de março de 2011

Emprego, salário e consumo:: Rolf Kuntz

Emprego e salário continuam sustentando o consumo. Com a renda mensal ainda em alta, as famílias conseguem fugir da marcação do Banco Central (BC), manter a economia razoavelmente aquecida e atenuar, por enquanto, os efeitos da política anti-inflacionária. O mercado financeiro voltou a elevar a inflação estimada para este ano, projetando um aumento de 5,82% para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e de 6,88% para o Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI). O centro da meta, 4,5%, dificilmente será alcançado, segundo o julgamento corrente. Mesmo na avaliação do BC esse ponto só será atingido no próximo ano. Os dados de emprego e do varejo avalizam o ceticismo quanto aos efeitos das medidas de controle tomadas até agora.

O Ministério do Trabalho registrou a criação de 280.799 empregos com carteira assinada em fevereiro - contratações menos demissões. Foi um recorde para os meses de fevereiro, segundo os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados mantido pelo Ministério. Também no primeiro bimestre foi recorde o número de empregos formais criados pela economia brasileira - 448.742.

Números do setor privado confirmam o vigor do mercado de trabalho no mês passado. Segundo a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o emprego na indústria paulista subiu 0,56% de janeiro para fevereiro, descontado o efeito sazonal. Foram contratados 20.500 trabalhadores. O nível de ocupação foi 4,57% superior ao de um ano antes. Dos 22 setores pesquisados mensalmente, 16 contrataram, 3 demitiram e 3 ficaram sem alteração.

Pode estar ocorrendo alguma desaceleração na economia, mas seus efeitos ainda parecem limitados a alguns setores. A ligeira retração do emprego industrial em janeiro, apontada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), parece, por enquanto, ter sido apenas uma acomodação temporária. O contingente assalariado foi 0,1% menor que em dezembro, mas a folha de pagamento foi 5,1% maior, descontada a inflação. Ainda em janeiro, o volume das vendas no varejo foi 1,2% maior que em dezembro, segundo informou ontem o IBGE. Foi o maior aumento desde agosto do ano passado, quando a expansão mensal chegou a 1,9%.

Mas pelo menos um setor acusou os efeitos da política monetária. As vendas de carros, motos e componentes foram 7,1% menores que as de dezembro - uma consequência do aperto do crédito iniciado no fim do ano pelo BC. O aperto poderá continuar, com a imposição de novos limites à capacidade de empréstimo dos bancos. Poderá ocorrer, segundo avaliação do mercado, mais uma elevação dos juros, na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Depois disso, serão mantidas, segundo as previsões correntes, só as chamadas "medidas macroprudenciais" - o velho arsenal de controle da criação de moeda.

O Ministério da Fazenda já acenou com a possibilidade de um arrocho adicional - um aumento do imposto cobrado sobre os empréstimos tomados no exterior pelas empresas brasileiras. Esses empréstimos têm sido um dos canais de ingresso de dólares no mercado brasileiro e, portanto, um dos fatores de valorização do real.

O pessoal da Fazenda parece preocupado principalmente com dois problemas: primeiro, a valorização cambial; segundo, o risco das empresas endividadas, se a tendência do câmbio se inverter e o dólar subir. Uma restrição a esses financiamentos poderá, no entanto, afetar também o nível de atividade, encarecendo o capital externo e limitando o campo de ação das empresas.

Um crescimento econômico na faixa de 4% a 5% em 2011 ainda será razoável, especialmente depois da expansão de 7,5% no ano passado, e facilitará o reequilíbrio da economia. É esse o objetivo declarado mais de uma vez pelo ministro da Fazenda. Mas não se poderá alcançá-lo sem a quebra de alguns ovos, isto é, sem uma expansão menor do emprego e da folha real de salários. Com a economia em crescimento menos veloz ainda será possível contratar pessoal, mas o resultado será menos brilhante e o ajuste poderá ter um custo político. Mas o início de governo é o melhor momento para isso.

Jornalista

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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