O Globo
A CPI demarcará a inépcia, a tolerância e a
cumplicidade
O ministro interino do Gabinete de
Segurança Institucional (GSI), Ricardo Cappelli, disse que, “com a liberação
das imagens [do Palácio do Planalto invadido no dia 8 de janeiro], vai ficar
demonstrado que não há qualquer possibilidade de ilação com relação à conduta
do general, que, inclusive, de forma muito honrosa, fez questão de se afastar
das suas funções para que não houvesse dúvida sobre a lisura da conduta dele”.
Cappelli exonerou o general Gonçalves Dias de qualquer responsabilidade na mazorca dias antes da instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investigará a tentativa de golpe de Estado daquele domingo. Esse tipo de atitude levará água para o terraplanismo bolsonarista, que pretende associar o governo à invasão do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal.
No apagão da segurança de Brasília,
misturaram-se inépcia, tolerância e cumplicidade das forças civis e militares
encarregadas de garantir a segurança da Praça dos Três Poderes. Os limites de
cada conduta serão investigados pela CPMI. Pulando na frente, o governo
atira-se numa armadilha.
Em seu depoimento à Polícia
Federal, o general da reserva Gonçalves Dias, afastado da chefia do
GSI, disse que nas mensagens captadas entre os dias 2 e 7 de janeiro “não havia
informações relevantes”. Havia. Os golpistas mobilizavam-se para a “festa da
Selma” e, às 17h24 do dia 5, um integrante do Supergroup avisava:
— Amanhã parece que será falado de uma data
para a festa da Selma.
Nesse dia, outra mensagem falava em três
“trincheiras”, uma no Planalto, outra no Congresso e a terceira no Alvorada.
Às 20h23 do dia 7, um deles informava:
— O Q.G. de Brasília é apenas para
hospedagem e concentração dos convidados que estão chegando. Lá vai ser
combinado o horário e a data para a festa da Selma.
Segundo Gonçalves Dias, “no dia 8 pela
manhã constavam pessoas fazendo discursos exaltados, ameaçando invadir prédios
públicos da República” e “o compilado de mensagens não pode ser considerado
tecnicamente um relatório de inteligência para produção de conhecimento para
assessorar a decisão do gestor”.
Sabe-se lá o que acha que vem a ser
inteligência, mas, às 9h30 do dia 8, uma mensagem informava:
— Não vão invadir nada a não ser na hora
certa de comer bolo da festa da Selma.
Às 11h58 o Supergroup falava em máscaras de
gás, rádios e aconselhava:
— Ao ver uma granada de gás lacrimogêneo,
não corra para pegá-la.
Em seguida, ensinava o momento certo para
atirá-la de volta.
O bolo foi comido na tarde do dia 8. O
Congresso, o Supremo Tribunal e o Planalto foram invadidos, aproximadamente,
entre as 14h45 e as 15h10. Gonçalves Dias só chegou ao Planalto às 16h.
Os vídeos conhecidos mostram que as cenas
de cordialidade do GSI com os golpistas são quase todas anteriores à sua
chegada.
O apagão foi além do GSI. Até hoje não se
explicou a longa inércia do Batalhão da Guarda Presidencial, criado há 200 anos
para proteger o presidente e seus palácios.
A questão que fica para a CPMI é a
demarcação do que separa a inépcia da tolerância ou mesmo da cumplicidade. O
governo não tem (ou ainda não mostrou) elementos suficientes para incriminar ou
exonerar quem quer que seja.
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Nas próximas quatro quartas-feiras, o
signatário usufruirá um apagão pessoal.
Um comentário:
Maneira inédita de anunciar um descanso.
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