Isolada em seu bunker no Planalto Central, cercada de alguns poucos auxiliares para os quais o mundo está contra o PT, a presidente da República, Dilma Rousseff, talvez não tenha prestado atenção aos avisos de que a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o ministério levaria a Operação Lava-Jato para o colo do governo. Ou simplesmente não quis ouvir, por entender que se tratava de mais uma cilada golpista da oposição. Mas foi exatamente o que aconteceu, apenas algumas horas depois de Lula ser anunciado como o novo ministro chefe da Casa Civil.
Não que a presidente seja uma personagem inocente na trama urdida para dar a Lula a proteção do foro privilegiado, como se vê nas gravações das conversas entre Lula e a própria Dilma, Lula e o ministro Nelson Barbosa (Fazenda) e o agora ex-ministro Jaques Wagner, entre outros integrantes menores da república sindical petista. Mas o erro da presidente, talvez o maior de todos os seus erros no Palácio do Planalto, que não foram poucos, foi de avaliação política, combinado com o desprezo olímpico ao recado enviado pelas manifestações realizadas no domingo anterior, que reuniram milhões de pessoas.
Nomear Lula para a Casa Civil já era uma temeridade, conforme advertiram mais de um analista e mesmo aliados importantes que conseguem analisar a conjuntura pelo que ela é. Depois do ronco das ruas, então, equivalia a um suicídio político. Junto com Lula subiriam a rampa do Palácio do Planalto o tríplex, o sítio em Atibaia, as perigosas relações do ex-presidente com as empreiteiras e a suspeita - que se comprovou uma certeza - de que Lula buscava, mais que qualquer outra coisa, um salvo conduto para circular sem a ameaça de ser preso por uma ordem do juiz Sérgio Moro. Era muito peso para uma canoa que já apresentava furos.
Foi exatamente contra tudo isso que se manifestaram mais de seis milhões de brasileiros, no domingo. As palavras de ordem do protesto eram justamente o "Fora Dilma", "Fora Lula", "Fora PT" e "Viva Sergio Moro". Tudo o que a população repudiou foi abrigado por Dilma no governo. O ato da presidente, ao nomear Lula, soou como um insulto aos milhões de manifestantes que foram às ruas mostrar seu desagrado com os rumos do governo e repulsa à corrupção.
Até a última quarta-feira, a presidente Dilma tinha o mandato ameaçado por um pedido de impeachment cuja justificativa, as "pedaladas" fiscais, não causava maior entusiasmo nem sequer entre defensores do seu afastamento. O requerimento, agora, ganhou cores vivas, quando se viu Dilma em ação para proteger seu padrinho político ou concordando com as ofensas dirigidas pelo ex-presidente aos poderes constituídos, notadamente o Ministério Público Federal e o Supremo Tribunal Federal.
Na campanha de 2014, Dilma disse que faria "o diabo" para ganhar a eleição. Ao se submeter ao vexame de abdicar para Lula assumir o governo, a presidente mostra que está disposta a fazer o mesmo para preservar o mandato. Joga fora os 54 milhões de votos que teve na eleição de 2014 e que a levaram ao Palácio do Planalto para governar para todos os brasileiros.
A presidente, aparentemente, não se importa com o fato de que dois terços da população rejeitam seu governo e se declaram favoráveis ao impeachment, de acordo com todos os institutos de opinião. No universo de uma governante isolada tudo se resume a uma luta do "nós contra eles", não importa que "eles" sejam os partidos da oposição ou os seis milhões de pessoas que estavam nas ruas no dia 13 de março.
Levada por seus próprios erros, Dilma chegou à antessala do impeachment, mas sobreviveu a 2015 e ao início de 2016, com mais ou menos possibilidades de chegar ao fim do mandato. Abraçada a Lula, a presidente entrou no que pode ser o corredor da morte. As engrenagens do impeachment começaram a funcionar. Encurralada, a presidente tem a opção da renúncia que poderia abreviar a crise. Mas Dilma parece disposta a morrer em combate, agora ao lado de seu mentor, não importam as consequências que o vale tudo para salvar o mandato possam ter para o país. Resta torcer por uma solução rápida que tire o país do impasse que o paralisa e que eleva o risco de uma depressão econômica. Sem o "nós contra eles", mas para todos os brasileiros.
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