DEU EM O GLOBO
Uma das dúvidas mais instigantes da eleição presidencial este ano é até que ponto um presidente popular como Lula consegue transferir votos para sua candidata. No Chile, uma presidente popular não conseguiu eleger seu candidato. A eleição de amanhã na Colômbia é outro teste. Há especialistas dizendo que o pleito brasileiro já está definido. Respeito demais o eleitor para concordar.
A dinâmica de um processo eleitoral é sempre imprevisível. O presidente Álvaro Uribe tem alta popularidade, mas seu candidato Juan Manuel Santos chega à reta final da campanha empatado nas pesquisas de intenção de voto com Antanas Mockus, do Partido Verde. Por que a popularidade de Uribe não foi suficiente?
O ex-vice-ministro do Planejamento colombiano Alejandro Gaviria, entrevistado no blog, explica que popularidade presidencial é patrimônio pessoal, nem sempre transferível:
- Em um mundo com partidos débeis, a popularidade presidencial é pessoal. Santos representa a continuidade das políticas, mas seu estilo é muito diferente do estilo do presidente Uribe. A opinião pública reconhece as conquistas de Uribe, mas não quer só continuidade, demanda também uma mudança nas políticas sociais e medidas contra a corrupção.
Michelle Bachelet tinha a mais alta popularidade presidencial na América Latina e seu partido perdeu a eleição. Ela agiu como um magistrado no processo eleitoral. Aqui no Brasil, o presidente Lula tem desrespeitado as regras de separação entre o governo e a campanha da sua candidata. Recebe multas e as desdenha. Esse envolvimento está sendo reforçado pela melhora do desempenho da pré-candidata Dilma Rousseff nas pesquisas.
Ao contrário do caso da Colômbia, descrito por Gaviria, aqui o PT não é um partido débil. Porém, ele foi atropelado pelo presidente Lula, que impôs sua escolha no velho estilo mexicano da era do PRI, em que cabia ao presidente escolher o candidato à sua sucessão.
No Brasil, há também uma candidata do Partido Verde que já está com 12% das intenções de voto, mas não se pode fazer um paralelo com o caso colombiano. Segundo Gaviria, Mockus não é exatamente ambientalista, o partido é ambíguo sobre bandeiras que para Marina Silva são consistentes. Lá, ele focou no combate à corrupção e na luta por transparência. Até o fato de admitir publicamente que tem mal de Parkinson o alavancou nas pesquisas. Ele pode perder a eleição, mas Mockus já foi muito além do que se previa que ele iria.
Na Colômbia, a insatisfação com 12% de taxa de desemprego e 60% de informalidade atenuam o efeito da popularidade presidencial, que é baseada no fato de que Uribe enfrentou os narcotraficantes das Farc e reduziu a criminalidade. Nada disso é possível transpor para o Brasil. Aqui, a informalidade é alta, mas caiu; o desemprego está em queda; o país está crescendo forte depois da recessão de 2009. E aqui, felizmente, não há movimento terrorista como há na Colômbia há décadas.
Os países são diferentes, mas em sistemas políticos democráticos é inevitável que haja surpresas e inesperados. Por isso, é tão espantoso que alguns cientistas políticos, ou especialistas em pesquisa de opinião, estejam garantindo mais de quatro meses antes das eleições que o resultado já está definido em decorrência da popularidade presidencial.
O ex-ministro da Fazenda da Colômbia Juan Camilo Restrepo dá os números: a popularidade de Uribe é de 70%, a intenção de votos em seu candidato é de 35%:
- Vai certamente para o segundo turno, mas a eleição não está garantida.
Ele acha que Mockus é um fenômeno ainda mal entendido, porque ele já foi candidato em outras vezes sem ter o mesmo desempenho. Restrepo conta que há um grande desconforto no país com métodos policiais abusivos no governo Uribe. É uma situação ambígua: eles valorizam o resultado alcançado, de maior segurança, mas ao mesmo tempo estão cansados de coisas como paramilitares e escutas ilegais por organismos de segurança. Reforma tributária foi tema de campanha. Santos garantiu que não elevará os impostos, Mockus disse que será inevitável elevá-los.
O jornalista Gerardo Quintero Tello, do "El País" da Colômbia, explicou assim a dissonância entre aprovação de Uribe e a intenção de voto em seu candidato:
- Apesar de ser o ungido pelo presidente, o ex-ministro da Defesa não tem as mesmas origens, nem o mesmo carisma, nem as mesmas ligações que o atual presidente tem com a maioria dos cidadãos. Santos representa a elite de Bogotá, tem pouco contato nas áreas não urbanas.
O jornalista explica que Mockus tem a vantagem de ser um bom administrador como ex-prefeito de Bogotá, fez uma aliança com Sérgio Fajardo, que também teve sucesso como administrador de Medellin e conduziu uma campanha renovadora do cenário político:
- Mockus representa uma reserva moral num país estupefato diante das práticas corruptas da política.
O analista político Camilo González Posso disse que Santos tem o apoio dos uribistas radicais que sempre foram em torno de 33%. Acha também que Mockus atraiu a juventude com a possibilidade de mudança. Ele acredita que há rejeição ao modelo econômico de Uribe construído em cima de muito subsídio para setores econômicos fortes.
Cada país é um país e os fenômenos políticos são distintos, mas há uma questão que não muda: o eleitor é que escolhe em quem votar e ele normalmente surpreende os analistas. Se não fosse isso, nem precisaria de eleição, bastavam as pesquisas. As entrevistas podem ser lidas em meu blog: http://www.miriamleitao.com/.
