terça-feira, 20 de agosto de 2019

Ranier Bragon || Moralismo de palanque

- Folha de S. Paulo

Eventual êxito do presidente representará abalo a instituições e à própria democracia

O bolsonarismo sempre prometeu acabar com a mamata, a corrupção, o desvio, o malfeito e todo tipo de sinônimo de bandalheira que talvez nem a falecida UDN tenha conseguido catalogar.

Do discurso à realidade, porém, há todo um Grand Canyon que só quem habita a Mitolândia parece ignorar. Faltasse ainda algum comprovação disso, a novela para a indicação do novo procurador-geral da República estaria aí para completar a lacuna.

Por que, ó Jesus, o presidente procura emplacar uma mão amiga na chefia do Ministério Público Federal?

Até o PT, o maior batedor de carteiras das galáxias, na visão do bolsonarismo, sempre escolheu o mais votado pelos procuradores, que integram uma das instituições mais sérias e basilares da nossa democracia.

Jair Bolsonaro, por sua vez, dá sinais de que pode ignorar a lista tríplice. Não em nome de currículos mais robustos ou coisa parecida. Quer, na verdade, buscar quem aceite ao máximo vestir o figurino medievalista e, talvez mais importante, dê sinais de que atuará para que os paladinos da moralidade de palanque não sejam importunados por questõezinhas como laranjas podres, Queirozgate e outras histórias mal contadas.

E muita gente se esforçou no beija-mão palaciano para assim parecer.

O plano insulta a República e tem tudo pra dar errado. Para Bolsonaro ou para as instituições. Caso opte mesmo por um nome, digamos, polêmico, restará aos senadores e senadoras provarem que honram as calças e saias que vestem. Se se dobrarem a emendinhas e outras benesses e aprovarem a extravagância, terão o opróbrio como recompensa.

Mesmo nesse cenário, ressalte-se que o procurador-geral tem poder, mas irá enfrentar a decência de um sem-fim de colegas ciosos de suas biografias. E é sempre bom lembrar que os bajuladores têm o singular caráter de sempre serem os primeiros a colocar o pezinho pra fora do barco quando os ventos mudam.

O certo é que o atual processo tem sementes contaminadas que jamais poderão resultar em frutos sadios.

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