Nesta
eleição houve um deslocamento para o centro, em proveito de posições
democráticas
Há
um misto de desinformação, diria intencional, e análises ideologicamente
orientadas que impede um olhar isento sobre o resultado das eleições
municipais. A derrota fragorosa do bolsonarismo e do petismo, a polarização que
vinha orientando a política, deu lugar à moderação e a posições democráticas
que se situam primordialmente do lado da direita, que obteve significativos
ganhos. Se considerarmos que os tucanos são considerados de direita pelos
petistas, esse avanço é ainda maior.
Falta
aqui uma distinção essencial. Perdedora foi a extrema direita, varrida do mapa
eleitoral municipal – são poucas chances de sucesso no segundo turno com
Marcelo Crivella, no Rio de Janeiro, base da família Bolsonaro. A direita, em
suas várias vertentes, conservadora, liberal e fisiológica, obteve ganhos
importantes, colocando-se, se souber unir-se, como protagonista para 2022. Não
precisa mais atrelar-se ao bolsonarismo, como nas eleições de 2018. Na capital
paulistana, seu candidato, Celso Russomano, nem ao segundo turno conseguiu ir,
ficou em quarta posição, competindo com Arthur do Val Mamãe Falei, candidato do
MBL, que por pouco não o alcança, tendo ele vencido o PT.
A
esquerda petista, por sua vez, foi um fracasso. Não chegou ao segundo turno em
São Paulo e no Rio de Janeiro e ficou atrelada, em posição secundária, ao PCdoB
em Porto Alegre, enfrentando um forte candidato do MDB, Sebastião Melo, com
chances fortes de vitória. O PCdoB, aliás, não demonstrou presença eleitoral no
Maranhão, seu reduto, com o governador aspirando à posição de presidente da
República, ou vice. E não adianta o PT alardear que comparece com vantagem no
Recife, contra o PSB, pois lá, mais do que uma disputa partidária, trata-se de
uma disputa familiar, interna à família Arraes. Está mais para a psicanálise do
que para a política. Ademais, tem o efeito colateral de afastar o PSB do PT. O
antigo líder demiúrgico já não produz milagres, como os profetas do Antigo Testamento, que, uma vez
cumprida a sua “missão”, voltavam a ser pessoas comuns, perdendo o dom da
profecia.
A
esquerda órfã, ávida de utopias desconectadas da realidade, está agora
inventando um substituto na figura de Guilherme Boulos, do PSOL, que seria, de
certa forma, o consagrado oculto – embora nem tão oculto – de Lula. Certos
intelectuais e artistas que adoram viver em suas fantasias estão alardeando a
“novidade”. A única vantagem de Boulos consiste em representar um PT sem folha
corrida policial, porque no mais expressa o atraso no nível das ideias. Querer
apresentar-se agora como voz “moderada” beira o escárnio, por ser líder de
invasões de propriedades, representando a versão urbana do MST, com a
utilização dita “pacífica” da violência. Ou seja, “violência pacífica”! Seu
movimento poderia invadir as propriedades dos riquinhos politicamente corretos
que o apoiam.
O
centro, isto é, a direita em seus distintos matizes, alcançando os tucanos,
aumenta a sua capilaridade em todo o País, elegendo prefeitos, vice-prefeitos e
milhares de vereadores, um ativo nada desprezível para as próximas eleições.
O
MDB continua sendo o maior partido brasileiro pelo número de prefeituras,
apesar de ter perdido posições, algo normal dada a sua proeminência nacional
nos governos anteriores. Elegeu 774 prefeitos, além de enorme quantidade de
vereadores, e pode ainda conquistar prefeituras importantes no segundo turno,
como Porto Alegre, Goiânia e Teresina. O DEM conseguiu emplacar vitórias
importantes no primeiro turno, como em Salvador, Curitiba e Florianópolis.
Ademais, seu candidato no Rio de Janeiro, Eduardo Paes, tem enormes chances de
vitória em segundo turno. O partido ganha musculatura, apostando num
protagonismo maior nas eleições de 2022.
O
PP é, pelo número de prefeituras, o segundo partido do País, com 682 vitórias,
reafirmando sua presença nacional. Sua liderança no Centrão tende a crescer,
assim como sua influência política. Com 650 prefeituras, o PSD teve importante
desempenho, ganhando maior protagonismo nas tratativas relativas ao próximo
pleito eleitoral. Sua vitória em Belo Horizonte, com Kalil, é da maior
relevância, além da conquista de Campo Grande.
O
PSDB tem um candidato muito competitivo para a Prefeitura de São Paulo, Bruno
Covas, além de conquistas importantes em prefeituras de todo o Estado, como em
Santos e no ABC. Mantém sua base eleitoral tradicional e também avançou em
Natal e Palmas. Conserva sua característica de partido forte em São Paulo e
fraco nacionalmente.
As
mídias sociais, por sua vez, não se impuseram, perderam o protagonismo que
tiveram nas últimas eleições – isso quando poderiam ter sido beneficiadas pela
pandemia. Candidatos de alto desempenho digital não tiveram ganhos
correspondentes. A extrema direita e a esquerda petista já não polarizaram as
eleições. Os radicais não conseguiram firmar a sua lógica do inimigo a ser
abatido. Houve um nítido deslocamento para o centro do espectro político, em
proveito de posições democráticas.
*Professor de filosofia na UFRGS.
Nenhum comentário:
Postar um comentário