segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

‘Existe uma avenida aberta para um outsider em 2018’, diz Paulo Hartung

Entrevista com Paulo Hartung, governador do Espírito Santo

Cotado para compor uma chapa presidencial como vice, governador diz que centro político não se estruturou para a eleição

Eduardo Kattah e Pedro Venceslau, enviados especiais/ O Estado de S. Paulo,24/12/2017

VITÓRIA - O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), afirma que o centro político do País não se estruturou para a eleição presidencial do próximo ano e ainda há “uma avenida aberta para um outsider” em 2018. Ele define como centro político a centro esquerda – no qual se insere – mais os “liberais reformistas”. “Precisamos unir o centro da política”, afirmou em entrevista ao Estado.

Hartung, que cogita sair do PMDB, manteve conversas recentes com Luciano Huck e Joaquim Barbosa e diz que um nome de fora da política poderia representar esse campo. Ele afirma já estar “abraçado no projeto nacional” e é cotado para compor como vice uma chapa na sucessão presidencial. Leia os principais trechos da entrevista.

Qual será sua participação na política em 2018?

O ambiente no Brasil hoje é péssimo, e isso empurra a política para os extremos. Quem tem espaço num campo desse é bravateiro e vendedor de terreno na Lua. Minha torcida é para que o País acalme um pouco. Se o Brasil percorrer 2018 com esse ambiente péssimo, provavelmente as decisões serão movidas por ressentimento e raiva. Tem razão para a população estar ressentida? Claro que tem. Os americanos decidiram com o fígado e não estão satisfeitos com a decisão. Só que os americanos tem gordura para queimar, mas o Brasil não tem. O Brasil está literalmente pele e osso. Os americanos podem fazer uma aventura, nós não. Ou a gente acerta a mão em 2018, ou vamos flertar com o que há de pior na nossa vizinhança latino-americana.

Mas, e sua participação?

Os processos eleitorais estão sendo definidos em cima da hora. Temos de percorrer até junho ou parte de julho de 2018 para amadurecer decisões.

O sr. disse em meados deste ano que estava disposto a deixar o PMDB. Ainda está?

Estou observando o quadro como um todo para tomar decisões. Vou usar o tempo do prazo (legal). Esperava que o Congresso fizesse algumas mudanças na vida partidária e eleitoral do País. A impressão é que a sociedade está em uma direção e as instituições políticas do País em outra. Há um divórcio.

O sr. já disse que teria mais conforto em ir para um partido que tivesse compatibilidade com seu pensamento político...

Eu sou um político de centro esquerda. Comecei minha militância na juventude como líder estudantil no campo do socialismo. Evoluí. Sou um social-democrata.

O sr. recebeu convite do PSDB e o DEM também o sondou. Está no seu radar ir para um desses dois partidos?

Tenho uma grande relação com o PSDB. Fui filiado e fundador do partido. Sou muito próximo ao Rodrigo Maia, que é uma grande liderança. Nesse tempo que temos, estamos pensando e conversando. Os extremos estão se movimentando. Quem ainda não conseguiu se estruturar foi o centro político do País. Esse é o nosso papel: organizar o centro político.

O que é o centro político?

É a turma de centro esquerda mais os liberais reformistas. Precisamos juntar essa turma em um projeto e uma agenda clara para o País, que seja reformista e modernizadora.

Já há uma disputa entre o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o governador Geraldo Alckmin pela liderança do centro em 2018. Qual deles tem mais identificação com esse campo?

É positivo que eles tenham se colocado. São bem-vindos. Estamos vivendo o maior vazio de lideranças da nossa história. A realidade vai mostrar quem é viável e competitivo. Nenhum desses nomes, porém, deveria ser obcecado por posição. O momento é delicadíssimo. O mais importante agora é acertar na narrativa para a população entender porque é importante essa agenda entrar no País.

Estamos em dezembro. Não é o momento de falar em nomes?

Isso na agenda velha. O tempo lógico da política mudou.

Qual será a influência do julgamento do recurso do ex-presidente Lula nesse calendário? O que acha da pré-candidatura dele?

Absolutamente legítima e precisa ser respeitada. É uma candidatura que tem repercussão na sociedade. E não é pequena.

A pré-candidatura do Lula contribui para esse extremismo?

