Valor Econômico
A miséria está presente em todos os lados de “Brasilha”
Transmitidas para milhares de pessoas todas
as semanas, as movimentadas sessões da CPI da Covid dão a sensação de que as
atividades foram retomadas no Parlamento em sua plenitude. Ilusão. Os trabalhos
dentro do Congresso, ainda semipresenciais, refletem o que ocorre no exterior
de suas dependências. Brasília sente os efeitos da crise.
A notícia positiva é que há um plano em execução.
Uma série de medidas tributárias já foi implementada, entre elas um agressivo
Refis que negociou R$ 3,1 bilhões e, na visão da equipe econômica do GDF, é
fundamental para impedir que ainda mais empresas fechem as portas. Outras
iniciativas setoriais foram direcionadas para aqueles mais prejudicados pela
pandemia, como salões de beleza, shopping centers, bares e restaurantes,
academias, hotelaria e salões de beleza.
Discute-se o pós-pandemia. Sem grandes expectativas em relação à aprovação das reformas tributária ou administrativa, agora o governo distrital mira a construção de um conjunto de políticas públicas para reativar a economia. Nada que dependa de repasses federais adicionais.
Reuniões com representantes dos diversos
segmentos empresariais já começaram a ser realizadas. O objetivo é pelo menos
atenuar, o mais rápido possível, algumas das mudanças na paisagem que chamam a
atenção de qualquer pessoa que transita pelas avenidas da capital.
Desde o início da crise sanitária, no
Palácio do Planalto vigora a ordem não expressa de que máscara é apetrecho de
opositor e cumprimento bom é pelo menos um aperto de mão. Nos demais Poderes,
contudo, vê-se uma maior cautela. O mesmo ocorre em relação ao poder local.
O trabalho remoto alterou a rotina de
autoridades e servidores. E isso, no geral, acabou contribuindo para a
desaceleração da economia. Era o que precisava ser feito: o número de vítimas
da covid-19 não parava de crescer e, ademais, em alguns momentos a escassez de
leitos de UTI chegou a níveis críticos.
Não quer dizer que a produtividade dos
parlamentares esteja mais baixa do que a habitual. Desde o início da pandemia,
projetos importantes têm sido aprovados no regime de teletrabalho. Audiências
públicas e votações passaram a ocorrer, inclusive, às segundas e sextas-feiras
em ambiente virtual.
No entanto, reuniões presenciais ainda são
exceção. Está distante o tempo em que 10 mil pessoas circulavam pela sede do
Legislativo às terças, quartas e quintas-feiras - dias que sempre concentraram
os trabalhos congressuais, para que deputados e senadores pudessem percorrer
seus redutos eleitorais no restante da semana.
Sobram vagas de estacionamento pela
Esplanada dos Ministérios. Sinal dos tempos.
Recentemente, o GDF divulgou um diagnóstico
mais preciso da situação: no acumulado entre abril de 2020 e março de 2021 - o
primeiro indicador a capturar quatro trimestres integralmente afetados pela
pandemia - o desempenho econômico da capital federal apresentou variação
negativa de 1,0%. É a maior queda da série histórica do indicador. Mesmo assim,
um resultado melhor do que o observado em âmbito nacional, onde a variação
negativa foi de 3,8% no mesmo período.
A manutenção da renda do funcionalismo
contribuiu. Por outro lado, prova que o DF não é exatamente aquele lugar com
uma dinâmica econômica própria, capaz de se descolar do território que o cerca,
como muitos sempre consideraram. A miséria está presente por todos os lados de
“Brasilha”.
Aliados do presidente Jair Bolsonaro
chegaram a mencionar essa situação quando tentaram convencê-lo a prorrogar com
celeridade o auxílio emergencial, o que acabou ocorrendo na segunda-feira.
Entre integrantes da cúpula do MDB, partido do governador, espera-se uma ação
social contundente das administrações sob a responsabilidade do partido. O
mesmo se vê em relação à Prefeitura de São Paulo.
Na noite passada, aliás, quando o inverno
seco do cerrado impôs a quem estivesse desabrigado uma temperatura de 8 ou 9
graus, 5 mil pessoas dormiram nas ruas do DF. Esse número assombroso faz parte
de um censo encomendado pela Secretaria de Economia do governo distrital, que
tem o desafio de atacar toda essa situação.
Explica o secretário André Clemente: “O
isolamento fez com que as pessoas não viessem para os centros urbanos. Aquele
consumo que acontecia no centro de Brasília foi redirecionado para mercados ou
para atacadistas, lojas de materiais de construção, restaurantes vizinhos de
onde as pessoas moram. Houve uma descentralização dos gastos”.
Bares e restaurantes foram imediatamente
afetados. Sofreram também os empresários que atuam no comércio e com eventos.
“Cerca de 30% a 40% das empresas que
estavam ativas fecharam imediatamente. Isso é desemprego, perda de arrecadação,
por isso essas ações imediatas nossas, para dar fôlego para empresas”, diz o
secretário, referindo-se ao conjunto de medidas que inclui prorrogação de
prazos para pagamento de impostos, ampliação de isenções, parcelamentos e
facilitação de crédito. Auxílios emergenciais também foram concedidos.
Por outro lado, mantiveram-se aquecidos o
mercado imobiliário, a indústria farmacêutica e a área de tecnologia de
informação.
Para o pós-pandemia, Brasília quer se
consolidar como um importante centro logístico na América Latina. “Acreditamos
que vamos resgatar esses serviços e voltar a crescer na área de infraestrutura
aeroportuária”, diz André Clemente. “O fato de estarmos a no máximo a 2 mil
quilômetros de qualquer capital da América Latina nos coloca numa situação
muito privilegiada. O e-commerce é uma realidade aqui no Distrito Federal
também, diante dessa facilidade de distribuir para qualquer local do país ou da
América Latina.”
No início do mês, o governo distrital
determinou o retorno dos servidores ao trabalho presencial. Entre
parlamentares, cresce também a pressão para que as sessões tradicionais sejam
retomadas. A engrenagem só deve voltar a rodar para valer quando avançar a
vacinação.
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