A aprovação do acordo fiscal americano confirma os temores. Apesar de se ter evitado o "abismo", mostrou como está tenso o ambiente político americano. As reportagens de bastidor contam até de palavrões entre líderes. A votação atravessou o réveillon e deixou muito em aberto. O primeiro trimestre terá, pelo menos, uma nova queda de braço sobre o teto da dívida.
O "Político", agência digital de análises políticas, revelou que a poucos metros do Salão Oval, em um dia de reunião em torno do acordo, o presidente da Câmara, John Boehner, virou-se para o líder dos democratas no Senado, Harry Reid, e de dedo em riste afirmou: "vá se..." . O resto da frase em português e em inglês começa com a letra "f". Reid perguntou do que ele estava falando e Boehner repetiu o, digamos, agressivo convite. Segundo o site, a cena foi vista por várias testemunhas. Um pouco antes, Reid tinha acusado Boehner de comandar uma ditadura na Câmara.
Boehner acabou votando a favor do acordo, junto com outros 84 deputados republicanos e isso permitiu a aprovação da proposta que evitou o "abismo fiscal", ou seja, os cortes automáticos de gastos e a elevação geral de impostos. Evitou-se o pior, mas apenas na undécima hora, levando o estresse político americano muito além do razoável.
Há 17 meses a data já havia sido estabelecida como o prazo fatal para que os dois partidos nas duas casas chegassem a um acordo que evitasse o ajuste automático. O que se esperava é que, mesmo levando a negociação até um momento próximo do último prazo, eles não chegariam ao ponto de ficar balançando sobre o abismo em plena noite de réveillon e tivessem que votar no dia 31, no Senado, e 1º de janeiro, na Câmara. Mas foi o que fizeram.
Votaram contra o acordo 151 deputados oposicionistas, entre eles, o líder republicano Eric Kantor. Boehner teve que endurecer pelo menos nas declarações, porque quer continuar sendo presidente da Câmara. Ele disse que a maioria dos eleitores decidiu manter a Câmara sob controle dos republicanos para que eles façam oposição. E é o que farão, prometeu. O ex-candidato republicano à presidência do país, Paul Ryan, também votou a favor, mas ontem divulgou uma nota se explicando. Pode-se imaginar que serão duros os próximos embates.
Boehner admitiu que se o acordo não fosse fechado os republicanos seriam considerados culpados pelo tumulto financeiro que começaria hoje. Mas para eles significou ajudar a aprovar a primeira elevação de impostos em 20 anos. Será o fim da redução da alíquota que incide sobre quem ganha por ano US$ 400 mil, se for solteiro, ou US$ 450 mil o casal. Volta a vigorar a alíquota de 39,6%.
Não arrecadará o suficiente para fazer a diferença no enorme déficit americano, mas assim se evitou o corte no seguro-desemprego e em outros gastos sociais, e uma elevação de impostos para a classe média. O próprio Obama admitiu que "o déficit continua muito alto" e o país está investindo muito pouco "no que precisamos para que a economia cresça tão rápido quanto deveria".
Em dois meses, republicanos e democratas estarão revivendo esse ambiente envenenado na discussão da elevação do teto da dívida americana. Como se vê, o calendário tem outras datas em vermelho para decisões na área fiscal.
Portanto, o que fica da leitura de quão extremados foram os debates nos momentos finais, e quanto se estendeu o tempo além do razoável, é que novos embates radicais vão acontecer este ano. Novos momentos de tensão já estão contratados e novos palavrões poderão ser ouvidos nos diálogos entre republicanos e democratas.
Fonte O Globo
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