Folha de S. Paulo
Ciclo anestesiou parte da população, mas
também criou demanda por remédios alucinantes
Uma questão recorrente nos estudos
eleitorais envolve as razões pelas quais, em alguns casos, a
população vota contra seus interesses econômicos. A dúvida costuma surgir
quando o partido que governa durante uma recessão consegue permanecer no poder
ou quando grupos mais pobres apoiam um candidato que promete cortar gastos
sociais.
A votação na Argentina representa um desafio para a análise do comportamento do eleitor. O governista Sergio Massa assumiu a liderança da votação de um país sob inflação desenfreada. O artista da motosserra Javier Milei acumulou simpatia em regiões de baixa renda e, depois, esbarrou num ponto de estagnação.
As sucessivas crises na
economia se integraram à paisagem eleitoral argentina. Alguns
analistas suspeitam que esse ciclo anestesiou parte da população e produziu a
sensação de que nenhum governante resolverá o problema. Ao mesmo tempo, criou
uma demanda por remédios alucinantes e aumentou a relevância de pautas antes
secundárias.
Milei não se saiu melhor que seus
concorrentes de direita por ter um programa econômico lúcido. O candidato
chamou atenção com temas laterais, como a
liberação de armas, e transformou a insatisfação com a crise num
sentimento contra a elite política. Capturou o eleitor desiludido ao apostar na
solução exótica do estrangulamento do Estado.
O governismo reagiu. Num país com alta
dependência de uma rede de proteção social, Massa turbinou artificialmente
essas despesas e vinculou o rival ao corte dos benefícios. Encarnou o
excêntrico político que admite a gerência da ruína econômica, mas apresenta
como virtude a responsabilidade por ações paliativas para enfrentá-la.
O desempenho de Massa dependerá do crédito
dado pelo eleitor a esse estado precário da gestão econômica, além do medo de
saltar no escuro com seu rival. Milei, por sua vez, terá que convencer os
argentinos de que o país sobreviveria ao abalo de suas estruturas, com
possíveis repercussões em sua democracia.
2 comentários:
O selvagem da motosserra... Como artista, é um impostor!
Fora,Milei.
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