Metrópoles
Uma justiça apressada só produz vítimas
inocentes
Há dois anos e quase sete meses, o mundo
assistiu, estarrecido, ao vivo e a cores como se dizia antigamente, a invasão
do prédio do Congresso dos Estados Unidos, incentivada pelo então presidente
republicano Donald Trump, derrotado pelo democrata Joe Biden.
Fazia muito frio em Washington naquele 6 de
janeiro de 2021. Os católicos celebravam o Dia de Reis, data em que, segundo a
tradição cristã, os Três Reis Magos visitaram o recém-nascido Jesus de Nazaré.
Trump disse que a eleição lhe fora roubada.
Dali a 14 dias. Biden, o segundo presidente católico do país (o primeiro foi John Kennedy), tomaria posse, e era isso que Trump e seus seguidores brancos da extrema-direita queriam impedir. Fracassaram. Nem por isso a democracia por lá está segura.
O país de 2021 quase rachado ao meio está
da mesma forma. E Trump, apesar de responder na justiça a 37 acusações por sete
crimes, é o nome dos republicanos com mais chances de disputar as eleições
presidenciais do próximo ano, outra vez contra Biden.
O governo Biden está perto do fim sem que
ele tenha conseguido pacificar os Estados Unidos. Tentou e continua tentando,
mas não depende só dele. O país segue aos pedaços, sem dar sinais de paz. E
pela lei, Trump poderá ser eleito e governar mesmo preso.
Aqui, Bolsonaro ficou inelegível até 2030.
O prazo poderá se estender se for condenado em mais um dos 15 processos que
ainda responde. É provável que seja. Não é que acabe preso. Mesmo depostos,
Fernando Collor de Mello e Dilma não foram presos.
Michel Temer foi por poucos dias. Lula, por
580 dias. Prender Bolsonaro por alguns meses ou mais de um ano seria
transformá-lo em mártir da extrema-direita, e de parte da direita que, por
vergonha do que de fato é, apresenta-se como direita civilizada.
O golpe do 8 de janeiro, em breve,
completará sete meses, apenas. Ainda não foi desvendado de todo. Demorará a
ser. Nos Estados Unidos, alguns golpistas foram condenados e presos, mas restam
muitos a ser julgados. Aqui, restam quase todos.
O ideal de pacificação do país deve ser
perseguido como ideal, mesmo contra todas as evidências de que não será
alcançado tão cedo – se é que um dia será. A extrema-direita avança em quase
todas as partes do mundo, especialmente na Europa.
Na Espanha, o Partido Popular, de direita,
tem tudo para vencer a eleição deste domingo, mas para que governe vai depender
do Vox, partido da extrema-direita. Os dois, juntos, já governam regiões
autônomas da Espanha onde a liberdade está sendo minada.
É irrealista cobrar de Lula que suavize ou
mude seu discurso sobre o perigo que a democracia correu nos últimos quatro
anos e, especialmente, no 8 de janeiro; e da justiça, que encerre logo os
inquéritos abertos para apurar e punir os golpistas.
A justiça é lenta, como se sabe, mas sempre
foi assim. Não é necessariamente ruim que seja. Uma justiça apressada produz
muitas vítimas inocentes.
Um comentário:
Verdade.
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