- O Estado de S.Paulo
O surto epidemiológico das buscas sobre a saúde de Temer no Google não é exclusividade do atual presidente
Desde o impeachment não havia tantos procurando por “Temer”. Não, não se trata de deputados negociando votos para derrubar a denúncia contra ele. Essa é busca corrente e vulgar. O pico de demandas pelo nome do presidente, ontem, foi no Google: três vezes mais do que quando a Câmara julgou vazia a primeira denúncia que tentava despejá-lo do Palácio do Planalto. Mas não foi a nova acusação que acordou a curiosidade popular.
No dia em que o presidente suava para sobreviver politicamente, os internautas queriam saber de outra sobrevivência, literal. “Michel Temer passa mal” disputava cabeça a cabeça com “Michel Temer internado” no “Google Trends” das últimas horas. A seguir, “idade” e “hospital” apareciam entre as associações de ideias mais comuns feitas por usuários do Google junto com o nome presidencial. Uns eram sutis (“saúde de Temer”), outros já iam direto atrás do fake news: “Temer morre”.
As pesquisas no Google são o confessionário da internet. É lá, no ilusório anonimato do campo de busca, que todos revelam suas curiosidades mais sinceras. Inclusive aquelas que não teriam coragem de admitir para um pesquisador, nem explicitar em um comentário no Facebook ou defender em um tuíte. É onde a busca por “sexo” é 50 vezes maior do que por “política” ou “religião”.
A curiosidade repentina e explosiva sobre Temer foi acesa pelo improviso com que o governo tratou o episódio – e pela tentativa dos aliados de minimizá-lo. A notícia da internação do presidente no Hospital do Exército correu primeiro como “furo”, depois como boato. O Planalto demorou a confirmar oficialmente, o que só fez aumentar o desejo inconfessável de uns, a preocupação de outros e a curiosidade mórbida da maior parte.
Para piorar, auxiliares do presidente tratavam do fato com adjetivos genéricos e lugares comuns que pareciam tentar ocultar sua gravidade: “mal-estar”, banalizou um ministro; “procedimento de rotina”, exagerou um líder governista. Por fim, nota oficial palaciana apelou a termos médicos, como “obstrução urológica” e “sondagem vesical de alívio por vídeo”, para referir-se ao procedimento empregado para Temer sentir menos dor ao urinar.
Para quem se lembra das dissimuladas notas oficias da equipe que tratou Tancredo Neves – num episódio que também começou banal em um hospital militar brasiliense – a internação de Temer pareceu, nos primeiros instantes, um “déjà-vu”.
Até onde se pode confiar nas informações oficiais, era isso mesmo: uma ilusão pespegada pela memória e pelos erros de comunicação palacianos.
O surto epidemiológico das buscas sobre a saúde de Temer no Google não é exclusividade do atual presidente. A internet matou Lula e Dilma várias vezes. No caso mais famoso, “viral” não era vício de linguagem. Em fevereiro de 2015, notícia apócrifa sobre a morte de Lula e impulsionada no Facebook levava a uma página onde os incautos faziam o download de um vírus de computador.
Na prática política, o maior medo provocado pela inesperada e nada rotineira hospitalização de Temer é causado pelo presidente ser o último avalista de todas as barganhas feitas em seu gabinete ou nas noites do Jaburu. Só ele pode honrar o cumprimento dos acordos de troca de voto para sua permanência à frente da Presidência da República por verbas. Sem Temer, as cobranças seriam maiores, e os pagamentos perderiam a garantia.
Daí a precipitação em anunciar que Temer teria alta hospitalar às 18h. E quando a hora passou, às 20h. Afinal, os deputados já votavam o destino do presidente. Ao fim, ganharam os urologistas. Seus consultórios deverão transbordar de políticos ressabiados nos próximos dias.
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