quinta-feira, 13 de junho de 2013

O "Velho" dos presidentes - Denise Rothenburg

O Velho do Restelo, personagem de Camões que ao olhar as naus no porto de Belém se apresentava num pessimismo só, virou palavra batida nos discursos presidenciais. Devoradores da língua culta, como José Sarney, nos anos 1980, e Fernando Henrique Cardoso, nos 1990, sempre usaram o ancião como referência para ilustrar situações adversas. Dilma Rousseff agora se iguala aos demais. Ontem, pela segunda vez, recorreu ao Velho para debelar as dúvidas de muitos sobre as perspectivas econômicas do Brasil, especialmente, no que se refere à inflação.

Daqui para frente, garantem os palacianos, Dilma sempre que puder, usará a palavra — e ela passa uma grande segurança na voz — para tentar mostrar que "estamos todos bem". Ocorre que, num país onde a maioria desconhece a obra de Camões, talvez o Velho do Restelo não seja a melhor linguagem para debelar o pessimismo. Sarney não conseguiu. Tampouco Fernando Henrique.

A diferença é que nenhum dos dois à época era candidato à reeleição. Dilma o é. E, vestida de vermelho, usa a imagem do Velho do Restelo numa linguagem mais simples, dizendo que os arautos da inflação em alta são os mesmos que, no início do ano, mencionavam o risco de apagão e racionamento de energia, o que não ocorreu. Ou seja, adota assim, a postura de quem tem crédito para ser ouvida.

Mais efeito que a palavra, entretanto, é a ação e os recursos de que dispõe para se sobrepor aos adversários nessa longa temporada pré-eleitoral. A presidente tem o púlpito palaciano, as inaugurações, as motoniveladoras, os ônibus escolares e toda a gama de obras e utensílios que o governo federal distribui pelo país afora. Maior efeito terá ainda a medida anunciada ontem, de assegurar uma casa mobiliada e com eletrodomésticos para os beneficiados pelo programa Minha Casa, Minha Vida, dentro do novo "casa melhor".

Os efeitos desses programas serão sentidos daqui a alguns meses, entre o fim da Copa das Confederações e o início da Copa do Mundo, quando o país começará a viver um pouco mais as eleições.

Enquanto isso, na oposição...

Para alegria e alívio do governo e da presidente-candidata, seus opositores não têm nem o mesmo espaço, nem as mesmas ferramentas para chegar ao eleitor. Até aqui, a única ferramenta que permitiu a presença de Aécio Neves e de Eduardo Campos de forma mais massiva foi o programa partidário de cada um no rádio e na tevê. Marina Silva nem isso. E, ainda assim, ambos apresentaram alguns pontinhos a mais quando foram expostos. Eduardo, 6%, e Aécio, 14%. Já é alguma coisa para quem não tinha tanto espaço quanto a presidente.

Na avaliação dos oposicionistas, o jogo só ficará um pouco mais equilibrado no período eleitoral. Até lá, é reforçar a guerrilha no Congresso, obstruindo votações, puxando a análise dos vetos.

E no PMDB...

Para sorte de Dilma, entretanto, o presidente do Senado, Renan Calheiros, por quatro vezes desmarcou as sessões convocadas para avaliar os vetos. Renan sabe que é preciso critérios para analisar os vetos, até porque a maioria deles compromete o tênue equilíbrio fiscal. Sabe ainda que, enquanto tiver esse instrumento nas mãos, pode sempre obrigar o PT a rever palanques estaduais, tornando mais equilibrada a relação entre os partidos. É por aí que os peemedebistas vão jogar. Farão, inclusive, uma comissão no partido para tratar exclusivamente desses palanques com a cúpula petista. Afinal, se isso não for resolvido logo, a aliança fica comprometida na convenção, como já foi dito em várias reportagens ao longo dos últimos dias.

Se a situação dos palanques não for equacionada até o fim do ano, talvez Dilma veja engrossar a voz oposicionista no Congresso, onde a situação não é nada confortável. Aí sim, talvez ela tenha mais gente para jogar na classificação de "Velho do Restelo". Por enquanto, essa denominação é restrita aos oposicionistas. Se esse bloco vai aumentar, depende da economia e o tratamento dispensado aos aliados.

Por falar em aliados...

Há quem jure ter ouvido de Eduardo Campos que ele já admite ficar até o fim do governo ou concorrer ao Senado. No governo federal, entretanto, ele é tratado como a candidato a presidente que já passou do ponto de retorno. Entre os petistas, há quem diga que ele lançou a figura do "governador itinerante" de Pernambuco.

Fonte: Correio Braziliense

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