- Folha de S. Paulo
Em março de 2000, o antropólogo Luiz Eduardo Soares denunciou a existência de uma "banda podre" na polícia do Rio. Ele não disse mais que o óbvio, mas entrou na mira de deputados e coronéis. O governador Anthony Garotinho resolveu a crise da forma mais fácil: demitiu o colaborador, que atuava como subsecretário de Segurança.
Em novembro de 2017, o enredo ensaia se repetir com Torquato Jardim. Depois de apontar vínculos entre a PM do Rio e o crime organizado, o ministro da Justiça virou alvo de reações histéricas. O presidente da Assembleia Legislativa o chamou de mentiroso. O presidente da Câmara, de infantil e irresponsável. O governador Luiz Fernando Pezão ameaçou processá-lo no Supremo.
Os políticos fluminenses acusam Jardim de ofender a honra do Estado. Eles indicam que só vão recuar se a cabeça do ministro for servida numa bandeja. "Se a população do Rio ainda tem quem a defenda, é a Polícia Militar", discursou o deputado Jorge Picciani, chefão local do PMDB.
"É a reação corporativista e provinciana de sempre", comenta o antropólogo Luiz Eduardo, 17 anos depois de ser demitido por criticar a polícia. "Isso me parece uma hipocrisia tremenda. O orgulho do Rio não está ferido por uma entrevista, e sim pela violência e pela corrupção", afirma.
As evidências de que a banda podre continua na ativa são fornecidas pela própria polícia. Em junho, 96 PMs foram presos sob acusação de receber mesada do tráfico. Em outubro, o comandante de uma UPP foi detido sob suspeita de desviar armas e munições. Negar o problema é o caminho mais seguro para não resolvê-lo.
Isso não significa que Jardim esteja liberado para fazer acusações graves sem ajudar a apurá-las. Ao assumir o cargo, ele já tropeçou na língua ao dizer que sua única experiência em segurança era o fato de ter sido assaltado. No dia em que denunciou os maus policiais, o professor Luiz Eduardo foi ao Ministério Público e entregou um calhamaço de provas.
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