domingo, 15 de junho de 2025

Uma ofensiva com vício de origem - Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

Bibi prolonga a carnificina em Gaza para adiar o encontro com urnas e Justiça; fará o mesmo no Irã

A ofensiva de Israel contra o Irã sofre do mesmo vício de origem que a campanha contra o Hamas na Faixa de Gaza: objetivos maximalistas. Isso porque ela não se orienta apenas pela lógica militar e interesses nacionais. A motivação política de Binyamin Netanyahu de se manter no poder a qualquer custo é o principal fio condutor.

O primeiro-ministro israelense declarou ontem: “No futuro breve, vocês verão aviões israelenses, nossos bravos pilotos, sobre os céus de Teerã. Atacaremos todos os alvos do regime dos aiatolás”. Assim como fez em relação a Gaza, Netanyahu tem preparado a população para uma longa campanha.

Os ataques têm produzido danos na superfície das instalações nucleares, com diversos graus de comprometimento das operações. Os parques subterrâneos de centrífugas, onde o urânio é enriquecido, não estão ao alcance dos mísseis israelenses. Seria necessário o emprego de grandes bombas destruidoras de bunkers, que só os EUA possuem, e não há indícios de que Donald Trump pretenda cedêlas a Israel.

O programa nuclear iraniano será retardado pelos ataques israelenses. O regime, profundamente impopular, parecerá mais vulnerável. Mas os ataques só provam para os iranianos a necessidade de obter armas nucleares, assim como a tentativa de Netanyahu, odiado pelos iranianos, de mobilizá-los para derrubar o regime tem o efeito contrário de uni-los contra essa intervenção externa de uma potência nuclear que nega à força esse poderio ao inimigo.

Israel tem boas razões, no campo estratégico, de procurar barrar ou ao menos postergar a conversão do Irã em potência nuclear. Desde a Revolução Islâmica de 1979, a teocracia iraniana tem trabalhado para contestar a existência de Israel, que ocupa ilegalmente Jerusalém, o terceiro lugar mais sagrado para o Islã.

Um dos maiores propulsores da parte clandestina do programa nuclear iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, presidente entre 2005 e 2013, negava o Holocausto e flertava com a ideia de varrer Israel do mapa. Assim, no imaginário israelense, com fundadas razões, o viés militar, não assumido pelo regime, do programa iraniano, está associado a um Holocausto nuclear. O apoio iraniano a grupos como Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica Palestina e Houthis reforça essa percepção.

Mas, assim como tem prolongado a carnificina em Gaza para adiar seu encontro com as urnas e com a Corte Suprema, na qual é acusado de corrupção, Netanyahu também prolongará o atrito militar com o Irã. Os objetivos inalcançáveis têm essa função. Nem Trump nem o eleitorado israelense têm se mostrado capazes de detê-lo. Por isso, essa será uma longa guerra.

 

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