O Globo
Os ataques de Musk ao STF reforçam, além do
espírito de autodefesa dos ministros, a proximidade entre eles, a PGR e até o
governo Lula
As diatribes de Elon Musk — que, não deveria
ser preciso dizer, nada têm a ver com a defesa apaixonada da liberdade de
expressão no Brasil — reforçam o apoio público do Supremo Tribunal Federal ao
ministro Alexandre de Moraes. Diante do que considera um ataque virulento não a
um de seus integrantes, mas à Corte como um todo, o STF pode até dar mais prazo
aos inquéritos conduzidos por Moraes, cujo desfecho já vem sendo discutido,
apenas para não passar a impressão de ceder à pressão coordenada da extrema direita
— a internacional e a bolsonarista — sobre o Judiciário brasileiro.
Não é de hoje que os ministros fazem o diagnóstico de que o Supremo teve de assumir responsabilidades que não seriam exclusivamente suas para garantir tanto a democracia quanto o enfrentamento adequado da emergência sanitária no curso da pandemia, mas que está, no dizer de um deles, na hora de “fazer a pasta de dentes voltar para o tubo”.
A reação, que levou até a que antigas rusgas
entre eles e a divisão do tribunal em grupos fossem suplantadas
temporariamente, adveio da percepção de que a Procuradoria-Geral da República
estava completamente omissa diante dos ataques de Jair Bolsonaro sobretudo
nessas duas frentes, mas não só. Afinal, houve ações do STF em áreas como
educação e meio ambiente também, na linha de evitar que se passasse a boiada na
extinção de garantias e direitos.
Augusto Aras e Lindôra Araújo foram
absolutamente ausentes diante das graves evidências, depois confirmadas na CPI
da Covid no Senado, de que Bolsonaro deliberadamente atrasou a compra de
vacinas, além de sabotar com ações e declarações as medidas de isolamento
social e combate à pandemia.
As ações do ex-presidente contra o sistema
eleitoral e o próprio Judiciário estão ainda mais frescas na memória e não
precisam de histórico. Nesse aspecto, é majoritário no STF o entendimento de
que as iniciativas de vários ministros, mas sobretudo de Moraes e daqueles que
integraram o Tribunal Superior Eleitoral, foram primordiais para que se tenha
evitado um golpe de Estado.
Eles rechaçam as acusações de que, nessa
resistência, tenham ultrapassado limites de atuação para além do que prescreve
a Constituição. Lembram que o inquérito das fake news, aberto de ofício em
2019, foi “saneado” e validado pelo plenário. Advogam que foi essencial para as
demais investigações que se desdobraram a partir dele.
Mas investigações precisam ter prazo e chegar
a um desfecho, e essa é a discussão em curso internamente, com o cuidado
necessário para não tisnar a união que eles alcançaram no período da
adversidade.
Ela se reforça quando um personagem como
Musk, visivelmente unindo interesses comerciais de suas empresas e a
instrumentalização do X (antigo Twitter) como arma de uma guerra ideológica com
claros propósitos de influenciar eleições, inclusive a presidencial dos Estados
Unidos neste ano, afronta abertamente a Justiça brasileira e prega a
desobediência a suas decisões — com poder de incendiar o debate na direita e na
extrema direita locais.
Ouve-se dos ministros que, sob o comando de
Paulo Gonet, a PGR voltou a cumprir seu papel. De fato, o Ministério Público
Federal tem se posicionado em todas as questões mais candentes e, em muitas
delas, tem mostrado sintonia com as ações dos próprios ministros. Não custa
lembrar que Moraes e o decano Gilmar Mendes foram grandes defensores da escolha
de Gonet por Lula.
Portanto os ataques calculados de Musk ao STF
reforçam, além do espírito de autodefesa dos ministros, também a proximidade
entre eles, a PGR e até o governo Lula. Para os propósitos da oposição,
claramente apontar perseguição a Bolsonaro e aliados, resta tentar ganhar
espaço no Congresso e na sociedade. É o que está fazendo.
2 comentários:
Pois é.
Dos textos que li até agora, pelo menos para mim, a melhor análise sobre o caso envolvendo o empresario e o STF foi a de Ronaldo Lemos em sua coluna de ontem na Folha, " Elon Musk deu um baile no Brasil e venceu ".
😎
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