Uma das dúvidas mais instigantes da eleição presidencial este ano é até que ponto um presidente popular como Lula consegue transferir votos para sua candidata. No Chile, uma presidente popular não conseguiu eleger seu candidato. A eleição de amanhã na Colômbia é outro teste. Há especialistas dizendo que o pleito brasileiro já está definido. Respeito demais o eleitor para concordar.
A dinâmica de um processo eleitoral é sempre imprevisível. O presidente Álvaro Uribe tem alta popularidade, mas seu candidato Juan Manuel Santos chega à reta final da campanha empatado nas pesquisas de intenção de voto com Antanas Mockus, do Partido Verde. Por que a popularidade de Uribe não foi suficiente?
O ex-vice-ministro do Planejamento colombiano Alejandro Gaviria, entrevistado no blog, explica que popularidade presidencial é patrimônio pessoal, nem sempre transferível:
- Em um mundo com partidos débeis, a popularidade presidencial é pessoal. Santos representa a continuidade das políticas, mas seu estilo é muito diferente do estilo do presidente Uribe. A opinião pública reconhece as conquistas de Uribe, mas não quer só continuidade, demanda também uma mudança nas políticas sociais e medidas contra a corrupção.
Michelle Bachelet tinha a mais alta popularidade presidencial na América Latina e seu partido perdeu a eleição. Ela agiu como um magistrado no processo eleitoral. Aqui no Brasil, o presidente Lula tem desrespeitado as regras de separação entre o governo e a campanha da sua candidata. Recebe multas e as desdenha. Esse envolvimento está sendo reforçado pela melhora do desempenho da pré-candidata Dilma Rousseff nas pesquisas.
Ao contrário do caso da Colômbia, descrito por Gaviria, aqui o PT não é um partido débil. Porém, ele foi atropelado pelo presidente Lula, que impôs sua escolha no velho estilo mexicano da era do PRI, em que cabia ao presidente escolher o candidato à sua sucessão.
No Brasil, há também uma candidata do Partido Verde que já está com 12% das intenções de voto, mas não se pode fazer um paralelo com o caso colombiano. Segundo Gaviria, Mockus não é exatamente ambientalista, o partido é ambíguo sobre bandeiras que para Marina Silva são consistentes. Lá, ele focou no combate à corrupção e na luta por transparência. Até o fato de admitir publicamente que tem mal de Parkinson o alavancou nas pesquisas. Ele pode perder a eleição, mas Mockus já foi muito além do que se previa que ele iria.
Na Colômbia, a insatisfação com 12% de taxa de desemprego e 60% de informalidade atenuam o efeito da popularidade presidencial, que é baseada no fato de que Uribe enfrentou os narcotraficantes das Farc e reduziu a criminalidade. Nada disso é possível transpor para o Brasil. Aqui, a informalidade é alta, mas caiu; o desemprego está em queda; o país está crescendo forte depois da recessão de 2009. E aqui, felizmente, não há movimento terrorista como há na Colômbia há décadas.
Os países são diferentes, mas em sistemas políticos democráticos é inevitável que haja surpresas e inesperados. Por isso, é tão espantoso que alguns cientistas políticos, ou especialistas em pesquisa de opinião, estejam garantindo mais de quatro meses antes das eleições que o resultado já está definido em decorrência da popularidade presidencial.
O ex-ministro da Fazenda da Colômbia Juan Camilo Restrepo dá os números: a popularidade de Uribe é de 70%, a intenção de votos em seu candidato é de 35%:
- Vai certamente para o segundo turno, mas a eleição não está garantida.
Ele acha que Mockus é um fenômeno ainda mal entendido, porque ele já foi candidato em outras vezes sem ter o mesmo desempenho. Restrepo conta que há um grande desconforto no país com métodos policiais abusivos no governo Uribe. É uma situação ambígua: eles valorizam o resultado alcançado, de maior segurança, mas ao mesmo tempo estão cansados de coisas como paramilitares e escutas ilegais por organismos de segurança. Reforma tributária foi tema de campanha. Santos garantiu que não elevará os impostos, Mockus disse que será inevitável elevá-los.
O jornalista Gerardo Quintero Tello, do "El País" da Colômbia, explicou assim a dissonância entre aprovação de Uribe e a intenção de voto em seu candidato:
- Apesar de ser o ungido pelo presidente, o ex-ministro da Defesa não tem as mesmas origens, nem o mesmo carisma, nem as mesmas ligações que o atual presidente tem com a maioria dos cidadãos. Santos representa a elite de Bogotá, tem pouco contato nas áreas não urbanas.
O jornalista explica que Mockus tem a vantagem de ser um bom administrador como ex-prefeito de Bogotá, fez uma aliança com Sérgio Fajardo, que também teve sucesso como administrador de Medellin e conduziu uma campanha renovadora do cenário político:
- Mockus representa uma reserva moral num país estupefato diante das práticas corruptas da política.
O analista político Camilo González Posso disse que Santos tem o apoio dos uribistas radicais que sempre foram em torno de 33%. Acha também que Mockus atraiu a juventude com a possibilidade de mudança. Ele acredita que há rejeição ao modelo econômico de Uribe construído em cima de muito subsídio para setores econômicos fortes.
Cada país é um país e os fenômenos políticos são distintos, mas há uma questão que não muda: o eleitor é que escolhe em quem votar e ele normalmente surpreende os analistas. Se não fosse isso, nem precisaria de eleição, bastavam as pesquisas. As entrevistas podem ser lidas em meu blog: http://www.miriamleitao.com/.
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