Eu convivi a vida toda bem com o Lula, particularmente no período em que ele foi presidente e eu governador. Tivemos um excelente diálogo. Qual a dificuldade hoje quando vejo o conteúdo da movimentação do ex-presidente Lula? Ele perdeu o apoio da classe média e do mundo empresarial. Lula, que é um homem pragmático, recuou para o mundo das corporações e sindicatos. Isso é legítimo, mas não forma o projeto que precisamos para o Brasil. Precisamos de uma plataforma reformista. O mundo das corporações é antirreforma. O movimento do ex-presidente não é o que o Brasil precisa. O Brasil precisa achar o seu centro político, como foi feito no Plano Real. Quando o presidente Lula fez a Carta aos Brasileiros, isso ajudou a organizar o centro político. Ele hoje não segura mais a Carta aos Brasileiros em sua campanha. O respaldo que ele tem na sociedade está muito ligado aos grupos corporativos e sindicatos.

Há o risco de uma eleição judicializada que pode torná-lo inelegível. Como vê essa situação?

Não podemos colocar o carro na frente dos bois, nem se assustar com o barulho da bala. Deixa as coisas acontecerem.

O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa pode representar o centro?

É um nome ótimo, como o Meirelles e o Alckmin. Joaquim tem uma história de vida belíssima. Tenho um carinho especial por ele. Precisamos organizar programaticamente o centro. O País está começando lentamente a recuperar a economia, mas não é sustentável essa recuperação. Vamos ser claros. Isso é voo de galinha se a gente não reestruturar as contas do País. Essa retomada lenta daqui a pouco desaba.

O sr., que está com discurso nacionalizado, recentemente jantou na casa do Armínio Fraga com o Luciano Huck. Barbosa o citou como um dos políticos que admira. Há espaço para um outsider na eleição presidencial?

Gostei muito da conversa com o Luciano. É uma pessoa preparada que tem uma boa reflexão sobre o País. Saí muito bem impressionado. O ministro Joaquim eu já conhecia. Tive várias audiências e oportunidades de conversar com ele. São dois quadros de boa qualidade. Existe espaço para um quadro desse nesse ambiente. Existe uma avenida aberta para um outsider. O que é difícil é empurrar para a população quem tem ou já teve mandato.

O sr. foi apontado como um potencial candidato a vice-presidente de Huck, Barbosa ou outro candidato desse centro. Aceitaria entrar num projeto nacional e abrir mão de disputar a reeleição?

Já estou abraçado no projeto nacional. Vocês mesmo dizem que minha fala está nacionalizada. Sou governador de um Estado que está organizado e com as contas em dia, e que faz políticas públicas inovadoras na área social. Mas há uma pedra no caminho do Estado, que é a desorganização do País. O que fica de pé se o Brasil embarcar em mais quatro anos de aventura? Pouca coisa. Virou uma necessidade esse envolvimento com a política nacional.

O Espírito Santo enfrentou no começo do ano uma greve da Polícia Militar. O governo atribuiu o movimento a atores políticos nacionais. Quais?

Houve um grande componente político no movimento de dentro e de fora do Estado. Foi absolutamente irresponsável. Uma greve ilegal. A lei é clara: funcionário público que usa arma não pode exercer direito de greve. O movimento estava cheio de impressão digital da disputa local e também da disputa nacional. É só olhar o que foi postado nas redes sociais sobre a greve. Quase 80% do que foi postado não saiu daqui.

Jair Bolsonaro é uma liderança ligada aos policiais...

Não faço ação política fulanizando o debate. Mas tinha dedo de luta política local e nacional. Estudos mostraram envolvimento de gente da bancada da bala. Isso está colocado na luta política desses extremos que estão postos.

Como avalia a pré-candidatura presidencial de Bolsonaro?

Ele fala para segmentos que querem ouvi-lo, mas não tem uma proposta para esses desafios que o Brasil está vivendo. Quando os temas profundos da agenda nacional entram na pauta, ele não tem uma proposta.

O PMDB voltou a ser MDB. Isso resolve os problemas do partido, que vive uma crise ética?

Claro que não. Mas a gente precisa ser justo. O quadro partidário como um todo não fica de pé. Vamos ter de fazer uma profunda reforma política no País.

O sr. foi citado por um ex-dirigente da Odebrecht em acordo de delação como destinatário de R$ 1 milhão em propinas em 2010 e 2012. A PGR pediu ao STJ o arquivamento. Qual era a sua relação com a Odebrecht?

Se você procurar na minha trajetória política, em 2010 e 2012 eu não disputei eleição. Desde o início ficou claro que essa delação não ficava de pé. Também na delação, o delator fala que não sou patrimonialista. Disputei oito eleições, fui eleito oito vezes. Três de governador fui eleito no primeiro turno. A corrupção é um problema no País e precisamos enfrentá-lo. Mas não podemos juntar o joio e o trigo.

A Lava Jato juntou joio e trigo?

Isso é casca de banana. Por favor... Não vou criticar ninguém. Já disse que precisamos combater a corrupção.

O presidente Temer é joio ou trigo?

Não sou julgador de ninguém.

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