Como quem produz pãezinhos, o governo petista tirou ontem do forno seu sétimo pacote de incentivos à indústria desde 2008. A simples repetição de medidas, novamente baseadas em redução de tributos e expansão de crédito para o setor automotivo, sugere que a receita da massa está desandando.
O pacote traz medidas como a diminuição do IPI de automóveis e do IOF para financiamentos à compra de veículos - que, com isso, apenas retorna ao patamar vigente no início de 2011. Novamente pontuais, e novamente beneficiando apenas a indústria automobilística, as desonerações envolvem R$ 2,7 bilhões.
O governo optou por repetir a estratégia que gerou efeitos positivos em 2008 e 2009. Naquela ocasião, para fazer frente à crise que se espalhava pelo mundo, Lula implorou aos brasileiros que consumissem como nunca. Não dá para dizer que não tenha dado resultado.
Ocorre que o mundo girou, a Lusitana rodou e a situação hoje é outra. Se, três anos atrás, o cidadão brasileiro ainda tinha desejos de consumo reprimidos, hoje muito do que gostaria de comprar já o foi. Isso é mais verdadeiro notadamente quando se trata de bens duráveis, como automóveis e eletrodomésticos.
A realidade atual desaconselha novas ondas consumistas. O endividamento das famílias cresceu, a inadimplência decolou e o risco de calotes subiu. É difícil concordar que o brasileiro médio esteja hoje ávido por comprar e só não o faz porque não tem crédito: ele não compra porque boa parte do seu salário já está comprometida com pagamento de dívidas.
Levantamento feito pelo Banco Central mostra que o comprometimento da renda disponível do brasileiro com despesas financeiras - ou seja, para quitar dívidas - hoje é de 22%. Trata-se de percentual muito elevado.
Com isso, o novo pacote de incentivo ao consumo lançado pelo governo Dilma Rousseff pode estar armando uma bomba-relógio para explodir logo ali na esquina: o risco do aumento da inadimplência. Tome-se o que está ocorrendo justamente no setor novamente beneficiado pelas desonerações camaradas da gestão petista: em um ano, o calote no financiamento de veículos praticamente dobrou, para 5,7%.
Não é só. Os novos incentivos à compra de veículos exprimem pelo menos outros dois inconvenientes: têm efeito limitado e fôlego curto, além de estar em franca desarmonia com o desenvolvimento econômico baseado em baixa emissão de carbono - nos últimos três anos, o consumo de gasolina no país cresceu 76%. Pela ótica do PT, aceleramos para ser um país de engarrafamentos e shopping centers.
O que parece evidente é que bateu o pânico na presidente Dilma. Tudo caminha para que ela entregue, neste ano, mais um pibinho, ao invés do espetáculo de crescimento que os petistas sempre prometeram. Ontem, os analistas de mercado ouvidos pelo Banco Central prognosticaram3,09% para 2012, mas a tendência é de queda bem mais acentuada doravante.
Constata-se que as medidas pontuais, erráticas, desconexas que a gestão petista vem adotando para reavivar a economia não estão funcionando a contento. Produzem, no máximo, algum lampejo, mas não luz suficiente para apontar novos caminhos. Estão longe de deixar o país "300% preparado", como afirmouontem a presidente.
Até porque ações que, de fato, poderiam abrir novas fronteiras de crescimento para o país não são tomadas. É o caso da expansão do investimento público em infraestrutura; da desoneração consistente da estrutura produtiva e da redução da carga que pesa sobre o contribuinte (que, neste ano, deve atingir 41% da renda bruta, segundo o IBPT); e da remodelagem do Estado, para que ele seja um aliado e não um estorvo ao capital privado.
Até Delfim Netto, aliado fiel do governo do PT, já reclama mudanças: "Sem um equilíbrio entre o consumo e o investimento, o sistema não tem energia para se manter funcionando adequadamente. Chega a hora de mudar. O Brasil precisa dar ênfase ao investimento e às exportações sem recuar na inserção social", escreve ele no Valor Econômico.
Receitas que se mostraram bem-sucedidas numa determinada situação podem se transformar em veneno quando aplicadas em um cenário distinto. É o que pode acontecer com o novo pacote de incentivo ao consumo lançado pela gestão petista. Exaurido, o caminho que o governo busca novamente trilhar pode, na melhor das hipóteses, nos conduzir a lugar nenhum. Na pior, pode nos precipitar de vez no abismo.
Fonte: Instituto Teotônio Vilela / Carta de Formulação e Mobilização PolíticaTerça-feira, 22 de maio de 2012Nº 471.
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