segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Divididos, aliados pressionam Marina

Angustiados com a perspectiva de a Rede afundar, apoiadores da ex-senadora formam grupos distintos. Um defende que ela se filie a alguma legenda e o outro sugere que não concorra em 2014 caso a sigla não vingue

Paulo de Tarso Lyra, Diego Abreu

Apesar do discurso oficial, reforçado em uma entrevista coletiva da própria Marina Silva, que garante não ter plano B caso a Rede Sustentabilidade falhe em obter o registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a ex-senadora começa a sofrer pressões distintas de aliados. Os mais próximos a ela, os chamados sonháticos, acreditam que, se a legenda não for registrada, Marina deve assumir o papel de vítima e não se candidatar a nada em 2014, mantendo a imagem de “política diferente dos outros”. Pragmáticos, parlamentares insatisfeitos com as respectivas agremiações alegam que ela não pode abrir mão do capital de 19 milhões de votos obtidos em 2010 e deve se filiar a qualquer partido que lhe dê guarida. Duas legendas nanicas já estariam na mira: o PEN e o PTC.

Em plena tarde de domingo, Marina, que ouve todas as opiniões, mas não adianta a ninguém qual será a decisão, reuniu jornalistas para assegurar que não há um plano B. “Vocês já viram alguém indo para o altar com o noivo ou a noiva e perguntarem: ‘E se ele infarta’? Você diz: ‘Estou de olho na vizinha, tenho um plano B’. Isso não existe. Temos um plano A, estamos confiantes na legitimidade e na integridade do trabalho que fizemos, mobilizando milhares e milhares de pessoas”, disse Marina Silva, após o encerramento da reunião da Comissão Nacional Provisória da Rede, realizada no sábado e no domingo, em Brasília.

Ela avisou que não pensa na hipótese de ir para outro partido caso a Rede não obtenha o registro. Mas, nos bastidores, a história é outra. Além de PEN e PTC, ela já conversou com PPS — hoje mais próximo do PSB de Eduardo Campos — e o PDT, afundado em uma série de denúncias de corrupção no Ministério do Trabalho. Em uma corrida contra o relógio, Marina Silva concentrará esforços com sua equipe jurídica para conseguir a validação de mais 56 mil assinaturas esta semana. O partido diz contar com 440 mil apoios certificados. São necessários 492 mil. Ciente do prazo apertado, os integrantes da comissão aprovaram duas resoluções que tratam de filiações à sigla.

Uma das estratégias é realizar pré-filiações, já que o prazo entre o possível registro e a data-limite para inscrever políticos na nova legenda será muito curto. Já são 2 mil até o momento. O comando da Rede espera que o TSE julgue o pedido de criação da legenda na terça ou na quinta-feira da semana que vem, dias 1º e 3 de outubro, respectivamente. O prazo de filiações e de criação de partidos é 5 de outubro, um ano antes das eleições.

“Lógica eleitoral”
A outra estratégia é fixar critérios para a filiação de agentes públicos e personalidades, estabelecendo que, para ingressar na Rede, é necessário atender requisitos de relação com os ideais programáticos da sigla. “Há uma lógica eleitoral no Brasil. Queremos reverter a lógica quantitativa para a lógica qualitativa”, disse o deputado Walter Feldman (PSDB-SP), integrante da Executiva da Rede.

Durante a reunião, o advogado contratado pelo partido, Torquato Jardim, foi muito aplaudido ao afirmar que “existem provas materiais e jurídicas suficientes para embasar a criação da Rede”. Além disso, os aliados de Marina afirmam que, diferentemente de outros partidos que também estão na fila do TSE, a Rede está sintonizada com a população, e seria um absurdo impedir o registro com base em questões burocráticas. De acordo com o assessor jurídico do partido, André Lima, a Rede cobrará dos cartórios eleitorais e tribunais regionais eleitorais (TREs) a certificação, até o fim da semana de 80 mil assinaturas ainda não liberadas. Segundo ele, caso 70% dessas certificações (o equivalente a 56 mil) sejam validadas, a legenda atingirá a marca de 496 mil assinaturas. Mesmo não atingindo a quantidade mínima de 492 mil apoios, Lima afirma que o TSE terá condição de ter o pedido de registro apreciado pelo TSE.

