Folha de S. Paulo
Autores conclamam cientistas a juntar-se a
esse esforço de pesquisa interdisciplinar
"A filosofia é a ciência com a qual ou
sem a qual o mundo vai tal e qual". A frase pode ser interpretada como uma
crítica ao caráter altamente especulativo da filosofia. E é fato que filósofos se permitem
voos que parecem pouco práticos à maioria. Às vezes isso ocorre porque
filósofos têm mesmo muita imaginação, mas, às vezes, porque eles propõem
questões que o mundo ainda não está pronto para responder. Avanços em ciências
aplicadas podem estar mudando isso.
Num artigo curioso, Jorge Morales e Chaz Firestone se propõem a buscar em experimentos científicos respostas para questões filosóficas. Uma delas é a questão de Molyneux, sobre a natureza da percepção. Em 1688, William Molyneux escreveu a John Locke perguntando se um cego de nascença que soubesse identificar cubos e esferas pelo tato reconheceria essas formas se se tornasse capaz de ver.
Graças a avanços na oftalmologia, essa não
é mais uma pergunta impossível. Pessoas acometidas de catarata congênita podem não enxergar, embora a afecção
tenha fácil correção cirúrgica. Nos países ricos, o procedimento é realizado
logo que a criança nasce, mas, nas nações mais pobres, vítimas da doença podem
passar anos sem ver até ser operadas. Essa é mais uma das injustiças do mundo,
mas permitiu a pesquisadores testar empiricamente a questão de Molyneux.
E eles concluíram que, ao menos num
primeiro momento, os circuitos do tato e da visão não se comunicam. Pacientes
que não tinham dificuldades para reconhecer as formas pelo tato ou pela visão
separadamente se atrapalharam quando tinham de transportar o conceito formado
em um sentido para o outro. Mas, com mais dias de pós-cirurgia, a performance
melhorou, o que sugere um tipo de aprendizado.
Os autores levantam outros casos de respostas a perguntas filosóficas e
conclamam cientistas a juntar-se a esse esforço de pesquisa interdisciplinar. É
a filosofia no laboratório
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