Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara,
sinaliza que pretende votar proposta nas próximas semanas
Danielle Brant, Ranier Bragon
/ Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - A minuta do
novo Código
Eleitoral discutida pela Câmara dos Deputados estabelece a proibição
de divulgação de pesquisas eleitorais no dia e na véspera das disputas, além de
criar um suposto “percentual de acerto” dos institutos.
As duas medidas são criticadas por
especialistas sob o argumento de que representam censura a informações
relevantes para os eleitores, além de desconsiderarem a natureza dos
levantamentos, que apontam retratos do momento em que foram feitos, passíveis
de mudanças até a hora exata do voto.
O texto, relatado pela deputada Margarete
Coelho (PP-PI), é uma das prioridades do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),
que já sinalizou que pretende votar as mudanças na legislação eleitoral nas
próximas semanas.
Para valer para o pleito
de 2022, essas mudanças têm que ser aprovadas por Câmara e Senado e
sancionadas pelo presidente Jair Bolsonaro, aliado de Lira, até o início de
outubro deste ano.
Um dos artigos da proposta do novo
Código, que terá uma parte dedicada às pesquisas eleitorais, obriga a
publicação, juntamente com as pesquisas, de um “percentual de acerto” calculado
com base nas pesquisas realizadas pelo instituto nas últimas cinco eleições.
“É
uma discussão superada, antiga, porque não existe percentual de acerto”, afirma
Mauro Paulino, diretor-geral do Datafolha.
“Os institutos não fazem prognósticos, eles apontam a realidade daquele momento. Então, mesmo que seja uma pesquisa feita na véspera da eleição, entre a divulgação da pesquisa e a chegada do eleitor na urna ocorrem muitas coisas.”
Paulino ressalta que muitos eleitores
decidem voto em cima da hora, e alguns ainda aguardam a transmissão de programas
de notícias na véspera da eleição. “Esses noticiários divulgam
pesquisas. Os próprios resultados das pesquisas são considerados pelos
eleitores para praticarem, por exemplo, o voto útil.”
O diretor-geral do Datafolha afirma que a
medida é impraticável. “É um atraso, é uma falta de sintonia dos que redigiram
esse item com a ciência estatística, com nós que fazemos o trabalho e
entendemos do assunto. É uma exigência que não tem como ser cumprida.”
Duilio Novaes, presidente da Abep
(Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa), reforça a posição, ao afirmar
que as pesquisas apontam tendências, mas não cravam o resultado eleitoral.
“Dificilmente a pesquisa diz que vai ser
48,2% e a urna dá 48,2%. Ela vai dar dentro da margem de erro, 49%, 50% ou 46%,
47%. Isso é super natural”, diz.
“A gente não é bola de cristal. A gente
ouve o eleitor naquele momento e retrata a opinião dele. Agora se algo acontece
no final do campo, após o término da pesquisa, a gente não consegue medir.”
A relatora do texto defende a mudança e
afirma que o dado é objetivo e não está sujeito “à definição deste ou daquele
órgão”. “O contraste entre as pesquisas realizadas e o resultado final do pleito
eleitoral dirá se aquela pesquisa acertou ou errou”, disse.
“Nós sabemos que as pesquisas captam
momentos, e que elas muitas vezes não correspondem aos percentuais apurados nas
urnas, mas é suficiente saber se as lideranças apontadas nas pesquisas ou tendências
de alta ou baixa se confirmaram nas urnas.”
Segundo ela, a Justiça Eleitoral será
responsável por analisar a correlação entre os dados informados pelos
institutos e o resultado das eleições para medir se “captaram satisfatoriamente
as tendências do eleitorado, inclusive os movimentos de alta ou de queda de
determinadas candidaturas.”
O texto de Margarete também define que as
pesquisas eleitorais só poderão ser divulgadas até a antevéspera (a
sexta-feira) do dia da eleição. Hoje, os institutos podem publicar pesquisas de
intenção de voto até o dia da própria eleição.
“As regras se contradizem com a anterior,
porque se eles querem que os institutos provem que acertaram nas eleições
anteriores, agora eles reduzem o prazo entre a realização e a divulgação da
pesquisa para dois dias antes”, afirma Paulino, do Datafolha.
“É mais um fator. A gente faz a pesquisa
também no sábado para tentar chegar no último momento possível para entrevistar
as pessoas, porque no dia da eleição só vale boca de urna. É mais uma
restrição, é na verdade uma censura em relação ao que existe hoje. Hoje não há
qualquer tipo de limite para divulgação de pesquisa, ela pode ser divulgada
inclusive no dia da eleição, como tem sido feito.”
Em 2006, o Supremo Tribunal Federal
derrubou parte de projeto aprovado pelo Congresso que vetava a publicação de
pesquisas eleitorais nos 15 dias que antecedem o pleito. O argumento dos
ministros foi o de que a medida restringia o direito dos eleitores à
informação.
Segundo Margarete Coelho, os três dias que
antecedem as eleições são períodos de grande incerteza, em que o eleitorado
está suscetível a fortes oscilações em favor de determinados candidatos.
“É quando pesquisas podem sugerir
tendências de alta ou de queda de candidaturas que influem decisivamente sobre
as escolhas dos eleitores. Um erro na pesquisa durante esse período pode
insuflar artificialmente uma candidatura, por isso a restrição se justifica,
evitando movimentos de alta ou de queda ilusórios, que não correspondem à
realidade, mas que acabam por influenciar os eleitores mais indecisos.”
“O objetivo é trazer segurança ao processo
eleitoral, tanto aos candidatos quanto aos eleitores, mitigando o risco de
capturas ilusórias da realidade eleitoral.”
São frequentes as mudanças e tentativas de
mudanças patrocinadas pelo Congresso nas regras de divulgação de pesquisas
eleitorais.
Em linhas gerais, há a tentativa de
restringir a publicação de levantamentos feitos principalmente em pequenas
cidades, nas eleições municipais, patrocinados por empresas não raro associadas
a políticos com interesse na disputa.
Especialistas contestam um terceiro ponto,
que é a necessidade de informar, até a véspera da divulgação da pesquisa, dados
referentes ao bairro ou área em que o levantamento ocorreu. “A pesquisa ainda
não terminou, a pesquisa termina praticamente em cima da divulgação”, diz
Novaes.
“Se você divulga onde, você corre o risco
de enviesar resultado, porque as pessoas sabem onde a pesquisa está sendo feita
e podem chegar pessoas que não são do bairro que possam dar resultado de que
não vão votar, falar que vai votar num, quando na verdade não é nesse que ela
vai votar. Isso pode comprometer resultado”, diz.
Margarete Coelho discorda e afirma que,
além de a divulgação dos bairros em que foi realizada a pesquisa só ocorrer
após sua efetiva realização, ela não vincula a realização de futuras
entrevistas naqueles bairros.”
“A própria divulgação dos bairros em que
foram realizadas as pesquisas permite à justiça eleitoral medir se determinado
instituto tem variado ou não as áreas consultadas. É de se esperar que os
institutos variem os bairros consultados, mas, se isso não for feito, a justiça
eleitoral terá informações suficientes para sugerir ajustes de metodologia”,
diz a deputada.
Apesar das críticas, Paulino e Novaes dizem
que a minuta contemplou algumas demandas do setor, como a determinação que só
empresa de pesquisa poderá fazer esse tipo de levantamento.
“Nas últimas eleições, a gente viu uma série de empresas que não são de pesquisa fazendo pesquisa eleitoral. Isso para nós é muito complicado”, diz Novaes.
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