O Globo
A Procuradoria-Geral da República fez no
início da semana um pedido ao Supremo Tribunal Federal, na investigação sobre a
responsabilidade de Jair
Bolsonaro nos atos golpistas de 8 de janeiro: que o
ministro Alexandre de
Moraes mande as redes sociais entregarem ao Ministério Público
uma lista com os nomes e dados de identificação de todos os seguidores do
ex-presidente.
O subprocurador-geral que assina a requisição, Carlos Frederico Santos, diz que a lista servirá para analisar o alcance da publicação, por Bolsonaro, de um vídeo com um procurador de Mato Grosso lançando suspeitas sobre a lisura das eleições de 2022. O ex-presidente postou a peça no dia 10 de janeiro e apagou duas horas depois. Sua defesa diz que ele apagou porque publicou por engano e afirma que o vídeo não prova envolvimento com os atos golpistas, porque, àquela altura, eles já tinham acontecido. Desculpa esfarrapada.
Bolsonaro se cansou de incitar ataques ao
sistema eleitoral e tornou-se inelegível em razão de um deles, cometido diante
de 72 embaixadores estrangeiros. O vídeo pode não ser prova do que ele fez
antes, mas mostra que, mesmo depois dos graves ataques às instituições,
continuava fomentando o golpismo.
A postura celerada de Bolsonaro, porém, não
torna legítima a iniciativa da PGR.
Não é apenas complexo, mas assustador, constatar que o time de Augusto Aras acha
razoável ter acesso de uma só vez a dados pessoais de cerca de 30 milhões de
brasileiros (o ex-presidente tem 50 milhões de seguidores, mas seus assessores
estimam que seria esse o universo atingido, descontando quem o acompanha em
mais de uma rede) apenas para aferir o alcance e a repercussão de um vídeo.
Para isso, há outras informações também já solicitadas às plataformas de
internet — como a quantidade de visualizações, compartilhamentos e comentários.
Ao que tudo indica, o que realmente se
busca é cruzar esses dados com os outros disponíveis e criar um índex de
cidadãos por preferência ideológica.
Não faz muito tempo, o próprio governo
Bolsonaro montou um dossiê com centenas de servidores identificados como
antifascistas que, de acordo com a justificativa oficial, também visava a
preservar “a segurança das pessoas e do patrimônio público”. Na prática, seria
um instrumento de patrulha política e intimidação. Daquela vez, o rechaço da
sociedade foi generalizado, e o documento terminou engavetado. Agora que se
tenta o mesmo expediente contra potenciais bolsonaristas, o silêncio é
gritante.
Não há dúvida de que para eliminar a ameaça
autoritária da política brasileira é preciso ir até o fim nas investigações
sobre o 8 de Janeiro e punir exemplarmente quem atentou contra o Estado de
Direito. Também é impossível dissociar Bolsonaro de tudo o que aconteceu. O
ex-presidente passou todo o seu mandato fomentando o golpismo. Utilizar contra
os bolsonaristas ferramentas igualmente autoritárias só ajuda aqueles que
buscam confundir os conceitos e se travestir de democratas.
O único que permanece coerente é o procurador-geral,
Augusto Aras, que apoiou lá atrás o dossiê dos antifascistas da mesma forma que
hoje tenta montar o índex de bolsonaristas. A linha de Aras, que está em plena
campanha pela recondução, é servir aos interesses de quem está no poder. E o argumento
utilizado nos bastidores para tentar convencer o presidente da República a lhe
dar mais um mandato é justamente que será um PGR tão fiel ao petismo quanto foi
ao bolsonarismo.
A PGR também aprovou outra medida polêmica
— a ordem de busca e apreensão sobre os acusados de agredir Alexandre de Moraes
e seu filho no aeroporto de Roma —, defendida pelo ministro da Justiça, Flávio Dino.
O ministro considera que a iniciativa tem fundamento jurídico e escreveu no
Twitter que “passou da hora de naturalizar absurdos”.
No mesmo dia, Lula comparou
os supostos agressores de Moraes a animais selvagens formados no nazismo, que
devem ser extirpados da sociedade brasileira. Não havia, nessa fala, nem sombra
do discurso de união da campanha eleitoral, tampouco preocupação do presidente
de vir a ser associado ao bolsonarismo que falava em metralhar petistas.
Augusto Aras tem vários defeitos, mas falta
de compreensão política não é um deles. Ele já entendeu o jogo e traçou sua
estratégia. Por enquanto, a impressão geral no governo é que Lula não nomeará
para um cargo tão sensível alguém tão associado a Bolsonaro. O PGR, porém, é
persistente. Seu objetivo é mostrar serviço, e está se empenhando como poucos.
Se Lula vai retribuir, só o tempo dirá.
4 comentários:
Perfeito
Perfeito, sim. Realmente::perfeito!
▪Será que seguidistas, os de uma ponta até os da outra, na conformação mental que têm e que foi esculpida pelo ideologismo, processam adequadamente as reflexões deste artigo da Malu Gaspar?
NÃO PROCESSAM, EdLu; SÓ VC, NÊGO.
DESENHA PRA NÓS, POIS
''Extirpar'' e ''metralhar'' tem muita diferença.
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