- Valor Econômico
Senadora Kátia Abreu critica “arroubos” de Bolsonaro
Quando embarcar para Campo Grande no fim de semana, o senador Nelsinho Trad (PSD-MS) terá completado 24 dias longe da esposa, Keilla, e da filha de seis anos, após cumprir a jornada de recuperação da infecção pelo coronavírus.
Ele é um dos recuperados num cenário desolador de 159 mortos e 4.579 brasileiros infectados, segundo dados de ontem do Ministério da Saúde. À coluna, Trad contradisse o presidente Jair Bolsonaro: “Só lhe asseguro uma coisa, isso não é gripezinha, é de arrebentar a boca do balão!”
Médico de formação, e primo-irmão do ministro Luiz Henrique Mandetta - que foi seu secretário de Saúde na Prefeitura de Campo Grande - Nelsinho Trad é defensor incondicional da política de isolamento social e exorta Bolsonaro a seguir as orientações do comandante da Saúde.
“Muita calma nessa hora: problemas na economia surgirão, fazendo ou não o isolamento social, mas será possível reagir a eles no momento adequado”, pondera o senador, considerado um aliado do Palácio do Planalto. “Sou aliado do Brasil”, retifica.
Ele é um dos 23 integrantes da comitiva que acompanhou Bolsonaro na viagem aos Estados Unidos no começo do mês e contraiu o vírus.
Trad revelou que teve febre alta e sentiu muito cansaço. “A febre não baixava, ficava em 38,5º, mesmo com a dipirona”, relembrou. “Isso é o sinal amarelo, foi quando eu assustei”. O médico o encaminhou para o hospital e ele passou cinco dias internado na unidade do Sírio Libanês, em Brasília, dois deles na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Trad e Mandetta integram a mesma família tradicional na política do Mato Grosso do Sul: o pai do senador é irmão da mãe do ministro. A parceria entre ambos vigorou pelos oito anos em que Trad comandou a Prefeitura de Campo Grande. Ele ressalva que Mandetta não foi nomeado pelos laços consanguíneos, mas por indicação das entidades médicas locais.
Trad é urologista, e Mandetta, ortopedista. Nenhum deles é infectologista, mas na prefeitura, enfrentaram epidemias complexas: dengue em 2006, Sars e leishmaniose. “Assim como o presidente Bolsonaro ouve o alerta dos economistas, ele deve escutar o ministro da Saúde, porque o Mandetta não está tirando isso [medidas de isolamento] da cabeça dele, é ciência, não é achismo”.
Mesmo assim, Trad contemporizou a escapada do presidente no domingo, em Brasília, quando deliberadamente se expôs, bem como aos populares com quem interagiu. “São os rompantes dele”. Para o senador, Bolsonaro está agindo como um “rádio que não está sintonizando bem”. Mas se ele deixar cada auxiliar atuar no seu quadrado, acredita que a crise possa ser controlada.
Bolsonaro violou a quarentena imposta por decreto do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), e saiu às ruas para circular entre comerciantes e ambulantes, estimulando-os a retornar ao trabalho apesar das medidas restritivas, que vêm sendo recomendadas não apenas pelo Ministério da Saúde, mas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Para assegurar a cura, Trad diz que seguiu “rigorosamente e disciplinadamente” o protocolo médico. Receita administrada, lembra ele, por países como Japão e Coreia do Sul, onde a epidemia tem sido contida. “Nesses países, a autoridade sanitária é respeitada, não tem ninguém querendo sair da linha”, comparou.
Trad não trocou dicas com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), de quem é próximo, e que também agonizou na cama com o vírus nas duas últimas semanas.
“A recuperação dele [Alcolumbre] está boa, mas não fico ligando”. Trad revela que o isolamento induz o doente a um modo de introspecção. “Cultivamos o exercício de ficar quietos”.
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A senadora Kátia Abreu (PP-TO) não foi infectada pelo coronavírus, mas é como se sentisse na pele cada sintoma da enfermidade que atingiu há cerca de uma semana seu filho do meio, o empresário Iratã, de 34 anos.
Ele teve muita tosse, sentiu-se febril, mas com pouca falta de ar. A senadora reconhece que o filho não observou as medidas restritivas, e agora encontra-se em total isolamento em seu quarto, na residência da família em Palmas.
“Como muitos jovens, achou que não se contaminaria”, lamentou a senadora. Ao contrário do que tem afirmado o presidente Jair Bolsonaro, as estatísticas mostram que no Brasil o vírus tem atacado adultos com menos de 50 anos com a mesma fúria com que dizimou populações de idosos na Itália e na Espanha.
Kátia dispensou os empregados domésticos e assumiu pessoalmente os cuidados com o filho, inclusive o preparo das refeições e a higienização das roupas. Próxima ao governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), que é médico, ouviu dele a advertência de que todos deveriam sair da casa, isolando o paciente. Mas ela desobedeceu o amigo: “E quem vai cuidar dele? Não desejo para mãe nenhuma a angústia pela qual estou passando”, desabafou. ”Qualquer mãe que passe pelo que estou passando não exclui as possibilidades mais trágicas”.
Embora distante, Kátia tem mantido contato telefônico diário com o vice-presidente do Senado, Antonio Anastasia (PSD-MG), e com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sobre as ações do Congresso para mitigar os efeitos da pandemia. Ela vai propor um projeto para que os pacotes de internet de quem não puder pagá-los não sejam cortados, para que as pessoas não deixem de se informar sobre a pandemia.
Kátia condenou o tour de Bolsonaro no fim de semana pelas ruas do Distrito Federal. “Ele agiu com deslealdade com a população. As pessoas têm medo de perder o emprego, mas têm medo de perder a vida também”, argumentou.
Kátia diz que na sexta-feira, quando o governo apresentou o pacote de socorro às empresas para garantir o pagamento dos salários sem demissões, os parlamentares avaliaram que o cenário estava pacificado. “E agora ele [Bolsonaro] teve esse arroubo, isso não é normal”, criticou. “Precisamos combater o vírus, não o presidente!”
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