sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Bruno Boghossian – O ex-juiz de uma nota só

- Folha de S. Paulo

Futuro eleitoral do ex-juiz depende quase exclusivamente do destino da Lava Jato

O palanque de Sergio Moro anda meio bambo. O divórcio com Jair Bolsonaro lançou o ex-juiz na arena eleitoral de maneira precoce, como adversário do presidente que o levou a Brasília. Sem os holofotes da toga e do governo, seu futuro político agora depende quase exclusivamente do destino da Lava Jato.

A revisão dos excessos cometidos em Curitiba e o embate dentro do Ministério Público Federal sobre os rumos da operação definirão os caminhos de Moro até 2022. O ex-juiz pode escolher se apresentar como vítima de um conluio para enfraquecer o combate à corrupção, mas deve ter dificuldades para cantar nessa única nota pelos próximos dois anos.

As críticas feitas por Augusto Aras aos trabalhos da Lava Jato reforçam uma trilha que Moro começou a percorrer no dia em que deixou o governo. Alinhado a Bolsonaro, o procurador-geral que tenta impor limites aos investigadores se torna um atalho para acusar o presidente de tentar desmantelar a operação.

O lance do ex-juiz, nesse caso, seria empurrar Bolsonaro para o córner do establishment político, ao lado dos neoaliados do centrão e de opositores do lavajatismo no Supremo. Moro tentaria roubar do ex-chefe o rótulo antissistema, mas ainda precisaria explicar por que jurou fidelidade a um presidente que jamais se interessou em demonstrar compromisso com o combate à corrupção.

Do outro lado do ringue, há outras incertezas. O debate sobre a atuação de Moro nos processos contra Lula pode levar à anulação de condenações do ex-presidente e torná-lo um potencial candidato na próxima campanha. O ex-juiz seria um inimigo natural do petista, mas precisaria disputar o mesmo eleitorado que Bolsonaro já conquistou em 2018 e poderá cativar de vez com a máquina do governo nas mãos.

Ainda que Moro tenha se tornado um dos personagens mais populares do país, seu capital político acumulado pode se desvalorizar com certa rapidez nos próximos anos. Até hoje, o ex-juiz que usou a Lava Jato como vitrine não aprendeu a ser vidraça.

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