O Estado de S. Paulo
A
aprovação da reforma tributária pela Câmara dos Deputados, depois de mais de
três décadas de discussões, foi enorme avanço em direção da remoção da
barafunda que é o sistema atual.
No
entanto, o texto-base contém emendas e jabutis de última hora, que deformam os
objetivos da proposta. Cabe agora ao Senado, sob a relatoria do senador Eduardo
Braga (MDB-AM), exercer função revisora, que remova as escórias e evite a
desidratação do sistema que se quer modernizar.
O que se pretende é a neutralidade das mudanças (sem aumento da carga tributária), a não cumulatividade (sem impostos em cascata), simplificação do sistema e cobrança no destino final da mercadoria e do serviço, de modo a acabar com a guerra fiscal entre os Estados.
Para
a professora do Insper Cristina Helena de Mello, o Senado tem melhores
condições políticas de eliminar ou reduzir as anomalias enxertadas no texto
original. A mesma emenda que possibilita a taxação sobre exportações de
matérias-primas e produtos semielaborados também amplia imunidades tributárias
e inclui novos setores a serem beneficiados com a alíquota reduzida do Imposto
sobre Valor Agregado (IVA). Essas distorções criam tantas “meias-entradas” que,
para garantir equivalência com a arrecadação atual, seria necessário puxar de
25% para 28% a alíquota do imposto, conforme cálculos do Ipea. Esta seria a
maior alíquota vigente nos países que adotaram o modelo tributário.
Falta
também transparência nas propostas, como aponta a doutora em Direito Tributário
Mary Elbe Queiroz. A ausência de estudos de impacto transforma pontos
importantes da reforma em “voo às cegas”, como afirma ela, pois não se conhece
o tamanho da alíquota básica do IVA nem a definição da renda para as pessoas
contempladas pelo cashback, a devolução prevista para os mais carentes. E,
diante de tantos enxertos, deixar essas pendências para serem definidas na lei
complementar, como foi argumentado, derruba a confiabilidade da proposta.
O
ministro Fernando Haddad se comprometeu a fornecer os dados necessários para a
avaliação do Senado. No entanto, parece mais conveniente que, além do maior
interessado, instituições acadêmicas mais isentas de interesses particulares
fossem convocadas para elaborar os estudos sobre o impacto dessas propostas
paralelas.
Há,
ainda, as pendências sobre a governança do Conselho Federativo responsável pela
definição de alíquotas, pela distribuição do resultado e da arrecadação do
Imposto sobre Bens e Serviços. E persistem as dúvidas sobre a distribuição dos
recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional e do Fundo de
Compensação de Benefícios Fiscais e os aportes para o Fundo da Zona Franca.
A previsão é de que o relatório final seja concluído e votado em outubro. São muitas as pontas soltas. O que se pergunta é até que ponto o Senado está disposto a fazer as correções e a impedir o jogo contra dos grupos de pressão.
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