domingo, 12 de junho de 2022

Elio Gaspari: A criminalização da Amazônia

O Globo / Folha de S. Paulo

Uma coisa é discutir o desmatamento ou a falta de atenção para os indígenas, outra é olhar para a região como hospedeira do crime organizado, com seu braço do narcotráfico

O desaparecimento do indigenista Bruno Araújo e do jornalista inglês Dom Phillips se tornou um capítulo no debate internacional em torno da Amazônia. O governo brasileiro, que já estava mal na foto, ficou pior. Uma coisa é discutir o desmatamento ou a falta de atenção para os indígenas. Bem outro é olhar para a região como hospedeira do crime organizado, com seu braço do narcotráfico.

Os estrategistas de Brasília, que gostam de brincar com tabelas, arriscam transformar a Amazônia numa ameaça à segurança de outros países. A debilidade do Estado brasileiro na região estimulará discursos intervencionistas, bem ou mal-intencionados. Para um europeu ou norte-americano, o aquecimento global pode ser um assunto secundário, já a cocaína exportada para suas cidades é um risco próximo. Basta lembrar que o latino-americano mais famoso mundo afora é o falecido narcotraficante colombiano Pablo Escobar. Ele foi tema de algo como 30 filmes e séries de TV, mais dezenas de livros publicados no mercado de língua inglesa.

As facções criminosas competem com os órgãos federais de segurança e meio ambiente. Lá estão o Comando Vermelho carioca, o paulista Primeiro Comando da Capital, mais a Família do Norte, o Comando Classe A e Os Crias. Elas são um dado da equação. A conexão dos garimpos ilegais com essas facções criminosas é outra. Junta-se a essas duas anomalias a rede de interesses de grileiros, desmatadores e garimpeiros ilegais confortados pela retórica de Jair Bolsonaro.

Há mais: o governo do presidente do Peru, Pedro Castillo, anunciou uma vontade de legalizar o plantio das folhas de coca na sua parte da floresta. Nas palavras de Ruben Vargas, ex-ministro do Interior daquele país, “estamos entrando na linha perigosa de nos convertermos num narcoestado“. Isso porque os plantadores de coca teriam dois mercados, o estatal e o dos traficantes.

Numa trapaça da História, Bruno Araújo e Dom Phillips estavam no Vale do Javari, região onde fazem fronteira o norte do Brasil, Peru e Colômbia. Por lá passou o explorador Pedro Teixeira, a quem se deve a fundação, em 1639, do povoado de Franciscana. Foi graças a ele que, no século seguinte, o diplomata Alexandre de Gusmão, expandiu as terras brasileiras a Oeste da linha do Tratado de Tordesilhas.

Franciscana sumiu e sua localização é controversa. Sabe-se apenas que ficava nos “ejavaris, nas bocaínas do Rio do Ouro”. No século XVIII, entendeu-se que esse lugar ficava em terras que hoje são do Equador. Mais tarde, acreditou-se que ficasse mais a Leste, na foz do Rio Juruá. A pesquisadora Maria do Carmo Strozzi Coutinho levantou uma terceira hipótese: Franciscana ficava na foz do Rio Javari. A chave estaria na expressão “ejavaris“. Era comum que os rios fossem identificados pelo nome dos habitantes do seu entorno. Havia os rios dos “tapajoses“ e dos “tocantines“. Eram o Tapajós e o Tocantins. Assim, a terra dos ejavaris estaria no vale do Rio Javari. Faz sentido.

Contrabandistas naquele vale são coisa antiga. Em 1752, o governador do Grão-Pará, irmão do Marquês de Pombal, pediu a Lisboa a fundação de uma vila no vale do Javari porque ali estava “a porta por onde se faz comércio clandestino”. Naquele tempo, contrabandeava-se a prata dos Andes. Hoje, circulam cocaína e algum ouro.

