- O Estado de S.Paulo
Planalto, Itamaraty e Forças Armadas esperam que venha um 'período de calma' depois do ataque americano que matou o líder militar Suleimani
Depois da nota de sexta-feira passada, claramente alinhada aos Estados Unidos e contra o Irã e o Iraque, o governo Jair Bolsonaro tenta agora recuperar um bom equilíbrio entre os EUA e o Irã. Ao mesmo tempo em que o Planalto considerou o discurso do presidente Donald Trump “conciliador”, o Itamaraty enviou sinais para o Irã de que tem todo o interesse em manter boas relações diplomáticas e comerciais com o país.
A decisão de cancelar a reunião que haveria entre diplomatas brasileiros e iranianos ontem, em Teerã, foi tomada pelo Itamaraty na noite anterior. Motivo: o embaixador do Brasil no país, Rodrigo Azeredo, que está de férias no Rio e deveria ter voltado a Teerã assim que estourou a crise, contraiu uma pneumonia e foi internado num hospital carioca.
O Itamaraty avalia que, ao sugerir manter a reunião, que estava pré-agendada e tinha como pauta a cooperação bilateral na área de cultura, o governo do Irã havia dado um sinal positivo a favor das boas relações entre Teerã e Brasília e não seria adequado enviar a encarregada de Negócios, Maria Cristina Lopes, que substitui o embaixador, mas é apenas primeira secretária. Ou seja, uma diplomata “júnior”.
Cristina havia sido chamada pela chancelaria iraniana para explicar a nota brasileira de sexta-feira, o que, do ponto de vista diplomático, aponta para um descontentamento do Irã em relação ao Brasil. Depois do encontro dela com os iranianos no domingo, porém, houve um certo alívio no Itamaraty e no Planalto, que classificaram a reunião como “pacífica”.
Num momento de grande tensão, porém, o Itamaraty considerou que seria inadequada uma nova reunião diplomática bilateral sem o próprio embaixador, que é, oficialmente, o representante do presidente da República no país. Um embaixador é indicado pelo presidente, sabatinado pelo Senado e tem, portanto, um status muito diferente de uma mera substituta, uma encarregada de negócios.
Na expectativa do governo, unindo Planalto, Itamaraty e Forças Armadas, vem aí um “período de calma”, depois do ataque americano que matou o líder militar Suleimani e da reação do Irã, que foi bem menos feroz do que temiam setores diplomáticos e militares mundo afora.
Os ataques não visaram a cidadãos ou militares americanos, abrindo uma brecha para que Trump fizesse um discurso “conciliador” e trocasse ameaças bélicas por retaliações comerciais. Ou seja: na avaliação de altos representantes do governo brasileiros, os dois lados deram sinais claros de que não querem ir “às últimas consequências”, leia-se, ir à guerra.
Uma alta fonte militar brasileira, porém, faz três ressalvas em conversa com o Estado: 1) é cedo para haver previsibilidade, porque a tensão continua e qualquer palavra ou ato fora do lugar pode reacender a beligerância; 2) mesmo sem mortes de americanos, o Irã usou 22 mísseis, “que não são 22 bombinhas de São João”, conforme o oficial; 3) não se trabalha com a hipótese de atentado na queda do jato com 176 mortos, mas no Brasil foi mal recebida a recusa de ceder as caixas-pretas para investigadores internacionais. Logo, nenhuma hipótese deve ser liminarmente afastada.
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