- Folha de S. Paulo
O que Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump têm em comum? Além de serem ambos homens brancos, eles são autênticos representantes do que a imprensa já chama de era pós-verdade que não hesitam em colocar seus projetos pessoais acima das instituições.
Acossado pela Justiça e sem conseguir explicar seu relacionamento com empreiteiras, Lula elabora uma sofisticada narrativa, com toques de surrealismo, segundo a qual foi montado um enorme complô conservador para bani-lo da política e eliminar um projeto de governo popular.
O problema é que, para essa versão parar em pé, é preciso que Polícia Federal, Ministério Público e Justiça, além da imprensa, tenham se mancomunado com o intuito de persegui-lo, o que parece pouco plausível, em especial quando se considera que foram governantes do PT que indicaram os nomes que hoje compõem a cúpula dessas instituições.
Já Trump, com a campanha atravessando uma crise e em queda livre nas pesquisas, recusa-se a assegurar que aceitará o resultado do pleito de novembro, caso seja derrotado por Hillary Clinton. O que ele coloca em questão é a própria legitimidade do processo eleitoral dos EUA. Nem Al Gore, que perdeu a Casa Branca para George W. Bush na ultracontrovertida disputa de 2000, decidida por pouco mais de 500 votos na Flórida, se negou a reconhecer a derrota.
É verdade que nem Lula, nem Trump chegaram a dizer com todas as letras que se consideram acima das instituições, mas o simples fato de seus discursos apontarem nessa direção já preocupa. Nem a democracia, nem as instituições de Estado são perfeitas. Ao contrário, padecem de graves problemas. Mas não é absurdo afirmar que boa parte do que deu certo no Ocidente nos últimos dois séculos se deve ao fato de que aprendemos a respeitar processos institucionais, mesmo admitindo que possam conter erros. É essa virtude que a improvável dupla ameaça.
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