Foi graças a homens como Pedro Teixeira, Pombal e seu irmão, que Alexandre de Gusmão empurrou as fronteiras do Brasil para Oeste da linha de Tordesilhas, que ia da Ilha de Marajó a Santa Catarina. Naquele tempo, uma viagem de São Luís do Maranhão a Lisboa levava cinco semanas.

Hoje, mesmo com os jatos e a internet, o Vale do Javari continua longe da atenção do governo brasileiro.

Wilson Quintella viu a beleza da vida

Morreu na semana passada, aos 95 anos, Wilson Quintella. Ele presidiu a empreiteira Camargo Corrêa. Seus 40 anos de serviço na empresa confundiram-se com as grandes obras da engenharia nacional, de Brasília a Itaipu.

Aqui vai uma história desse empresário. Ela mostra como a vida pode ser bela.

Nos início dos anos 60, Quintela ia em seu automóvel, retornando de uma obra ferroviária em Bauru (SP). Na estrada de terra, passou por uma senhora que caminhava com duas crianças. Ofereceu-lhes carona. Na conversa a menina, contou-lhe que o pai, carpinteiro, estava desempregado e tentava um lugar na obra da Camargo Corrêa. O empresário disse-lhe que fosse ao canteiro e se apresentasse, em nome de Wilson Quintella.

A senhora com as crianças desembarcaram, e o empresário nunca mais soube do carpinteiro japonês que precisava de trabalho.

Passaram-se uns 20 anos. Wilson Quintella havia sido chamado pelo ministro da Fazenda Ernane Galvêas para acompanhá-lo num voo de Nova York a Tóquio, durante o qual conversariam. Tudo bem, mas Quintella estava na Venezuela. Tomou um avião para Nova York e foi para o balcão da Japan Airlines, no aeroporto Kennedy, buscando um lugar no voo de Galvêas.

O avião estava lotado e havia lista de espera. Na fila, Quintela deu um cartão de visitas à atendente da Japan Airlines, para que ela copiasse o nome. Até então, falavam em inglês, mas a atendente passou a falar em português e disse-lhe:

— O senhor vai embarcar, nem que eu tenha que tirar o piloto.

Era a menina da carona na estrada de Bauru.

Bolsonaro, Guedes e Noel

Bolsonaro e Paulo Guedes anunciaram um pacote de medidas destinadas a baixar o preço dos combustíveis. A conta é simples: A União zera seus impostos e ressarce os Estados que reduzirem seus tributos.

O plano poderá custar algo entre R$ 25 bilhões e R$ 50 bilhões. Parte desse dinheiro virá da venda da Eletrobras.

Antes de conceber o pacote que vende uma estatal para baixar o preço do combustível, Bolsonaro e Guedes, ouviam Noel Rosa cantando “Palpite”:

 “Ser palpiteiro neste mundo é uma sina

Vendeste o carro pra comprar a gasolina.”

De Simonsen@edu para Guedes

Caro Paulo,

Você quer que os supermercados segurem preços até 2023. Tente outra. Em abril de 1979, eu quis segurar os preços por 60 dias. Perdi meu tempo e em agosto deixei o ministério.

Quando me despedi do presidente João Figueiredo, ele me perguntou:

Mário, você acha que o meu governo está uma merda, não?

Respondi: Presidente, eu estou indo embora...

A inflação fechou o ano em 77%. Eu estava no Leblon.

Um abraço,

Mário Henrique

Saúde na Justiça

As guildas dos planos de saúde reclamam do que chamam de “judicialização” de suas atividades. Em 2021, só no Tribunal de Justiça de São Paulo foram julgadas 16.286 ações da freguesia contra as operadoras. A Justiça deu razão aos fregueses em 81% dos casos.

Quem tem advogado se protege. Quem não tem (o andar de baixo), rala.

Desse jeito, falta pouco para que as famílias precisem comprar planos casados. Num, compram serviços médicos; noutro, garantem-se com um advogado.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

O crime organizado tomou a Amazônia de assalto,já que o poder público é tão desorganizado.