Valor Econômico
Para fiéis acostumados a tirar de suas
economias para contribuir com igrejas, e não o inverso, a prisão é danosa à sua
identidade religiosa e, potencialmente, eleitoral
O ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo
Salles já havia sido alvo de uma operação de busca e apreensão da Polícia
Federal, mas foi Milton Ribeiro quem forneceu ao governo Jair Bolsonaro a
primeira prisão do primeiro escalão.
Pior do que o ex-titular do Ministério da
Educação só mesmo se a ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos
Humanos, Damares Alves, tivesse ido parar no xadrez. Foram os dois ministros
mais estreitamente vinculados à base religiosa do bolsonarismo.
Se o negacionismo da pandemia e a crise
econômica já haviam desgastado a base evangélica do governo, a prisão do
ex-ministro tem potencial para anular a resiliente vantagem de Bolsonaro sobre
o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva neste eleitorado.
Estima-se que Bolsonaro tenha tido o dobro
da votação entre os evangélicos que seu adversário, Fernando Haddad, no 2º
turno. Foram esses 11 milhões de votos que selaram sua eleição.
Esta diferença estreitou-se. No Datafolha do final de maio, o presidente pontuava, no 2º turno, 47% entre os evangélicos e Lula, 45%. O Datafolha desta quinta mostrará se a prisão foi suficiente para a ultrapassagem.
Se a base evangélica do presidente ainda
credita as mortes do coronavírus e a inflação a forças sobrenaturais, a
associação entre a religião que abraçam e a corrupção é terrena. Se o
negacionismo e o empobrecimento a vitimiza, a vinculação de sua identidade
religiosa com malfeitos do governo ameaça torná-los algozes dos destinos da
nação por obra e graça do presidente.
É óbvio que os 32 milhões de eleitores
evangélicos do país não têm nada a ver com o que o ex-ministro e os pastores
Gilmar Santos e Arilton Moura aprontaram com recursos públicos. São brasileiros
pagadores de impostos e, em grande parte, alijados de serviços públicos que, na
ausência do Estado, são supridos, muitas vezes, pelas igrejas.
O áudio em que o ex-ministro diz aos
pastores que os repasses aos pastores se devem aos pedidos de Bolsonaro coloca
as igrejas como sócias do presidente na empreitada de avançar, com recursos do
erário, sobre fiéis e eleitores. Ainda mais sendo os evangélicos comumente
tratados como uma única denominação, quando, na verdade, há mais de 50 delas.
São fiéis acostumados a tirar de suas
economias para contribuir com suas igrejas, não o inverso. Por isso, a acusação
é danosa à sua identidade religiosa e, potencialmente, eleitoral.
A prisão não ameaça apenas a imagem do
governo como também a de dois dos principais partidos de sua base de
sustentação no Congresso. A verba desviada era operada pelo Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação, o caixa do MEC, condomínio do PR e do PL, partidos
pegos com a boca na botija de kits de robótica para escolas sem banheiro e
ônibus escolares superfaturados.
Além do presidente e de sua base no
Congresso, o escândalo chamusca também uma das principais “reservas morais” do
governismo, a primeira-dama Michelle Bolsonaro, que defendeu Ribeiro até o fim.
O desgaste da prisão pôde ser medido pela
velocidade com a qual a CPI do MEC, que dormia no Senado há três meses, avançou
em menos de 24 horas.
O gabinete paralelo de pastores no MEC veio
à tona em março pelas mãos da equipe de “O Estado de S.Paulo” e ganhou tração
com os áudios revelados pela “Folha de S.Paulo”. Seguiu em frente porque a
Procuradoria Geral da República saiu da letargia e acolheu a denúncia que, com
a saída de Ribeiro do cargo, desceu para a primeira instância, seguiu seu curso
e encontrou um juiz e um delegado da Polícia Federal dispostos a cumprir seu
dever.
No assassinato do indigenista Bruno Araújo
e do jornalista britânico Dom Philips a reação das bolsonaristas foi plantar a
“descoberta” de uma cidade perdida na Amazônia. Desta vez, seus perfis nas
redes sociais se dedicaram a espalhar que a PF, que chegou a prender Lula, está
aparelhada pelo PT.
Já nesta quarta-feira a Bites começou a
identificar a antecipação da artilharia bolsonarista de notícias falsas que
estava prevista para as próximas semanas. A falta de criatividade é só um dos
sintomas do esgotamento.
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Antes que a pressão pela CPI do MEC tomasse
os holofotes, a da Petrobras já tinha sido alvejada na véspera pela recusa do
PP a assiná-la.
Sem a CPI, o instrumento do Congresso para
avançar sobre a Petrobras é a mudança na Lei das Estatais. O maior temor de seu
relator, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), é de uma medida provisória que
dê efeito imediato à nulidade de clásulas como aquelas que afrouxam as
indicações políticas nas estatais.
Se o fizerem, porém, há uma avenida para
alegação de inconstitucionalidade. O artigo 246 da Constituição proíbe a adoção
de medida provisória para regulamentar tudo que tiver sido alterado na Carta
entre 1995 e 2001. É o caso do artigo 173 da Constituição, que trata das
empresas de economia mista. Só pôde ser regulamentado porque foi uma lei, a das
estatais, que o fez, garante Luiz Alberto dos Santos, consultor legislativo que
acompanhou a tramitação.
A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffman
(PR), que, na terça, havia escapado da cilada montada pelo Centrão para
angariar apoio da oposição à CPI da Petrobras, discursou ontem contra a Lei das
Estatais.
A lista de indicados pela União para o
Conselho de Administração da Eletrobras demonstra o quanto a privatização não é
garantia de blindagem política. Alguns dos indicados têm atuado como operadores
políticos no setor ao longo dos últimos anos.
São prerrogativas que aumentam a pressão
contra a Lei das Estatais. Se a Eletrobras privatizada, sob um modelo que o
professor do Insper, Sergio Lazzarini, chama de “estatal de controle
minoritário”, pode, por que a Petrobras não?
A presidente do PT deu vazão à
inconformidade do Congresso com o que a própria Casa aprovou, em 2016, sob o
impacto do “petrolão”. A atual correlação de forças, porém, favorece a que Caio
Paes de Andrade, se aprovado pelo comitê de elegibilidade e pelo Conselho de
Administração, venha a ter, com uma Lei das Estatais decepada, instrumento para
desmontar a governança da Petrobras e radicalizar o controle de preços.
Neste caso, o próximo governo só terá duas
alternativas, diz Jereissati, quase formalizado como vice na chapa da senadora
Simone Tebet (MDB-MS): abrir um buraco fiscal para tapar o da Petrobras ou
privatizar. Duas opções temerárias que desaconselham uma aventura parlamentar
na matéria.
2 comentários:
Verdade,conheço evangélicos que arrumam dinheiro emprestado para pagar o dízimo,tudo pra ficar ouvindo bobagem da boca de pastor,quer dizer,eu considero bobagem,cada um é cada um.
A Micheque nunca foi ''reserva moral'' nem com aspas.
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