quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

Malu Gaspar - Um museu de grandes novidades

O Globo

Durante a campanha, sempre que buscou aplacar as incertezas sobre os rumos da economia ou de áreas estratégicas num eventual terceiro mandato, Lula recorreu à mesma explicação:

— Eu não preciso ficar prestando contas porque as pessoas me conhecem —dizia. — O que eu tenho é o legado de oito anos de Presidência da República.

Era uma forma de driblar a pergunta que todos queriam ver respondida: qual Lula governaria. Se o do primeiro mandato, que seguiu à risca mandamentos de austeridade fiscal e acomodou técnicos liberais, ou o do segundo, que privilegiou a expansão de gastos e subsídios fiscais numa equipe dominada por economistas heterodoxos.

As dúvidas não se restringiam à economia. Muita gente se perguntava se Lula estaria disposto a ampliar seu arco de alianças para além do PT, mais especialmente do núcleo duro que o apoiou nos tempos da prisão em Curitiba. Outra questão que pairava era se Lula não faria um governo de vingança — não só contra os algozes do Ministério Público e da Justiça, mas também contra “inimigos” como o agronegócio, o mercado financeiro e o que petistas costumavam chamar de “imprensa golpista”.

Em resposta, Lula mais de uma vez disse que não faria um governo de revanches e repetiu ad nauseam que precisaria formar uma frente ampla para vencer o bolsonarismo e consolidar a democracia:

— Não será um governo do PT — afirmou. — Tem muita gente que nunca foi do PT e participou do meu governo, e vai ser assim.

Desde que a transição começou, porém, os gestos de Lula vão numa direção diferente. É verdade que ele mais de uma vez afirmou nos palanques que daria fim ao teto de gastos para poder incluir o pobre no Orçamento. Mas a PEC da Transição não abre espaço apenas para pagar benefícios aos mais pobres. Na “licença para gastar” de R$ 145 bilhões aprovada pelo Congresso há um combo que vai além. Da barca de obras de infraestrutura a fundos de cultura e ciência e tecnologia.

O futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, garante que o governo terá responsabilidade fiscal e saberá cortar gastos, mas até agora não se sabe onde, nem quanto, nem como. Nas conversas com potenciais membros do governo, Lula cita como exemplos do que pretende fazer políticas como o conteúdo nacional, incentivos para a indústria naval, construção de refinarias e a manutenção de regimes especiais para determinados setores. Já não deu certo no passado, mas ele parece que não se recorda ou não entendeu.

Com tal postura, a ideia de ter um ministro do Planejamento liberal para fazer dupla com Haddad ficou para trás nos primeiros dias da transição. Vários empresários já recusaram o convite para assumir o Ministério do Desenvolvimento Econômico, e até mesmo para seu secretariado Haddad vem tendo dificuldade de atrair economistas ortodoxos.

Na composição do ministério, o núcleo que apoiou Lula nos tempos difíceis tem demonstrado grande influência. Aliadas como Gleisi Hoffmann e Dilma Rousseff foram fundamentais para garantir a ida de Aloizio Mercadante para o comando do BNDES, antes até da escolha do ministro que será seu chefe.

O grupo de advogados Prerrogativas emplacou vários membros no governo, incluindo a secretaria do Ministério da Justiça que participa de negociações em fóruns internacionais sobre lavagem de dinheiro e corrupção. Nesse caso, o titular será um ex-advogado da Odebrecht que se notabilizou publicamente por combater a Lava-Jato.

Com a escolha de petistas homens para Fazenda (Fernando Haddad), Educação (Camilo Santana), Casa Civil (Rui Costa), Relações Institucionais (Alexandre Padilha) e, agora, Desenvolvimento Social (Wellington Dias), o rol de pastas estratégicas a ser ocupadas por mulheres ou por figuras de fora do PT ou da esquerda lulista vai diminuindo.

Na configuração atual, são grandes as chances de Simone Tebet não ir para o governo. Marina Silva também está balançando. Partidos como MDB, PSD e União Brasil certamente estarão representados, mas esse mapa da Esplanada tem muito mais o cheiro de naftalina das gestões petistas que não deram certo do que o frescor do governo amplo e inovador prometido na campanha.

Quem conhece o PT nunca imaginou que o partido fosse se comportar de forma diferente. Mas não foram poucos os que apostaram no tirocínio de Lula para escapar das armadilhas que podem corroer seu capital político. Até agora, porém, o que se vê é um grande esforço para repetir um passado que já deu errado, com novidades que deveriam estar restritas aos museus da política brasileira.

 

3 comentários:

Anônimo disse...

É, não estão sobrando cargos importantes para as mulheres... Margarete Menezes na Cultura e...? E a Cultura nem é dos mais mais...

Anônimo disse...

Governo que deu errado para quem moça?
Para mim, o governo que deu errado foi o de Jair Bolsonaro

ADEMAR AMANCIO disse...

Simone e Marina parece que foram alijadas do governo,uma ingratidão-petista.