Na última sexta-feira, a Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) enviou parecer ao TSE apontando que o partido reuniu apenas 304.099 fichas validadas. A legenda alerta que o número atualizado de assinaturas chega a 440 mil, uma vez que 136 mil foram entregues na semana passada. “A única coisa que o procurador mencionou é que há que juntar as assinaturas, porque quem leu o processo se ateve às 304 mil assinaturas que foram protocoladas na petição inicial. Não é um parecer negativo para a Rede, é o parecer que ele poderia dar”, comentou Marina.

A ex-senadora coloca na conta da Justiça Eleitoral a demora para a criação da Rede. “A Rede Sustentabilidade entende que cumpriu, dentro do prazo, tanto o aspecto legal quanto a questão das quantidades exigidas por lei”, frisou Marina.

O caminho da Rede

Confira o passo a passo necessário para a criação de um partido:

» A legenda precisa apresentar 492 mil assinaturas de apoio válidas, o equivalente a 0,5% do total dos votos dados para a Câmara dos Deputados nas últimas eleições

» As assinaturas são verificadas pelos cartórios eleitorais e encaminhadas para o Tribunal Regional Eleitoral (TRE)

» Antes de entrar com o pedido de registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a sigla precisa da certificação das assinaturas de pelo menos nove TREs. A resolução que disciplina a criação de partidos estabelece que as assinaturas sejam coletadas em pelo menos um terço dos estados brasileiros e atinjam ao menos 0,1% dos eleitores de cada uma dessas nove unidades da Federação

» Em posse das certificações de pelo menos nove TREs e com a quantidade mínima nacional de assinaturas, a legenda entra com o pedido de registro junto do TSE

» No prazo de até 48 horas após a apresentação do pedido o processo deve ser distribuído a um relator

» Caberá a qualquer interessado impugnar, no prazo de três dias, contados da publicação do edital, o pedido de registro. Havendo impugnação do Ministério Público ou de outro partido será aberta vista ao requerente para contestar no mesmo prazo

» A Procuradoria-Geral Eleitoral deverá se manifestar em três dias antes de o processo ser liberado para o relator, que não tem prazo para apresentar em mesa para julgamento o pedido de registro. Quando não há impugnação, o processo segue imediatamente para a análise do relator

» Para que o partido esteja apto a participar das eleições de 2014, é necessário que o registro seja aprovado pelo plenário do TSE antes de 5 de outubro de 2013 (um ano antes do pleito). Esta também é a data-limite para um político se filiar a sigla caso queira disputar as eleições do ano que vem

Memória

Trajetória no PT e no PV

Marina Silva, que luta para criar a Rede Sustentabilidade em uma batalha contra o Judiciário, tem se especializado, em sua história recente, em dinamitar pontes por onde tem passado. Escolhida ministra do Meio Ambiente durante o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se indispôs com a então chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, no debate entre a concessão de licenças ambientais e o destravamento das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Mas a decisão de deixar a pasta veio cinco dias após o lançamento do Plano Amazônia Sustentável, coordenado pelo ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger. Marina retomou, então, o mandato de senadora e se tornou uma parlamentar independente do governo.

Em 2009, ela surpreendeu mais uma ao romper um longo casamento com o PT. Chorou na entrevista coletiva na qual anunciou que deixaria o partido que ajudou a fundar, mas afirmou que o PV tinha mais afinidade com o projeto que ela imaginava naquele momento. No ano seguinte, concorreu à Presidência da República e, em uma arrancada impressionante na última semana, obteve 19 milhões de votos.

No fim de 2011, Marina anunciou que estava deixando o PV, depois de uma briga intensa com o presidente nacional do partido, José Luiz de França Penna. Como justificativa, ela alegou a impossibilidade de implantar na legenda verde o seu estilo político. A ex-candidata a presidente da República demorou quase dois anos para começar a lançar as sementes para a criação da Rede. Agora, corre o risco de não viabilizar um partido próprio para disputar o Planalto novamente. (PTL)

Fonte: Correio Braziliense

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