Para usar uma imagem do boxe, é como se, numa luta de dois rounds, uma esmagadora maioria previsse a vitória de um dos lutadores por nocaute.
Porém, um golpe inesperado daquele marcado para perder jogou o adversário favorito, zonzo, nas cordas, enquanto soava o gongo do intervalo. É assim que parece a candidata Dilma Rousseff, que tenta se refazer do susto de não ter acabado com a eleição no primeiro turno, e parte para o ataque, na campanha do segundo, aposentando o manual de boas maneiras usado no início da luta.
Se vai funcionar, não se sabe. A primeira pesquisa do segundo turno, do Datafolha, registrou grande estreitamento na vantagem que Dilma ostentava em relação a Serra. Os 54% a 46% dos votos válidos levantados pela sondagem refletiram um importante sangramento de votos dilmistas iniciado na última semana de campanha do primeiro turno. Ontem, foi a vez do Ibope, divulgado no “Jornal Nacional”: 53% a 47%. Confirma-se a aproximação de Serra. A julgar pelo primeiro debate do segundo turno, domingo na TV Bandeirantes, uma das armas sacadas pela candidata oficial, como fizera Lula no segundo turno de 2006, o “fantasma” das privatizações, encontra um candidato tucano rápido no gatilho da réplica, ao contrário de Geraldo Alckmin naquela ocasião. Além disso, os quatro anos de governo lulopetista concedidos a mais pelo eleitorado demonstraram que sacrossantas estatais terminaram privatizadas, mas de maneira deletéria: privatizadas pelo fisiologismo político, caso do setor elétrico; pelo aparelhamento, em que se destaca a Petrobras; e para a criação de dificuldades a fim de se venderem facilidades, como ocorrido nos Correios sob a influência de Erenice Guerra e herdeiros.Dilma Rousseff e o PT se apresentam como vítimas de torpes acusações espalhadas pela internet.
O ponto nevrálgico dos ataques tem sido a lembrança de que a candidata já defendeu a legalização do aborto, tema que, infelizmente, tem servido para contaminar o debate político por crenças religiosas. Até aqui, a campanha tem servido de alerta ao PT, alvejado por uma artilharia conhecida por militantes do partido: textos e filmes distribuídos pela internet. Outro aspecto de todo este tiroteio é que parte da munição de que se valem grupos para atacar Dilma Rousseff é obtida em documentos oficiais. Neste sentido, não se pode, a rigor, entender como calúnias algumas mensagens que circulam na rede de computadores. Afinal, como o governo Lula é um conglomerado de correntes ideológicas, com várias capitanias hereditárias distribuídas pela máquina pública, e algumas delas controladas por agrupamentos de esquerda autoritária, não é difícil encontrar propostas radicais, emanadas de dentro do governo, contrárias à Constituição.
Quem consultar a terceira versão do “Plano Nacional de Direitos Humanos”, assinado pelo próprio Lula, encontrará muito daquilo de que a candidata quer manter distância: descriminalização do aborto, censura à imprensa, ataque ao direito constitucional de propriedade etc. A própria Dilma chegou a encaminhar à Justiça eleitoral parte desse plano como programa de seu governo. Diante da má repercussão, voltou atrás. Haja o que houver, Lula paga hoje um preço por ter abrigado no governo correntes cujo projeto de país nada tem a ver com as aspirações das classes médias que aumentam de peso na sociedade brasileira
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